Eis a
penúltima de Jair Bolsonaro: o presidente informou que pretende nomear o
deputado federal Eduardo Bolsonaro para o posto de embaixador do Brasil nos
Estados Unidos. Em entrevista, expôs as credenciais do filho Zero Três:
"Ele é amigo dos filhos do Donald Trump, fala inglês e espanhol, tem uma vivência
muito grande do mundo. Poderia ser uma pessoa adequada e daria conta do recado
perfeitamente." Se confirmada, a indicação será imprópria, insultuosa e
desrespeitosa.
Será imprópria porque a acomodação de um filho em posto público de tal
relevância é coisa de autocrata nepotista. Será insultuosa porque o Bolsonaro
preterirá inúmeros embaixadores à disposição nos quadros do Itamaraty. Será
desrespeitosa porque Eduardo jogará no lixo os votos de 1,8 milhão de eleitores
paulistas, renunciando ao mandato. O nepotismo está tipificado na súmula 13 do
Supremo Tribunal Federal. Anota que "a nomeação de cônjuge, companheiro ou
parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau,
inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica,
investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, ppara o exercício de cargo em comissão ou de
confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e
indireta, em qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e
dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a
Constituição". Ou seja: haverá questionamento jurídico. É certo como o
nascer do Sol a cada manhã. [Desrespeitosa será, afinal 1.800.000 de eleitores que votaram em Eduardo Bolsonaro não o escolheram para embaixador. Mas, o desrespeitado, o eleitor, decidirá, soberanamente se e quando Eduardo for candidato a cargo eletivo votará nele ou não;
A renúncia por ser ato unilateral não é passível de questionamento e quem a recebe tem uma única opção: encaminhar para o devido processamento - não cabe análise.
Aliás, foi devido a uma interpretação errada - considerou que a sua carta de renúncia seria analisada, negociada, etc - que Jânio perdeu o cargo de presidente da República.
Insultuosa não é, tendo em conta que o direito do presidente escolher pessoa de sua confiança é inalienável;
Imprópria também não, visto que além de decisões de ministros do STF entendendo que a nomeação de parente para cargo político não configura nepotismo, inclusive não viola a Súmula 13, já que a suposta troca ocorre em nomeações para dois países, e a nomeação do filho de Trump não depende de Bolsonaro nem a do filho deste depende do presidente americano.
As qualificações são examinadas inicialmente por quem indica; após o Senado terá oportunidade de examinar, sabatinar e votar.]
Ser "amigo dos filhos de Trump" e falar um par de idiomas não
são credenciais suficientes para comandar a embaixada em Washington, posto mais
relevante mantido pelo Brasil no exterior. Está vago desde abril, quando
Bolsonaro ejetou da poltrona, sem motivo aparente, o experiente embaixador
Sergio Amaral. O substituto precisa ter qualificação diplomática, econômica e
administrativa. Isso exige anos de formação. Há no Itamaraty opções de
mostruário. É só escolher. Não há precedente de indicação de forasteiros para
esse posto. Muito menos de filho. A renúncia ao mandato de deputado é ato
unilateral. Mas mexe com o desejo de todos os eleitores que enxergaram no Zero
Três credenciais para representá-los na Câmara até o ano da graça de 2022. A
interrupção voluntária desse, digamos, contrato político tem nome: estelionato
eleitoral. O primeiro da fila para ocupar a vaga é o suplente Sattin Rodrigues
(PSL). Obteve exíguos 25,9 mil votos —um asterisco, perto da legião que votou
em Eduardo Bolsonaro. [a legislação permite que alguém se torne senador da República com apenas um voto - basta ser indicado suplente e pronto.]
Convém
lembrar que as indicações de embaixadores precisam passar pelo Senado. O
escolhido passa por sabatina na Comissão de Relações Exteriores. Se for
aprovado ali, o nome vai ao plenário. Por uma trapaça da sorte, a votação é
secreta. Os senadores costumam ser condescendentes. Mas Bolsonaro, movido por
uma ideia fixa de criar polêmicas, decidiu cutucar os senadores para ver se
eles mordem. Esse pode ser o seu quarto erro neste caso.
Publicado no UOL - Blog do Josias de Souza