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sábado, 25 de novembro de 2017

Os políticos estão nus, sem pudores

A putrefação da política brasileira parece ter atingido seu ápice, seu registro lapidar, na situação enfrentada hoje pelo Rio de Janeiro. Ali vive-se a falência absoluta da representatividade. Não bastassem os seguidos problemas de violência, caos social e pane dos serviços públicos a região tem que amargar mais essa triste e desmoralizante realidade. A folha corrida dos eleitos pelo povo é de estarrecer. Quase nenhuma autoridade, em mandato ou não, escapa. Do Legislativo ou do Executivo. 

Na semana passada, três ex-governadores e quatro ex-presidentes da assembleia legislativa local encontravam-se trancafiados atrás das grades. Além deles, dezenas de secretários, parlamentares e afins tinham o mesmo destino, por malversações de toda ordem. Um quadro pavoroso. Lamentável. Verdadeira aberração moral para uma sociedade que há quase duas décadas (desde 1998), pelo menos, é comandada ali por quadrilheiros e saqueadores sistemáticos de recursos do Estado. Como pontuaram, estarrecidos, vários cidadãos fluminenses, TODOS os governadores do Rio eleitos desde 98 e TODOS os presidentes da assembleia escolhidos desde 95 foram parar na cadeia. 

Nem dá para acreditar. Alguma coisa está muito errada nesse reino do fisiologismo e do voto de cabresto controlado por poderosos habituais. É espantoso o grau de periculosidade de suas excelências. No passado não muito longínquo, nos idos de 1949, o deputado Edmundo Barreto Pinto se tornou o primeiro político cassado por falta de decoro. Ele não havia feito nenhum assalto aos cofres públicos. Longe disso. O delito: ter posado de cuecas para uma foto. Bons tempos aqueles em que o máximo de transgressão parlamentar observada era essa, digamos, falta de compostura. Hoje a maioria dos votantes se pergunta se vale voltar às urnas para eleger um candidato que ao menos pareça honesto. Naturalmente, não há salvação fora da política. A questão é que tipo de política vem sendo praticada, como mudá-la e com quem mudá-la. Ou, ao menos, como rever as regras. Não é normal e denota um estágio de avançada gangrena moral a bagunça que se instaurou na plenária da Alerj há alguns dias. 

Ali os caciques imperam, atuam em corriola, se protegem e fecham os olhos a qualquer desvio dos colegas, aliados ou não, numa prática multipartidária, e sem hegemonia ideológica à esquerda ou à direita, para locupletar a patota. Não importa o crime, muito menos o tamanho do prejuízo provocado à população. As raposas controlam o galinheiro, enquanto cidadãos fazem das ruas palco de quebra-quebra em protesto exigindo faxina. Luta inglória! Tome-se o exemplo concreto dos três deputados – Jorge Picciani, atual presidente da Alerj, Paulo Melo, o antecessor, e Edson Albertassi, também da cúpula – que em poucos dias tiveram a prisão decretada, foram soltos e depois novamente recolhidos ao xilindró, num dos espetáculos mais bizarros de disputa entre poderes de que se tem notícia. O Tribunal Regional da 2º Região, em decisão unânime, [também unanimemente inconstitucional.] mandou o trio às grades sob a acusação de recebimento de milionárias propinas. 

Como previsível, a prisão foi revogada pela Alerj, porque ali a tropa de choque de Picianni & Cia. manda e desmanda. [mandasse a turma de Picianni, a de Lula ou de qualquer outro ladrão, tinha que prevalecer o que a Constituição determina, soltar os parlamentares que não foram presos em flagrante por crime inafiançável.
A decisão do TRF 2ª Região foi, e continua sendo, flagrantemente inconstitucional.

Tanto que o TER-2ª se ateve para revogar a soltura dos deputados a um mero procedimento burocrático que não foi cumprido pela ALERJ - o alvará de soltura tinha que ser expedido por aquele tribunal, assim, deveria a ALERJ ter comunicado àquela Corte, por ofício,  sua decisão de soltar os parlamentares e o TRF - 2 expediria o competente Alvará.

O mais absurdo é um tribunal viola Constituição Federal , revogue uma decisão da Assembleia Legislativa do Rio por descumprimento de um mero detalhe burocrático.] Os danos causados pela interpretação propositalmente parcial sobre a imunidade parlamentar ficaram logo evidentes. A Alerj entendeu que ninguém mete a mão em quem é da casa e trouxe o grupo de volta. Estava assim sacramentada entre os áulicos da instituição a defesa de uma espécie de licença para delinquir, a ser distribuída entre os seus e agregados. O STF entrou no meio para acabar com a fuzarca. [O STF não se manifestou ainda sobre a confusão absurda - absurda por estar em discussão se o que está escrito na Constituição é para ser cumprido, ou depende da vontade do STF - que não legisla, nem tem Poder para DESCUMPRIR a Constituição Federal.

O que houve foi uma manifestação do ministro Fux - ministro que já 'cometeu' a proeza de votar contra uma liminar que ele mesmo havia concedido - e do ministro Marco Aurélio que entre muitas 'escorregadas' destaca-se uma que em decisão monocrática revogava parte da Constituição - felizmente, o Plenário do Supremo corrigiu a escorregada.] O ministro Fux definiu a decisão como lamentável. Seu colega na Alta Corte, Marco Aurélio Mello, se disse abismado. O Supremo restaurou a ordem de trancafiar o bando. Na prática, o Rio, apesar do desfecho pela justiça, segue como uma terra sem lei, também no plano político. Enquanto isso, Picciani e seus comparsas experimentam a hospedagem no presídio de tratamento especial, cujas celas mostram conforto acima da média e abrigam ainda outros detentos ilustres como Cabral, Garotinho e a mulher, Rosinha. Encarcerar o bando não é, decerto, garantia de solução definitiva. 

Até as pedras que margeiam o Rio sabem. Na contabilidade geral, não apenas na esfera fluminense como em todo o Brasil, existem perto de 55 mil autoridades o número é esse mesmo! – com o chamado foro privilegiado, o que dá a essas figuras o direito à proteção incondicional em inúmeras circunstâncias. No STF a discussão sobre algumas restrições ao foro privilegiado finalmente entrou na pauta. A tendência é que prevaleça nos tribunais a tese de que esse direito ficará reservado para casos de desvios de conduta referentes exclusivamente ao cargo. Já seria um começo. [até que o andamento do processo para restringir o foro privilegiado andava bem, mas, o ministro Toffoli, se valeu do recurso 'pedido de vista obstrutivo' e parou toda a discussão. Por quanto tempo? Só Deus sabe.
Temos o exemplo do ministro Fux que em 2014 apresentou pedido de vista  (o já famoso pedido de vista obstrutivo) sobre a ação que cuida do auxílio-moradia para juízes e membros do MP e desde então o assunto está parado, sem a menor previsão de voltar a andar.]

Carlos José Marques,diretor editorial da Editora Três - IstoÉ