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segunda-feira, 18 de março de 2019

O sono da razão de assassinos intoxicados

Como de praxe, até celibatários que nada entendem de formação de crianças e educação de alunos intoxicaram o distinto público com seus diagnósticos



Deonísio da Silva
O pintor espanhol Francisco de Goya retratou-se sentado e dormindo sobre suas anotações. Seu corpo luta para não dormir, mas a força do sono é maior.
Atrás dele, criaturas soturnas espreitam o sono do pintor: morcegos, linces, corujas e um gato preto, representando fantasmas e medos do artista. Talvez a obra de Goya sirva de moldura para outro massacre numa escola brasileira, que serviu de pretexto para falsas interpretações.

Como de praxe, até celibatários que nada entendem de formação de crianças e educação de alunos intoxicaram o distinto público com diagnósticos mais arrumadinhos e mais bem aparados do que seus cabelos e pestanas, preocupados em aparecer, dando a impressão de que sabem de tudo, como sempre. Não sabem. E mostram isso logo ao abrir a boca. Mas enganam bem, há muito tempo e a muita gente.

As coisas, porém, começam a mudar. Assim, houve quem trouxe, como o psicólogo, advogado e assistente social Jacob Pinheiro Goldberg, ainda no calor da hora, o claro raio ordenador para ver os acontecimentos à luz de prática e teoria combinadas.  Em resumo, as raízes destas tragédias de já assustadora frequência estão no ambiente intoxicado em que vivem os estudantes, onde é patente a falta de autoridade sobre adolescentes e jovens, seja por parte dos pais, seja por parte dos professores, e no caráter violento da sociedade brasileira e seu complexo sistema de exclusões, sem esquecer o lado patológico e demoníaco do mal em si mesmo. De resto, a razão ainda esbarra em aspectos inexplicáveis do cotidiano, mesmo quando não está dormindo.

Mas o fato é que para milhões de brasileiros, sejam crianças, adolescentes, jovens ou adultos, sempre falta quem lhes possa dizer não. “Manda quem pode e obedece quem tem juízo”, diz o provérbio, mas no Brasil o verbo obedecer virou pesado anátema. Mandar também.  Sem contar que muitas drogas rondam as escolas, não apenas o tóxico, associado aos mais diversos crimes, como sabem aqueles que frequentam o ambiente escolar e universitário.

A própria palavra assassino veio do Árabe haxaxin, fumador de haxixe, droga utilizada para instigar jovens bandoleiros a assaltar e matar os cruzados nos desfiladeiros do Irã, a caminho de Jerusalém, entre os séculos XI e XII. Haxix designa erva seca em árabe, que pode ser feno, forragem, mas também o cânhamo, cannabis sativa em Latim e makanha em Quimbundo, uma língua africana. Deu maconha em Português.
O haxixe e a maconha tornaram-se drogas de referência, mas no berço estas palavras ainda estavam cobertas pela pureza das designações originais, sem quaisquer ligações com o crime.

Entre fins do século XI e começos do XII, durante as primeiras cruzadas, um líder religioso nizarita, ramo dissidente do islamismo xiita, notabilizou-se por liderar um bando que cometia as maiores atrocidades nos desfiladeiros do Irã. Conhecido pelo apelido de Velho da Montanha, por refugiar-se entre as montanhas do Norte do Irã, numa fortaleza conhecida por Alamute, cujo significado é Ninho da Águia em língua persa, o ancião chamava-se Hassan ibn al-Sabbah Homairi e, depois de perpetrar inumeráveis homicídios, foi executado pelas tropas de Gengis Khan em 1124, aos 90 anos.

Ele e seus liderados tinham, porém, cometido tantos homicídios em mais de meio século de assaltos sistemáticos que a palavra assassino, cujo étimo veio da erva consumida, com influências do nome do próprio chefe, chegou ao Português e substituiu homicida, confinado aos territórios jurídicos da lei, o mesmo ocorrendo em outras línguas. Os jovens assassinos autores do massacre na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano (SP), fizeram com que palavras como assassino, bárbaro, pavor e medo fossem invocadas para descrever a situação de pânico que instauraram ali. É curioso que esteja ausente a palavra fobia nessas horas, que reservamos para medos irracionais, como homofobia, claustrofobia, demofobia etc.

Outras singularidades estão no tenebroso e trágico contexto. O professor Raul Brasil, que dá nome à escola paulista onde houve o massacre, era casado com uma senhora chamada Otília. Eles tiveram dez filhos e a todos deram nomes iniciados por H: Helena, Hugo, Herval, Hélio, Heitor, Hilda, Heberth, Hebe, Haydeé e Heros.  No reino das palavras, escrevendo apenas para dizer outras coisas, não com o fim de acrescentar alguma luz sobre a tragédia, mas com o propósito de aliviar a tamanha tristeza que tomou conta de todos, lembremos que a inocência original das palavras é violada de forma inaudita quando elas são usadas para expressar outras realidades.

