O real foi a moeda que mais perdeu valor nos dez primeiros dias de
fevereiro. O seguro cobrado de quem quer se proteger contra o risco
brasileiro subiu 16% só este ano. Isso é um sintoma do aumento da
insegurança em relação aos rumos da economia brasileira e tem como pior
efeito mais impacto na inflação. Os sinais que o Brasil têm dado não são
tranquilizadores.
No mundo, a economia americana está forte, o
que pode antecipar a alta de juros por lá, atraindo capitais do mundo
inteiro. O efeito disso é a valorização global do dólar. Ele subiu, mas
nada parecido com o que aconteceu no Brasil. A lira turca, por exemplo,
que foi a segunda moeda que mais perdeu valor, desvalorizou-se em 4,85%
em relação à moeda americana, do dia 28 de janeiro ao dia 11 de
fevereiro. O real perdeu 10%. Outras moedas, como o peso mexicano, dólar
australiano, rupia indiana perderam em torno de 2%. Há também temores
de saída da Grécia da zona do euro. Mas o Brasil sente mais impacto,
porque está mais vulnerável em seus fundamentos econômicos.
Aqui
dentro, o Banco Central reduziu o volume de vendas diárias de dólar
através das operações de proteção contra a desvalorização, os chamados
swaps cambiais. Eram US$ 200 milhões por dia, passaram a ser US$ 100
milhões. Mas, segundo especialistas, não é isso também que explica a
forte alta do dólar. Apesar de ter ficado claro que essa tática usada
pelo BC para evitar a desvalorização não pode ser usada indefinidamente.—
O Banco Central hoje tem cerca de US$ 115 bilhões de contratos abertos
de swap cambial, o que representa um risco fiscal para 2015. No ano
passado, o BC teve perdas de R$ 17 bilhões com essa estratégia, o que
elevou a dívida bruta, porque o Tesouro teve que emitir títulos em reais
para pagar a diferença desses contratos — explica o economista Silvio
Campos Neto, da Tendências Consultoria.
A política de oferecer
contratos futuros que cubram a variação do dólar é uma forma de
amortecer a volatilidade excessiva em momentos de incerteza. O problema é
que passou a ser uma rotina e isso acaba criando distorções na
economia. — A taxa de câmbio reflete os problemas internos da
economia brasileira. Houve o rebaixamento de rating da Petrobras, a
troca de presidente da empresa, a divulgação dos números fiscais de 2014
piores do que o previsto, a queda da avaliação da presidente Dilma nas
pesquisas de opinião. O risco de recessão é cada vez maior, e o de
racionamento de água e energia, também. A inflação está projetada para
fechar o ano acima do teto da meta. É uma combinação de fatores — diz o
economista.
Normalmente, o raciocínio é o de que o lado bom da
desvalorização é o aumento da exportação. Mas isso nunca acontece em um
primeiro momento. As empresas ou esperam o dólar subir mais para fechar
contratos ou são cobradas pelos clientes para darem desconto nos
produtos que exportam. Por outro lado, grandes empresas têm dívidas em
dólar, o que aumenta seu passivo. Parte das matérias-primas são
importadas e há aumento de custos.
Não se deve manter o câmbio
com medidas artificiais, mas é preciso estar atento aos efeitos
negativos da disparada do dólar. O Brasil tem um déficit em transações
correntes de 4% do PIB, e isso é em parte causada pelo longo período de
valorização do real, que estimulou as importações e as viagens de
brasileiros ao exterior.
Um rombo externo desse tamanho fica mais
difícil de financiar quando há também um forte déficit nas contas
públicas. Um problema se alia ao outro para causar mais distúrbios,
fenômeno que é chamado de “déficits gêmeos”. O déficit externo
desvaloriza o real e pressiona a inflação. Isso força o Banco Central a
aumentar as taxas de juros, encarecendo o financiamento do déficit
nominal.
Por isso, quem tem rombo nas contas públicas e nas contas
externas é olhado com desconfiança. O Brasil sofre ainda abalos na sua
maior empresa com repercussões em toda a economia. No Congresso, a
presidente Dilma Rousseff se enfraquece até diante dos parlamentares do
seu próprio partido e isso coloca em risco o ajuste fiscal proposto pelo
ministro Joaquim Levy. O dólar alto é só o sintoma. É preciso
fortalecer as defesas do paciente.
Fonte: Blog da Miriam Leitão
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