Advogados negam que deputado afastado tenha desrespeitado decisão do STF
Absurdo, assustador, inacreditável, absolutamente despropositado,
policialesco, ilegal, inconstitucional, exorbitante, ilógico,
desproporcional, excessivo, verdadeira aventura jurídica. Esses foram
alguns dos termos usados pela defesa do presidente afastado da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para qualificar o pedido de prisão feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
A palavra "absurdo" e suas variações, por exemplo, foram usadas sete
vezes no documento apresentado nesta sexta-feira no Supremo Tribunal
Federal (SFT).
A defesa ataca os três motivos apontados por Janot para pedir a prisão. O procurador-geral entende que eles indicam que Cunha tenha descumprido decisão do STF tomada em 5 de maio. Na época, Teori determinou e o plenário concordou em afastá-lo do cargo de presidente da Câmara. Seus advogados alegam, porém, que, assim que houve tal decisão, ele deixou imediatamente as funções de presidente da casa. "Daí porque foi com imenso espanto que os signatários se defrontaram com os fundamentos dos pedidos", diz trecho da petição de Cunha. Sobraram críticas até mesmo para a decisão do STF que o afastou do cargo. Segundo a defesa, ela foi "manifestamente atípica na ordem jurídica" e "verdadeira inovação".
O primeiro dos motivos alegados por Janot é um ato da Mesa Diretora da Câmara que garantiu a Cunha, mesmo depois de afastado do exercício do mandato, alguns direitos conferidos ao titular do cargo de presidente da Câmara. Segundo os advogados do deputado, não foi ele quem assinou tal documento. E destacam que os direitos assegurados guardam semelhança com aqueles garantidos à presidente afastada da República Dilma Rousseff após votação no Senado que deu continuidade ao processo de impeachment.
Outro elemento destacado por Janot foi entrevista que Cunha deu em 19 de maio, após participar de sessão no Conselho de Ética da Câmara, em que ele se defendeu das acusações que podem levar à cassação de seu mandato. Na época, ele disse que voltaria a frequentar seu gabinete na Câmara, mesmo afastado do exercício do mandato. Mas a defesa argumenta que, para evitar problemas, ele mesmo optou por não voltar a andar nos corredores do Congresso. A única vez que fez isso desde que foi afastado do cargo foi justamente no dia em que foi se defender no Conselho de Ética.
Por fim, a defesa de Cunha negou que ele tenha emplacado nomes no governo do presidente interino da República Michel Temer, conforme havia acusado Janot. Os advogados citam o artigo 53 da Constituição, segundo o qual parlamentares só podem ser presos em flagrante de crime inafiançável. Além disso, em até 24 horas, é preciso mandar a decisão para a Câmara avalizá-la. Mencionam também os incisos do artigo 5º, que tratam de crimes inafiançáveis. "O defendente não foi preso em flagrante. Não há crimes cometidos, tampouco inafiançáveis, na medida em que não se encontra na manifestação ministerial menção aos incisos XLII, XLIII e XLIV do artigo 5º da Constituição Federal. Conclusão: a vedação constitucional não pode ser superada", diz trecho do documento apresentado pela defesa.
Os advogados também acusaram Janot de querer sobrepor o Código Penal à Constituição. "A interpretação proposta pelo Ministério Público, em verdade, revela o grande problema de nossos tempos de pós-positivismo: o intérprete crê que tudo pode. Supera a literalidade e a inteligência do texto constitucional para decidir como bem quer", escreveram os advogados.
Dizem também que o caso é diferente daquele vivenciado pelo ex-senador Delcídio Amaral. Ele foi preso em novembro do ano passado, quando era líder do governo no Senado, por tentar comprar o silêncio do ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveró. Na época, o STF considerou que havia um crime de natureza permanente, o que possibilitou caracterizá-lo como flagrante. No caso de Cunha, a defesa diz que Janot sequer levou isso em conta.
O documento é assinado pelos advogados Pedro Ivo Velloso, Ticiano Figueiredo, Alvaro da Silva e Célio Júnio Rabelo.