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sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Aí não dá, Lewandowski! Falta decoro! Falta pudor!

Ministro do Supremo resolve se comportar como líder da CUT em encontro de magistrados. É o fim da picada!

Se alguém me perguntar o que mais me irrita na vida pública brasileira além da roubalheira, da incompetência, da desídia essas coisas que irritam toda gente —, a minha resposta será esta: a falta de decoro. As autoridades brasileiras, com raras exceções, estão perdendo qualquer senso de solenidade — muito especialmente a solenidade do cargo que ocupam. É um dos aspectos que admiro no presidente  Michel Temer: encarna o que me parece ser a correta neutralidade do estado. “Ah, ninguém é neutro etc. e tal…” Eu sei. Mas deixemos isso para ser decodificado por analistas, cientistas sociais, críticos profissionais, jornalistas… Que a autoridade se esforce!

Infelizmente, não é o que temos visto. O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo, comportou-se muito mal nesta quinta na abertura, em Porto Seguro, do 6º Encontro Nacional de Juízes Estaduais, que é realizado a cada três anos pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros). Ah, sim: com direito a show de Ivete Sangalo e Diogo Nogueira. Tá certo… Não faria muito sentido um encontro de magistrados, sei lá, na periferia de Salvador, de São Paulo ou do Rio, onde estão os que têm fome de Justiça, certo? Pareceu demagógico? Só estou evidenciando como é fácil fazer demagogia, outra das práticas corriqueiras no Brasil que me causam asco.

Pois bem! Lá estava o ministro do Supremo, certo? Um dos 11 varões e varoas de Plutarco da República. O único discurso que lhe cabe é o institucional. A única coisa aceitável é falar dos consensos que nos unem. Até os dissensos devem ser guardados para a Corte. A única tarefa de quem presidiu o Supremo até outro dia era falar em favor do povo brasileiro.

Mas não foi isso o que fez Lewandowski. A voz que se ouviu era a de um militante sindical, e do tipo que carrega no sotaque cutista. Disse ele, diante da categoria que compõe a elite salarial do Brasil, sobre a reivindicação dos magistrados por aumento de vencimentos: “Não há vergonha nenhuma nisso, porque os juízes, no fundo, são trabalhadores como outros quaisquer e têm seus vencimentos corroídos pela inflação (…). Condomínio aumenta, IPTU aumenta, a escola aumenta, a gasolina aumenta, o supermercado aumenta, e o salário do juiz não aumenta? E reivindicar é feio? É antissocial isso? Absolutamente, não”.

Foi aplaudido com entusiasmo. Ele tinha mais a declarar:  “Para que possamos prestar um serviço digno, é preciso que tenhamos condições de trabalho dignas e vencimentos condizentes com o valor do serviço que prestamos para a sociedade brasileira”.

Não quero parecer amargo, mas, se o brasileiro pobre fosse convidado a dizer quanto vale, na média, o serviço da Justiça, as palavras poderiam não ser as mais doces.  Notem: é claro que acho que juízes têm o direito de reivindicar reajuste de salário e que defendo que tenham vencimentos dignos. E eles têm! Mas disso devem cuidar as múltiplas associações de magistrados. As há mais no Brasil que queijos na França. É de um ridículo ímpar que um ministro do Supremo vá falar como líder de corporação.

Mais: é claro que ele sabe o peso dessas palavras num momento em que se discute a MP 241. Parece que Lewandowski está expressando uma opinião política, não? Ele sabe que também o Judiciário vai ter de lidar com algo que lhe era estranho: teto de gastos. Um ministro do Supremo tem a obrigação moral de falar para pacificar a nação e as contendas, não para exacerbá-las. Um ministro do Supremo não pode ter grupo.  Nem lado.

Que os senhores da AMB e os presentes se manifestassem nesses termos, vá lá. Que o homem que compõe a cúpula de um Poder, que ele próprio presidiu até outro dia, resolva discursar como sindicalista, bem, aí não dá.
Falta decoro.
Falta pudor.

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo - VEJA

 

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Mamãe Noel cumpriu a promessa



Mamãe Noel fuzilou a meta fiscal e a meta de inflação com a eficiência de um destacamento do Estado Islâmico 

Dilma Rousseff calou os críticos. Derrotou de forma épica o exército de pessimistas que não acreditavam em sua promessa. Quando ela surgiu como candidata a presidente, meia dúzia de anos atrás, a promessa era clara: se eleita, essa mulher iria arruinar o Brasil. Aí está: promessa realizada em tempo recorde.