Assim, a palavra escola está mudando de significado ao longo destas últimas décadas no Brasil. Pouco se aprende ali, pela decadência assustadora do ensino, e para piorar tornou-se, como as igrejas, os templos, as universidades, as mesquitas e as sinagogas em tantos lugares do mundo, um alvo de terroristas desesperados para aparecer na mídia, ainda que o coroamento de seus atos seja o suicídio. Algo deve ser feito e a sociedade ainda não sabe como defender-se de assassinos que querem matar, mas também querem morrer junto com suas vítimas.
Uma tarefa urgente, porém, se impõe: acordar a razão.
*Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá
http://portal.estacio.br/instituto-da-palavra

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Mandado coletivo, uma falsa polêmica



Mandado coletivo de busca e apreensão pode ser essencial em algumas circunstâncias para a conclusão de um trabalho de inteligência e investigação

Tome-se por hipótese que uma investigação policial identificou em determinado prédio residencial o cativeiro em que sequestradores mantêm reféns. A polícia, no entanto, não sabe em que apartamento estão o bandido e suas vítimas. Pede, então, ao juiz um mandado que lhe permita vistoriar todo o prédio para localizar o esconderijo e salvar vidas.

Esse é o fundamento de um mandado coletivo de busca e apreensão, que tanta celeuma causa há dias, apesar de ser utilizado desde 2012, ainda que não tenha produzido jurisprudência específica. O recurso pode ser essencial em algumas circunstâncias para a conclusão de um trabalho de inteligência e investigação, depende de concessão judicial e não constitui regra, mas exceção. Não obstante, é alvo de questionamentos que o condenam por antecipação, na suposição de que será utilizado ao bel-prazer da autoridade policial, quando e onde bem entender.

Antes de mais nada, é preciso enfrentar a hipocrisia intelectual que, à semelhança dos traficantes nas favelas, coloca os inocentes como escudo de suas teses para aparentemente defendê-los (sem mandato para tal) de um instrumento que os favorece e que só pode ser utilizado com autorização judicial, caso a caso. Valem-se da topografia carioca, de morros e asfalto, para condenar os mandados em comunidades cuja característica é de habitação geminada, comumente utilizada pelos traficantes — não raro à força — para esconder seus arsenais de armas e drogas, dificultando a ação da polícia.

Outros argumentam que a intervenção federal, pelo fato de ser exercida por um general, ameaça os direitos humanos e, mesmo, as vidas de inocentes, pobres e oprimidos em ambiente em que só o traficante é livre.  Como se a intervenção já não configure uma reação máxima do governo federal a um cenário de violência fora de controle, em que milhares de inocentes morrem — agora até mesmo no útero, agravando estatísticas maiores que as de guerras em curso no mundo. [vamos ser sinceros: enquanto deixar essa turma que se preocupa com os direitos humanos dar palpites, a criminalidade vai continuar crescendo no Brasil, dominando as favelas e também o asfalto.

Todos devem ter visto que uma dessas ONGs de 'direitos humanos', aproveitando a agitação decorrente da intervenção federal decretadadivulgou estatísticas em que condena a 'violência policial', o 'elevado número de mortos pela polícia', as péssimas condições das prisões'.

O presidente da tal ONG em nenhum  momento fez menção ao elevado número de policiais mortos no cumprimento do dever, a crianças assassinadas por balas perdidas (resultado de confrontos entre a polícia e traficantes - se acabar com os traficantes não haverá mais confrontos nem balas perdidas), mulheres grávidas sendo assaltadas por bandidos que apontam armas para a barriga da assaltada (ocorreu ontem em Brasília e vez ou outra ocorre no Rio e em outras cidades).

Para aquele individuo que preside uma ONG que deveria ser proibida de se manifestar no Brasil fazendo apologia ao crime, o que está errado no Brasil é que os bandidos não são bem tratados.
Ele e provavelmente toda a ONG não estão nem aí para policiais mortos; para vítimas inocentes mortas.
Para ele o que interessa é que os bandidos sejam bem tratados.]

E como se os milhões de habitantes que vivem em comunidades sob o controle do tráfico não estejam espoliados nos seus direitos constitucionais mais elementares, entre os quais o de ir e vir e o de votar livremente. A intervenção veio resgatar a ordem democrática, e sua decretação cumpriu os preceitos constitucionais que a regem — e dentro deles se manterá. Foi uma decisão político-administrativa, amplamente aprovada pelo Congresso Nacional e restrita ao aparelho de segurança estadual. [combater bandido com 'democracia' e 'direitos humanos' para os criminosos é perder tempo.]
 
Sabe-se que o Rio não centraliza as preocupações apenas por suas estatísticas de violência, mas pela dominação de territórios pelo crime que faz vigorar suas próprias “Constituições”, inclusive determinando quais candidatos podem ali fazer suas campanhas.  Tem-se aí um Estado paralelo com representação parlamentar e, portanto, com prerrogativa para indicações políticas na estrutura pública, porta de passagem da criminalidade para o Estado.

