Com o auxílio luxuoso do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, o
senador Flávio Bolsonaro estilhaçou os poderes do Conselho de Administração de
Atividades Financeiras (Coaf) e o discurso do pai. A pedido da defesa do Zero
Um, Toffoli suspendeu todos os processos iniciados a partir do recebimento de dados
de órgãos de controle. Com isso, o Coaf ficou momentaneamente sem sentido e a
retórica moralizante de Jair Bolsonaro perdeu definitivamente o nexo. Em resposta
ao recurso do primeiro-filho, Toffoli tachou de "temerária" a atuação
do Ministério Público em inquéritos que envolvem o compartilhamento de dados
bancários sem autorização judicial.
[o Supremo
nunca permitiu o acesso do Ministério Público a dados sigilosos para fins
penais.]
Nessa versão, o Coaf só poderia ter
repassado dados mediante decisão de um juiz. Não faz o menor sentido.
[qualquer discussão sobre o assunto remete a uma decisão do Supremo que permite o compartilhamento de dados do Coaf com o Fisco, decisão esta que supostamente foi quebrada pelo ministro Toffoli quando proibiu a extensão do compartilhamento para o MP - federal e estadual;
- de inicio o que salta aos olhos é que um ministro suspender monocraticamente decisão do Plenário do STF não é algo inédito - no caso do ministro Toffoli se justifica plenamente visto ser ele o presidente da Corte, que está em recesso, e é representada em tal situação pelo ministro presidente;
- mas, o detalhe dos detalhes, é que como bem lembra o Editorial - O Estado de S. Paulo - Respeitando o Sigilo Bancário -
" a interpretação do Supremo Tribunal Federal de modo algum permitiu o
acesso direto do Ministério Público a dados sigilosos para fins penais. Vale
lembrar que o Supremo, ao fixar as garantias dessa comunicação de dados com o Fisco, indicou a necessidade de “prévia notificação do contribuinte quanto a instauração do
processo e a todos os demais atos”. Além disso, a própria Lei
Complementar 105/2001 estabeleceu que eventuais informações dos bancos ao Fisco
“restringir-se-ão a informes relacionados
com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais
mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita
identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados”. Não
poderia ser diferente, pois a lei veio regulamentar – e não abolir – o
sigilo das operações financeiras." (destaques do Blog Prontidão Total).
O compartilhamento agora proibido pelo ministro Toffoli, nunca foi liberado pelo STF.]
Criado há 21 anos, o Coaf tem como principal atribuição identificar
transações bancárias suspeitas. As instituições financeiras são obrigadas a
comunicar ao órgão a ocorrência das chamadas movimentações
"atípicas". Confirmando-se os indícios de práticas criminosas
—lavagem de dinheiro, por exemplo— o Coaf é obrigado por lei a comunicar às
autoridades. Isso jamais foi entendido como quebra de sigilo bancário, como
alegam agora os advogados de Flávio Bolsonaro. No caso do filho do presidente,
observou-se o manual. Acionado pelo Coaf, o Ministério Público do Rio farejou
malfeitorias em diversos gabinetes da Assembleia Legislativa fluminense, entre
eles o de Flávio Bolsonaro. Aí sim, em fase posterior, requisitou-se
autorização judicial para apalpar minuciosamente os dados bancários.
Desbaratou-se um esquema de desvio de verbas públicas no gabinete de
Flávio. O operador Fabrício Queiroz já admitiu que recolhia parte dos salários
dos servidores. Alegou que o agora senador não sabia. A investigação avançou.
Identificaram-se depósitos e transações imobiliárias esquisitas do próprio
filho do presidente. Tudo muito radioativo. O despacho de Toffoli não beneficia
apenas Flávio e o escudeiro Queiroz. Alcança todos os casos análogos abertos no
país. Como se trata de uma decisão liminar, terá de ser confirmada pelo
plenário do Supremo. Algo que só deve ocorrer em 21 de novembro, pois Toffoli
enganchou o recurso do primogênito num outro processo em que se discute a a
legalidade do compartilhamento de dados sigilosos por órgãos de controle.
Indiretamente, Toffoli acabou oferecendo um escudo também a Jair Bolsonaro. No
miolo do processo que envolve o Zero Um, a coleta malcheirosa realizada por
Fabrício Queiroz faz conexão na conta bancária da primeira-dama Michelle
Bolsonaro. O faz-tudo do filho repassou à mulher do hoje presidente pelo menos
R$ 24 mil. Radioatividade pura.
Na
votação da medida provisória que reorganizou a Esplanada dos Ministérios, o
governo Bolsonaro pegou em lanças pela transferência do Coaf para a pasta da
Justiça. Alegava-se que Sergio Moro azeitaria a colaboração do órgão com o
Ministério Público. A movimentação de Flávio Bolsonaro no Supremo transformou o
Coaf num apêndice inútil e fez da argumentação oficial a mais perfeita tradução
da expressão conversa fiada.