Treze anos de governo de dois presidentes do PT, um impeachment, mensalão e petrolão depois, o que se vê é a esquerda brasileira chegar às urnas tendo abdicado sem titubear à discussão sobre combate à impunidade, reforço nas leis de combate à corrupção – muitas aprovadas no governo Lula – e compromisso com a transparência na gestão pública. Atados irremediavelmente à “narrativa” de que Lula e o partido são vítimas de perseguição da Justiça, da Polícia Federal, do Ministério Público, do Congresso e sabe-se lá de quantas outras instituições, os petistas renunciaram, até, a louvar decisões que atingem adversários, como Eduardo Azeredo, ex-grão-tucano condenado e preso como Lula, ou Eduardo Cunha, algoz de Dilma Rousseff e sem nenhuma perspectiva de soltura.
Fazê-lo significaria reconhecer que há uma nova perspectiva, que nasce da PF, do MPF e das instâncias iniciais do Judiciário, de utilizar os mecanismos disponíveis nas leis e nos códigos para garantir que crimes do colarinho-branco (de quaisquer partidos) sejam efetivamente pagos e seus praticantes, punidos. A esperança dos partidos que antes empunhavam a bandeira da ética nos palanques e nos programas do horário eleitoral é que seu líder máximo conte com uma ajuda na undécima hora de ministros de uma Corte cindida, como é hoje o STF, para poder concorrer à Presidência da República. Mas Lula foi condenado em duas instâncias, e o STF não pode rever a condenação, apenas mexer eventualmente na pena ou no regime de cumprimento. Os petistas não se importam. Outras condenações podem vir em vários processos a que Lula responde. Perseguição, repetem. Mas a Lei da Ficha Limpa fala em condenação por colegiado – o que Lula já tem – e não em condenação final. Golpe, só para tirar Lula do pleito.
Divorciada da própria história, a esquerda abre mão de dialogar com o conjunto da sociedade, que elegeu a corrupção como assunto central em 2018. Trata-se de uma decisão que cobrará um preço maior que a pena deste ou daquele companheiro.
Vera Magalhães - O Estado de S. Paulo