Entre outros objetivos, a intervenção visa a romper as cadeias de transmissão entre áreas do setor público com o crime organizado, sendo o mandado judicial um entre tantos instrumentos legais para legitimar as ações policiais em qualquer área — e não só nas comunidades mais pobres.
Tratar instrumento judicial como demofobia, para além da rima, pode soar uma demagogia que nos aprisiona em uma falsa polêmica.

Raul Jungmann, ministro da Defesa


quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

A demofobia envenena a intervenção



Não se espera que a tropa venha como o coelhinho da Páscoa, mas não se pode chegar com ameaças aos cidadãos 

Michel Temer já viu governo derretendo. Em 2013, quando o monstro da opinião pública estava nas ruas, a presidente Dilma Rousseff tirou um gambá da cartola e propôs uma Constituinte exclusiva para fazer a reforma política. Um telefonema de seu vice (ele) ajudou-a a perceber que aquilo era pura maluquice. Passaram-se cinco anos, Temer está na cadeira da doutora e peregrina com gambás na cartola.

No primeiro dia útil depois do decreto de intervenção federal, horas antes da aprovação da medida pelo Congresso, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, informou:  “Algumas medidas talvez sejam necessárias, como a realização do que se chama mandado coletivo de busca e apreensão.”
E explicou:
“Na realidade urbanística do Rio de Janeiro, você muitas vezes sai com a busca e apreensão numa casa, numa comunidade, e o bandido se desloca. Então você precisa ter algo como o mandado de busca e apreensão e de captura coletivo para uma melhor eficácia do trabalho a ser desenvolvido.”

A geografia a que o doutor se referiu é a dos bairros pobres da cidade, onde, salvo os bandidos, ninguém foi para lá porque se encantou com o lugar. Por trás da ideia dos mandados coletivos está a noção demófoba segundo a qual quem mora nesses bairros, e não no Leblon, tem algo a esconder. [em termos de violência tradicional, a do crime organizado, o maior foto está nas favelas - a violência da corrupção, do colarinho branco, ela está em lugares em que a pobreza não impera de forma tão ostensiva.
Não temos amor pelo Jungmann, mas, nessa ele se expressou corretamente e o que disse foi apenas a verdade.
Qualquer um que conheça uma favela sabe que lá não funciona o sistema convencional de endereços.]  É gente constrangida pelos bandidos, achacada pelos milicianos e abandonada pelo poder público, mas não se confia nela.

No segundo trecho da fala de Jungmann havia um erro, a referência ao “mandado (...) de captura coletivo”. Nunca houve coisa parecida, nem durante a vigência do Ato Institucional nº 5. (Noves fora a ação militar no Araguaia, onde fizeram-se prisões em massa e queimaram-se casas de roceiros.) Horas depois, o ministro corrigiu-se, dizendo que a referência às capturas foi um “mal-entendido”. Foi um erro, muito bem entendido.

Passou-se uma noite, e ontem o governo foi convencido de que a ideia do mandado coletivo de busca e apreensão era uma girafa. Temer 2018 arrebatou o troféu Dilma 2013.  Dilma poderia ter telefonado para Temer antes de tirar o gambá da cartola. Temer poderia ter telefonado para algum advogado amigo (ele os tem) antes de patrocinar a nova mágica.  Improvisada e demófoba, a intervenção na segurança do Rio começou da pior maneira possível. É isso que acontece quando o governo faz a opção preferencial pela marquetagem. (Viva Pezão, a batata quente da segurança do Rio foi para o colo de Temer.) [o que mais tem são 'especialistas' falando sobre a intervenção; até o Blog Prontidão Total está repleto de especialistas.
Chamamos a atenção para um pequeno detalhes - afinal conhecemos um pouco da cabeça dos militares, como pensam, e isso nos leva a lembrar aos nossos dois leitores (ninguém e todo mundo) que não esqueçam que além de interventor federal no Rio o general Braga Netto é Comandante MIlitar do Leste.
Seu poder é um dos maiores do Brasil - mais de 50.000 homens só  no CML - e o apoio dos demais Comandos Militares.
Um interventor que é ao mesmo tempo comandante de um Comando Militar tem muita força. Quando ele decidir movimentar tal força, o que está sendo decidido em reuniões de paisanos não vai contar muito.]

As forças da ordem não precisam entrar nesses bairros vestidas como coelhinhos de Páscoa, mas também não precisam de protofonias cinematográficas. Para Michel Temer e para a torcida do Flamengo, tudo iria melhor se ninguém pudesse falar em nome da operação do general Braga Netto. Falariam o general, quando achasse necessário, e seu porta-voz autorizado. Só. Em operações recentes o Exército usou esse sistema, com sucesso. Está na mesa a encrenca em que se meteu o chefe da Polícia Federal, Fernando Segovia, por falar demais. Depois de anos de silêncio de seu antecessor, ele se revelou um adorador de holofotes. Deu no que deu. Se blá-blá-blá resolvesse problema, o Rio seria o que já foi.


Elio Gaspari, jornalista - O Globo