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quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

A demofobia envenena a intervenção



Não se espera que a tropa venha como o coelhinho da Páscoa, mas não se pode chegar com ameaças aos cidadãos 

Michel Temer já viu governo derretendo. Em 2013, quando o monstro da opinião pública estava nas ruas, a presidente Dilma Rousseff tirou um gambá da cartola e propôs uma Constituinte exclusiva para fazer a reforma política. Um telefonema de seu vice (ele) ajudou-a a perceber que aquilo era pura maluquice. Passaram-se cinco anos, Temer está na cadeira da doutora e peregrina com gambás na cartola.

No primeiro dia útil depois do decreto de intervenção federal, horas antes da aprovação da medida pelo Congresso, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, informou:  “Algumas medidas talvez sejam necessárias, como a realização do que se chama mandado coletivo de busca e apreensão.”
E explicou:
“Na realidade urbanística do Rio de Janeiro, você muitas vezes sai com a busca e apreensão numa casa, numa comunidade, e o bandido se desloca. Então você precisa ter algo como o mandado de busca e apreensão e de captura coletivo para uma melhor eficácia do trabalho a ser desenvolvido.”

A geografia a que o doutor se referiu é a dos bairros pobres da cidade, onde, salvo os bandidos, ninguém foi para lá porque se encantou com o lugar. Por trás da ideia dos mandados coletivos está a noção demófoba segundo a qual quem mora nesses bairros, e não no Leblon, tem algo a esconder. [em termos de violência tradicional, a do crime organizado, o maior foto está nas favelas - a violência da corrupção, do colarinho branco, ela está em lugares em que a pobreza não impera de forma tão ostensiva.
Não temos amor pelo Jungmann, mas, nessa ele se expressou corretamente e o que disse foi apenas a verdade.
Qualquer um que conheça uma favela sabe que lá não funciona o sistema convencional de endereços.]  É gente constrangida pelos bandidos, achacada pelos milicianos e abandonada pelo poder público, mas não se confia nela.

No segundo trecho da fala de Jungmann havia um erro, a referência ao “mandado (...) de captura coletivo”. Nunca houve coisa parecida, nem durante a vigência do Ato Institucional nº 5. (Noves fora a ação militar no Araguaia, onde fizeram-se prisões em massa e queimaram-se casas de roceiros.) Horas depois, o ministro corrigiu-se, dizendo que a referência às capturas foi um “mal-entendido”. Foi um erro, muito bem entendido.

Passou-se uma noite, e ontem o governo foi convencido de que a ideia do mandado coletivo de busca e apreensão era uma girafa. Temer 2018 arrebatou o troféu Dilma 2013.  Dilma poderia ter telefonado para Temer antes de tirar o gambá da cartola. Temer poderia ter telefonado para algum advogado amigo (ele os tem) antes de patrocinar a nova mágica.  Improvisada e demófoba, a intervenção na segurança do Rio começou da pior maneira possível. É isso que acontece quando o governo faz a opção preferencial pela marquetagem. (Viva Pezão, a batata quente da segurança do Rio foi para o colo de Temer.) [o que mais tem são 'especialistas' falando sobre a intervenção; até o Blog Prontidão Total está repleto de especialistas.
Chamamos a atenção para um pequeno detalhes - afinal conhecemos um pouco da cabeça dos militares, como pensam, e isso nos leva a lembrar aos nossos dois leitores (ninguém e todo mundo) que não esqueçam que além de interventor federal no Rio o general Braga Netto é Comandante MIlitar do Leste.
Seu poder é um dos maiores do Brasil - mais de 50.000 homens só  no CML - e o apoio dos demais Comandos Militares.
Um interventor que é ao mesmo tempo comandante de um Comando Militar tem muita força. Quando ele decidir movimentar tal força, o que está sendo decidido em reuniões de paisanos não vai contar muito.]

As forças da ordem não precisam entrar nesses bairros vestidas como coelhinhos de Páscoa, mas também não precisam de protofonias cinematográficas. Para Michel Temer e para a torcida do Flamengo, tudo iria melhor se ninguém pudesse falar em nome da operação do general Braga Netto. Falariam o general, quando achasse necessário, e seu porta-voz autorizado. Só. Em operações recentes o Exército usou esse sistema, com sucesso. Está na mesa a encrenca em que se meteu o chefe da Polícia Federal, Fernando Segovia, por falar demais. Depois de anos de silêncio de seu antecessor, ele se revelou um adorador de holofotes. Deu no que deu. Se blá-blá-blá resolvesse problema, o Rio seria o que já foi.


Elio Gaspari, jornalista - O Globo