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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Nunca houve na história brasileira tantos presos por razões políticas

Não existem crimes coletivos; a acusação de cada delito dos mais de 900 detidos em Brasília tem, obrigatoriamente, de ser individualizada

O que está acontecendo com as mais de 900 pessoas presas em Brasília, acusadas ou suspeitas de participar da depredação dos edifícios-sede dos Três Poderes no dia 8 janeiro, é uma desgraça para o Brasil.  
Como pode haver democracia, mesmo em sua definição mínima, num país com prisões em massa, cárceres políticos e centenas de pessoas presas sem que haja acusação individual contra elas? Nunca houve na história brasileira, mesmo em seus piores momentos de treva, tantos presos por razões políticas – não ao mesmo tempo, e nem por tanto tempo.
 
O mais sinistro nos acontecimentos de hoje é que a repressão é executada em defesa do “regime democrático de Direito”. 
 Para salvar a democracia, alegam os carcereiros, é preciso passar por cima da lei e não existe democracia se não há absoluto respeito à lei por parte da autoridade que tem o poder de investigar, prender e punir os cidadãos.

Grupos de extremistas invadiu as sedes dos Três Poderes
Grupos de extremistas invadiu as sedes dos Três Poderes Foto: Wilton Junior/Estadão

É chocante que não uma meia dúzia, mas centenas de homens e mulheres estejam presos há mais de 40 dias sem que a polícia e o aparelho judiciário tenham sido capazes, até agora, de dizer o que eles fizeram. Não existem crimes coletivos; a acusação de cada delito tem, obrigatoriamente, de ser individualizada, e essa exigência elementar da legislação penal brasileira está sendo ignorada pela autoridade pública.

Há, no ataque aos prédios das instituições, criminosos já identificados e com participação comprovada nos atos de vandalismo – inclusive através de imagens. Mas há centenas de pessoas que não quebraram nada, nem desrespeitaram lei nenhuma.

Muitos nem estavam na cena do crime; foram presos em frente a quartéis do Exército em Brasília, onde faziam manifestações pacíficas e legais. Outros entraram só para espiar, em lugares que estavam com as portas abertas. Estão sendo punidos como aqueles que efetivamente praticaram crimes; seu crime é estar em local próximo ao crime. O fato é que a justiça não sabe se os 900 presos cometeram ou não infrações ao Código Penal. Enquanto tenta descobrir, fica todo mundo no xadrez.

As organizações de defesa dos direitos humanos e do direito de defesa, a Ordem dos Advogados e os que se consideram heróis por terem assinado manifestos em favor da democracia estão em silêncio absoluto diante de tudo isso. É a nova ordem do Brasil. 
Não há nenhum corrupto na cadeia – nem o ex-governador Sérgio Cabral, condenado a 400 anos de prisão por roubo de dinheiro público no Rio de Janeiro. 
Um assassino preso em flagrante é libertado em menos tempo que os acusados de terrorismo em Brasília. [lembrando que a tipificação do crime de terrorismo não alcança os delitos dos quais os que estão presos são suspeitos.]

Mas não existem direitos para os que estão do lado errado da ideologia que comanda atualmente o aparelho judicial brasileiro.

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo


segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Graças à política petista, os pobres estão ainda mais pobres após o populismo socialista ter sido implementado

Comandante máximo

Fidel Castro, ditador perpétuo dos cubanos, deve ter ficado louco de inveja dos promotores do Ministério Público Federal. Como podem eles ter tido a ousadia de lhe roubar o nome que tanto preza? Diria ele: comandante máximo não pode ter outro igual a mim! Posso ser amicíssimo de Lula, porém tudo tem limites!

Para Lula, parece que não. Não contente de ter sido eleito e reeleito presidente, acreditou seu poder ter sido ungido por algum tipo de beneplácito absoluto, que lhe autorizava tudo fazer. Regras, leis e instituições deveriam estar simplesmente a seu serviço.
Intitulou-se um redentor dos pobres. Até esboçou a origem de um novo calendário, uma espécie de ano zero da história nacional, que deveria começar a ser contada de outra maneira. Seu adágio foi: “Nunca dantes em nosso país!”.

E assim foi. O Estado tornou-se um mero instrumento de sua política, com o seu partido introduzindo-se em todos os poros de sua máquina. Nada deveria ficar imune à sua influência, nenhuma instância deveria ficar a salvo desta sua nova crença. O que para uns seria crime, para ele tornou-se uma mera forma de exercício do poder.  Desobedecer às leis tornou-se um jogo semântico, como se palavras não pudessem mais expressar o certo e o errado, o justo e o injusto, o bom e o mau. A partir desse novo momento inaugural da história deste país, a linguagem política e por via de consequência a moral e a jurídica deveriam ser incorporadas a uma nova metalinguagem, a petista. Novos significados seriam atribuídos a nosso linguajar corrente. 

