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sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Dólar é só sintoma

O real foi a moeda que mais perdeu valor nos dez primeiros dias de fevereiro. O seguro cobrado de quem quer se proteger contra o risco brasileiro subiu 16% só este ano. Isso é um sintoma do aumento da insegurança em relação aos rumos da economia brasileira e tem como pior efeito mais impacto na inflação. Os sinais que o Brasil têm dado não são tranquilizadores.

No mundo, a economia americana está forte, o que pode antecipar a alta de juros por lá, atraindo capitais do mundo inteiro. O efeito disso é a valorização global do dólar. Ele subiu, mas nada parecido com o que aconteceu no Brasil. A lira turca, por exemplo, que foi a segunda moeda que mais perdeu valor, desvalorizou-se em 4,85% em relação à moeda americana, do dia 28 de janeiro ao dia 11 de fevereiro. O real perdeu 10%. Outras moedas, como o peso mexicano, dólar australiano, rupia indiana perderam em torno de 2%. Há também temores de saída da Grécia da zona do euro. Mas o Brasil sente mais impacto, porque está mais vulnerável em seus fundamentos econômicos.

Aqui dentro, o Banco Central reduziu o volume de vendas diárias de dólar através das operações de proteção contra a desvalorização, os chamados swaps cambiais. Eram US$ 200 milhões por dia, passaram a ser US$ 100 milhões. Mas, segundo especialistas, não é isso também que explica a forte alta do dólar. Apesar de ter ficado claro que essa tática usada pelo BC para evitar a desvalorização não pode ser usada indefinidamente.— O  Banco Central hoje tem cerca de US$ 115 bilhões de contratos abertos de swap cambial, o que representa um risco fiscal para 2015. No ano passado, o BC teve perdas de R$ 17 bilhões com essa estratégia, o que elevou a dívida bruta, porque o Tesouro teve que emitir títulos em reais para pagar a diferença desses contratos — explica o economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria.

A política de oferecer contratos futuros que cubram a variação do dólar é uma forma de amortecer a volatilidade excessiva em momentos de incerteza. O problema é que passou a ser uma rotina e isso acaba criando distorções na economia. — A taxa de câmbio reflete os problemas internos da economia brasileira. Houve o rebaixamento de rating da Petrobras, a troca de presidente da empresa, a divulgação dos números fiscais de 2014 piores do que o previsto, a queda da avaliação da presidente Dilma nas pesquisas de opinião. O risco de recessão é cada vez maior, e o de racionamento de água e energia, também. A inflação está projetada para fechar o ano acima do teto da meta. É uma combinação de fatores — diz o economista.

Normalmente, o raciocínio é o de que o lado bom da desvalorização é o aumento da exportação. Mas isso nunca acontece em um primeiro momento. As empresas ou esperam o dólar subir mais para fechar contratos ou são cobradas pelos clientes para darem desconto nos produtos que exportam. Por outro lado, grandes empresas têm dívidas em dólar, o que aumenta seu passivo. Parte das matérias-primas são importadas e há aumento de custos. 

Não se deve manter o câmbio com medidas artificiais, mas é preciso estar atento aos efeitos negativos da disparada do dólar. O Brasil tem um déficit em transações correntes de 4% do PIB, e isso é em parte causada pelo longo período de valorização do real, que estimulou as importações e as viagens de brasileiros ao exterior.

Um rombo externo desse tamanho fica mais difícil de financiar quando há também um forte déficit nas contas públicas. Um problema se alia ao outro para causar mais distúrbios, fenômeno que é chamado de “déficits gêmeos”. O déficit externo desvaloriza o real e pressiona a inflação. Isso força o Banco Central a aumentar as taxas de juros, encarecendo o financiamento do déficit nominal.

Por isso, quem tem rombo nas contas públicas e nas contas externas é olhado com desconfiança. O Brasil sofre ainda abalos na sua maior empresa com repercussões em toda a economia. No Congresso, a presidente Dilma Rousseff se enfraquece até diante dos parlamentares do seu próprio partido e isso coloca em risco o ajuste fiscal proposto pelo ministro Joaquim Levy. O dólar alto é só o sintoma. É preciso fortalecer as defesas do paciente.

Fonte: Blog da Miriam Leitão