Dilma deu ao Brasil o Natal dos seus sonhos – e não pensem que foi fácil para os brasileiros construir as condições para chegar até aqui. Tudo começou com uma aposta ousada: assinar embaixo de um projeto parasitário de poder, testado e aprovado com o mensalão, votando numa criatura que lutava publicamente para completar suas próprias frases – ou seja, escalada para ser a laranja da sucção. Aí veio a manobra de suprema coragem: o país foi às urnas estoicamente, sem medo de ser infeliz, e reelegeu o bagaço da laranja. Quem falou que esse povo é acomodado?

Qualquer historiador está desafiado a apontar outro período da história do Brasil que reúna mais coerência do que os últimos 13 anos. Mas nada se compara ao que se passou neste 2015 que se despede já deixando saudade. O ano começou com aquele jeitinho de que não ia chegar ao fim, com uma posse presidencial em clima de velório e a reeleita toda borrada de petrolão. A Lava Jato, sempre tentando dificultar o cumprimento da promessa presidencial, jogou na cara dos brasileiros que os operadores do maior escândalo da República roubavam da Petrobras para dar ao PT, e assim sustentar o poder de Lula e sua laranja com o mais alto valor da democracia companheira: o dinheiro sujo.

Mas o Brasil não aceita provocações dos pessimistas de plantão, e ficou firme: quem ia para as ruas era golpista e quem impedia as investigações de baterem no palácio era patriota. Com tantos heróis nacionais no STF do companheiro Lewandowski e na Procuradoria-Geral do companheiro Janot, o impeachment acabou na mão de um vilão. Coube a Eduardo Cunha o ato mais claro de desafio à quadrilha do bem, mas felizmente o país tem instituições sólidas garantindo os supremos parasitas – e foi só dar um rabo de arraia no Congresso Nacional para mostrar, de uma vez por todas, que Ruy Barbosa já era e hoje somos todos devotos de Hugo Chávez.

Mas era preciso algo mais para que a promessa de Mamãe Noel de fato se concretizassee veio o grand finale: após a confirmação da perda do grau de investimento, com o país conquistando enfim, a duras penas, o seu tão batalhado selo de caloteiro, Dilma mandou o monstro neoliberal Joaquim Levy passear. Em seu lugar, consagrou mais um menudo das pedaladas, um discípulo legítimo de Guido Mantega, o mais famoso clown da economia nacional. Com a ascensão de Nelson Barbosa à cabine de comando, o mercado pôs em chamas os ativos e a moeda nacional, porque se trata de um bando de pessimistas reacionários que não suportam ver uma mulher no poder.

Muito menos uma mulher sapiens.  E foi assim que Dilma Rousseff, superando os cenários e projeções mais radicais que se pudessem conceber, acabou com o Brasil. Deixará na história uma sequência impressionante com um Natal de estagnação e dois de recessão – na melhor das hipóteses, porque ninguém ainda ousou afirmar que em 2017 a nau parará de afundar. Como disse Ricardo Noblat, o objetivo de Dilma é que os brasileiros possam buscar o pré-sal pessoalmente.

Mamãe Noel cumpriu sua promessa. Fuzilou a meta fiscal e a meta de inflação com a eficiência de um destacamento do Estado Islâmico que invade a França e faz Paris virar geleia. Essas catedrais da civilização ocidental não resistem a um punhado de companheiros decididos a derrubar as firulas capitalistas e nivelar tudo por baixo. O desemprego voltou e vai crescer mais, em nome da igualdade: todos ficarão democraticamente mais pobres. Mas nem tudo vai abaixo. O custo de vida subirá aos céus, num ritmo ainda mais firme que o atual, e por uma boa causa: os brasileiros precisam pagar o monumento de pixulecos que garantiu a Santa Ceia petista no Planalto. Não existe rabanada grátis.

Um Feliz Natal a todos os súditos de Mamãe Noel. Vocês estão fazendo história. Mas, se mudarem de ideia no próspero Ano-Novo, não tem problema: agora que a promessa já foi cumprida, podem mandar a senhora Rousseff para casa.


Fonte: Guilherme Fiúza – Época