Note-se que as defesas de Lula e da ex-presidente Dilma, assim como, de resto, o PT e os seus movimentos sociais, atribuem a conceitos como “prova”, “democracia” e “golpe” outros significados, para eles, evidentemente, os únicos verdadeiros. Todos os que discordem desta sua nova atribuição de significado são imediatamente rotulados de “conservadores”, “representantes da direita”, “golpistas”, heréticos, em suma.  Para os detentores desta ideologia, não há “provas”, isto é, qualquer prova produzida contra eles não possui esse significado. É uma mera falsificação de “golpistas” e “reacionários”, a saber, os jornais, a mídia, o Ministério Público, o Judiciário e assim por diante. Ou seja, todos os que defendem o estado democrático de direito! 

Dilma foi afastada da Presidência da República em ausência completa de “provas”. Lula está sendo denunciado, com falta de “provas”. Apesar de nada ter sido provado contra eles, os tesoureiros do PT e líderes do partido estão presos. Outros foram condenados também sem provas. Nada para eles é probatório, pois, por definição, nada poderia atingi-los. Estariam imunes à lei, que a eles não se aplicaria. Golpe, aliás, para quem? Só se for para intelectuais e artistas que vivem nos desvarios ideológicos e que se acostumaram à subserviência de guardiães do novo linguajar. Tornaram-se servos deste novo poder, traindo a razão que deveriam representar. Só se for para incautos e militantes que, desbussolados, procuram um repouso dogmático para se eximirem da tarefa de pensar. 

Enchem a boca para falar de democracia, quando nada mais fizeram do que a sua instrumentalização, com o intuito de dar uma vestimenta politicamente correta aos crimes cometidos. As instituições democráticas foram sendo enfraquecidas enquanto se diziam os seus defensores. Seguiram, de outra maneira, a máxima bolivariana de subverter a democracia por meios democráticos. Estão, agora, indignados pelo fato de o seu estratagema ter sido descoberto. 

Peguem a Petrobras. Um dos maiores patrimônios brasileiros foi literalmente saqueado. Tornou-se a fonte de um imenso propinoduto, que envolvia empreiteiros inescrupulosos, funcionários ávidos de enriquecimento e todo um sistema criminoso voltado para preservar o poder petista. E, no entanto, na curiosa linguagem partidária, eles estão atualmente a defendendo contra a privatização! Ocultam o fato real: ela foi privatizada partidariamente!

Lula e os petistas não são muito originais. Adotaram o critério da discriminação da política entre amigos e inimigos, tão teorizado por um intelectual nazista, Carl Schmitt. Em sua versão tupiniquim, adotou a versão do “nós” contra “eles”.  O “nós” expressaria os representantes da verdade que salvariam os pobres, mostrando-lhes o seu verdadeiro caminho, conforme o qual os crimes seriam meros instrumentos redentores, um detalhe menor e insignificante. 

O “eles”, por sua vez, designaria todos os que se opõem a essa tarefa religiosa de transformação social, ocupando-se de detalhes sem nenhum valor como crime, responsabilidade e estado de direito. Ficariam presos a minúcias conservadoras e reacionárias. Em seu discurso desta última quinta-feira, Lula mostrou-se, novamente, um excelente ator, sabendo muito bem representar o seu personagem de “líder máximo”, embora em sua versão de vítima. Em todo momento, eximiu-se de qualquer responsabilidade, não tendo cometido crime algum. 

Se algo está sendo feito contra ele, é porque, no ano zero da história brasileira, empreendeu a redenção dos pobres, que estaria sendo, agora, desmantelada. Lula pretende se colocar de vítima, quando, na verdade, esta posição é de toda a sociedade brasileira. A vítima mudou de nome. Graças à política petista, aliás, os pobres estão ainda mais pobres após o populismo socialista ter sido implementado. O desemprego alcança aproximadamente 12 milhões de pessoas, ou seja, atingindo em torno de, no mínimo, 44 milhões de indivíduos, considerando quatro pessoas por família. O número pode ser maior. O céu foi prometido, porém o que se abriu foi o caminho do inferno. 

Triste destino do PT. Escolheu, ademais, atrelar o seu futuro ao “comandante máximo”, a essa estrela cadente, assumindo toda a sua defesa e apegando-se a esta pantomima. Se assim continuar, sucumbirá com ele. Talvez não lhe reste outro caminho. 

Fonte: Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul