Toffoli se disse vítima de “sites ignóbeis que querem atingir as instituições”. A frase contém dois erros. O ministro não deveria atacar a imprensa nem se confundir com o tribunal que integra
STF CENSURA IMPRENSA APÓS NOME DE DIAS TOFFOLI SER CITADO EM DELAÇÃO
Ao anunciar uma investigação sobre supostas ofensas ao Supremo, o
ministro Dias Toffoli disse que o tribunal “sempre atuou na defesa das
liberdades, em especial da liberdade de imprensa e de uma imprensa
livre”. Um mês depois, a Corte usou o inquérito para censurar uma
reportagem sobre seu presidente.Toffoli se irritou com um texto da última edição da “Crusoé”. A revista
digital informou que o ministro era tratado, em e-mails internos da
Odebrecht, pelo apelido de “Amigo do amigo de meu pai”. Ele foi
procurado antes da publicação, mas não quis se manifestar. Ao se queixar da reportagem, Toffoli determinou a “devida apuração das
mentiras recém divulgadas por pessoas e sites ignóbeis que querem
atingir as instituições brasileiras”. A frase contém dois erros. Um
ministro do Supremo não deveria atacar jornalistas nem se confundir com a
instituição que integra.
O apelido revelado pela “Crusoé” se refere a Toffoli, não ao tribunal.
Ele é um entre 11 juízes e ocupa a presidência em caráter temporário,
graças a uma regra de rodízio. O ministro deveria explicar a mensagem,
que foi passada à Lava-Jato pelo empresário Marcelo Odebrecht. Preferiu
atacar o mensageiro, a revista que revelou o seu codinome. A censura foi decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, escolhido por
Toffoli para relatar o inquérito. Ele classificou a notícia como um
“típico exemplo de fake news” e determinou que a reportagem fosse
retirada do ar “imediatamente”. Também mandou a Polícia Federal tomar
depoimento dos jornalistas, o que tem óbvio caráter de intimidação.
O Supremo dispõe de meios para se defender de ameaças e discursos de
ódio — uma chaga que também atinge o Congresso, o governo, a imprensa e
milhares de cidadãos comuns. Ao usar seus poderes contra um veículo de
comunicação, a Corte só aumenta a desconfiança sobre o inquérito aberto
em março. Além de imprópria, a censura se revelou pouco inteligente. Antes da
mordaça, a reportagem da “Crusoé” teve repercussão limitada. Depois
dela, chegou aos telejornais e virou manchete nos portais de notícia.
Bernardo Mello Franco - O Globo