O ex-ministro Delfim Netto, em entrevista
ao ‘Valor’, prenuncia uma
‘tragédia’ se Dilma não assumir suas responsabilidades e encaminhar propostas
de reformas
Mantidos
os juros em 14,25%, como desejavam Planalto e PT, as projeções semanais dos
departamentos de análise do mercado financeiro, coletadas pelo próprio BC e
divulgadas no Relatório Focus, sinalizaram piora nas estimativas da inflação
deste ano (de 7% para 7,23%, distanciando-se
mais ainda dos 6,5% do teto da meta de 4,5%) e a mesma recessão
projetada uma semana antes (3% em vez de 2,99%).
O governo
anunciará medidas, já com a assinatura do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, para resgatar o país da indigesta
mistura, em doses elevadas, de recessão e inflação. Sabe-se que vem por aí
mais oferta de crédito — quando ninguém quer se
endividar, por não confiar num governo que
não enfrenta a crise fiscal com as devidas reformas estruturais.
Como é
necessário.
Em
entrevista ao jornal “Valor”, o
ex-ministro Delfim Netto, de trânsito em hostes lulopetistas, adotou o
estilo “papo reto”. Segundo ele, se Dilma não assumir suas
responsabilidades e, na reabertura do Congresso, dia 2, não for aos
parlamentares com propostas de reformas constitucionais e infraconstitucionais,
será “uma tragédia”. Ou seja,
mais três anos de recessão e, depois, um longo período de baixo crescimento.
Delfim
aponta três reformas: da legislação trabalhista, da Previdência e para
desindexar e desvincular gastos do Orçamento. O assunto consta do
documento do PMDB “Uma ponte para o futuro”, já
bombardeado por Dilma e PT. Pior para o governo e o país. Delfim se junta a
incontáveis analistas que alertam para a ineficácia de se aumentar o volume de
crédito, porque “há falta de tomador de crédito", reforça o
ex-ministro.
Mas Dilma, fiel a seu estilo, deverá
apostar até as últimas fichas na mágica de recolocar a economia em movimento
sem fazer o devido ajuste fiscal. Admita-se que é
quase nulo o espaço político para que ela proponha as reformas e as mudanças
necessárias. No seu partido e fora dele. Mas precisaria fazê-lo.
Em vez
disso, Dilma relançará amanhã o Conselhão (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social), criado por Lula em 2003, sob inspiração do assembleísmo do
movimento sindical. Parecia um caminho para contornar o Congresso:
decidir tudo entre corporações e apresentar o pacote pronto aos parlamentares.
Se não funcionou na Constituinte, quando uma comissão presidida pelo inatacável
Afonso Arinos redigiu um projeto afinal desconsiderado, não funcionaria com PT,
CUT, Fiesp etc.
Relançar
o Conselho de Desenvolvimento com famosos das artes cênicas e celebridades do
mundo empresarial é procurar entreter a plateia. Dilma tem suas convicções
(equivocadas) arraigadas, e o Conselho servirá de mero adereço de mão para seu
governo simular um debate corporativo inútil. O Conselhão cumpre a função
daquela comissão criada para nada decidir. Enquanto isso, a crise avança. [O Conselhão está desfalcado de alguns dos membros da época
de sua criação - quatro por se encontrarem recolhidos ao presídio.]
Fonte: Editorial - O Globo