Tânia Monteiro
Oficiais-generais ouvidos pelo 'Estado' dizem que Forças Armadas são instituições permanentes, que servem ao Estado brasileiro, e não ao governo
A presença do presidente Jair Bolsonaro na manifestação em
frente ao Quartel General do Exército contra o Congresso e o Supremo
Tribunal Federal (STF), na tarde deste domingo, provocou um "enorme
desconforto" na cúpula militar. Ao Estado, oficiais-generais destacaram
que não se cansam de repetir que as Forças Armadas são instituições
permanentes, que servem ao Estado Brasileiro e não ao governo.
Na avaliação dos generais ouvidos pelo Estado, o protesto que chegou a
pedir intervenção militar não poderia ter ocorrido em lugar pior. “Se a
manifestação tivesse sido na Esplanada, na Praça dos Três Poderes ou em
qualquer outro lugar seria mais do mesmo”, observou um deles. “Mas em
frente ao QG, no dia do Exército, tem uma simbologia dupla muito forte.
Não foi bom porque as Forças Armadas estão cuidando apenas das suas
missões constitucionais, sem interferir em questões políticas.”
Eles observaram que a presença de Bolsonaro em frente ao QG teve outra
gravidade simbólica. Pela Constituição, o presidente da República é
também o comandante em chefe das Forças Armadas. Mesmo com cuidados para
evitar críticas diretas, os generais ressaltaram que o gesto foi uma
“provocação”, “desnecessária” e “fora de hora”.
À reportagem, os generais não esconderam o mal-estar. Afinal, Bolsonaro
os deixou em “saia justa”. Chefes militares não podem se pronunciar. O
Estado ouviu sete oficiais-generais, sendo cinco do Exército, um da
Aeronáutica e um da Marinha. Eles lembraram que o País tem uma
“verdadeira guerra” a ser vencida e que não é possível gastar energia
com alvos diferentes. Houve quem observasse que o presidente enfrenta
“resistências”, inclusive do Congresso, mas todos avaliam que a presença
dele na manifestação provocou ainda mais a ira dos representantes do
Executivo e do Judiciário. [em que pese a proibição de pronunciamentos dos chefes militares, a matéria deixa a impressão de que sete chefes militares resolveram contrariar uma proibição - estranho, muito estranho;
a matéria deixa a impressão de que os sete chefes militares foram contrários à presença do Presidente - mas, o último parágrafo reduz este número para quatro, reduzindo o placar contra a presença do presidente para 4x3, deixando o espaço para qualquer interpretação equivocada de um dos militares, torne Bolsonaro vencedor por 4 a 3.
Oportuno lembrar, que ontem foi aniversário do Exército Brasileiro e o presidente Bolsonaro, na condição de comandante supremo das Forças Armadas, foi ao Forte Apache saudar o aniversariante.
Quando chegou no QG a manifestação já estava ocorrendo e o presidente optou por saudar os manifestantes, mas nada disse contra o isolamento social, que fez questão de respeitar.]
Por conta da presença do presidente na manifestação, houve necessidade
de reforço da guarda do QG. Isso acabou passando uma imagem que também
foi considerada ruim pelos generais. Os soldados deslocados para a
guarda estavam de plantão e tiveram de sair às pressas para o local da
manifestação e, de certa maneira, proteger Bolsonaro da multidão. No momento, os militares da ativa do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica, sob a batuta do Ministério da Defesa, tentam focar seus
trabalhos no combate à pandemia do novo coronavírus, sem emitir qualquer
posicionamento político sobre as polêmicas.
A atitude do presidente, ainda segundo a análise de um dos militares,
passa um sinal trocado para a sociedade. As avaliações tiveram uma dose
de desabafo por parte dos generais. Eles ressaltaram passam o tempo todo
tentando separar o governo do Exército, já que há sempre quem lembre da
presença de militares em cargos de ministro no Palácio do Planalto. Um general contemporizou lembrando que “não é a primeira vez” que
acontece uma manifestação em frente a um quartel. Outro emendou que “as
manifestações pacíficas e ordeiras são expressões legítimas da
democracia”. Um terceiro lembrou que podem pegar as gravações que não
vão ver o presidente atacando ninguém, mas falando de liberdade e de
emprego. O clima, porém, era de desconforto.
Tânia Monteiro, jornalista - Folha de S. Paulo