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domingo, 10 de junho de 2018

26 de junho de 1968: A alvorada da treva



A Passeata dos Cem Mil ficou como boa lembrança, mas não impediu a longa noite da ditadura escancarada 

Daqui a duas semanas serão lembrados os 50 anos da "Passeata dos Cem Mil", a bonita jornada durante a qual o Centro do Rio foi tomado por milhares de pessoas que defendiam as liberdades públicas. No chão, marchava-se ao lado de intelectuais e artistas. Do alto dos edifícios choviam papéis picados. Será um momento de doce nostalgia para os septuagenários que viveram aquela tarde.  Numa época em que a democracia brasileira vive a tensão dos radicalismos do século XXI, convém que se revisite aquele dia, embebido nos radicalismos da ditadura. A passeata tomou conta da história de 1968, mas ela foi um crepúsculo. A treva amanhecera horas antes, durante a madrugada, quando um caminhão com 50 quilos de dinamite explodiu diante do portão do QG do II Exército, matando o soldado Mário Kozel Filho e ferindo cinco outros militares.

O atentado foi obra da Vanguarda Popular Revolucionária e nele estiveram dez terroristas. Dias antes, a VPR havia roubado fuzis num hospital militar e o general que comandava a tropa do Exército em São Paulo lançara um desafio infantil: “Atacaram um hospital, que venham atacar meu quartel". Vieram. O motorista do caminhão saltou, o veículo bateu num muro, Kozel foi ver se haviaalguém na boleia e a dinamite explodiu.
Oito horas depois, no Rio, a passeata saiu da Cinelândia e percorreu a Avenida Rio Branco. No dia seguinte, todos os grandes jornais noticiaram com destaque os dois fatos. Aos poucos, porém, a lembrança do atentado evaporou, abafada pelo romantismo da manifestação do Rio e pelo silêncio que protege o radicalismo esquerdista da época.
Na passeata, enquanto uma parte dos manifestantes dizia que "o povo unido jamais será vencido", outra, menor, proclamava que "o povo armado jamais será vencido". Seis meses depois, o presidente Costa e Silva baixou o Ato Institucional nº 5, e começou a longa noite da ditadura escancarada.

Passados 50 anos, é mais agradável lembrar a passeata do que o atentado. Nas palavras da militante que estava num carro de apoio, a bombanão serviu para nada, a não ser para matar o rapazinho". O atentado serviu para estimular radicalismos, influenciando a vida do país, enquanto a passeata ficou como uma boa lembrança, nada além disso. Nada a ver com os comícios de 1984 pedindo eleições diretas. Elas não vieram, mas o povo unido levou o colégio eleitoral a eleger indiretamente o oposicionista Tancredo Neves.
O atentado e a facilidade com que se assaltavam bancos no final da década de 60 deram aos grupos radicais de esquerda uma enganosa sensação de invulnerabilidade. Quatro meses depois, dois dos terroristas que estiveram no ataque ao QG participaram do assassinato de um capitão americano que vivia em São Paulo.

A ditadura respondeu ao surto radical com torturas e mortes. Dos treze militantes que participaram dos ataques ao hospital militar e ao QG, dois foram executados, sete foram presos e três deixaram o país. Só um ficou livre no Brasil, com outro nome. [o justo teria sido os treze bandidos, terroristas imundos, hienas e chacais, terem sido executados - no mínimo teria se evitado um mal maior a afligir o Brasil anos depois.]  A VPR e suas congêneres nunca defenderam a ordem democrática. Já os ministros que participaram da reunião do Conselho de Segurança Nacional que baixou o AI-5 exaltaram a democracia em dezenove ocasiões. Ao final, fecharam o Congresso e suspenderam o habeas corpus. [medidas necessárias e que se revelaram eficazes.] 
 
Cármen fechou a roleta do STF
Advogados espertos criaram um sistema de roleta para conseguir habeas corpus no Supremo Tribunal. Quando veem negada sua petição por um ministro, começam tudo de novo, esperando contornar o ministro que os desatendeu. Confiam no sorteio, até que o caso caia nas mãos de um voto amigo.

Em outubro do ano passado, um pedido foi para o ministro Luís Roberto Barroso e ele negou o habeas. Com a mesma documentação, pediram de novo em novembro e o caso foi para o ministro Dias Toffoli. Nova negativa e nova tentativa. Por sorteio, o pedido voltou a Barroso e ele voltou a negar o habeas. Tentaram de novo em fevereiro deste ano. Na mão do ministro Edson Fachin, tiveram a quarta negativa. Em março, insistiram. Na quinta investida o caso caiu de novo na mesa de Toffoli e ele voltou a negar. Na sexta tentativa, sempre por sorteio, o processo voltou para Barroso. Falta de sorte.

Noutro caso, o habeas corpus foi negado pelo ministro Alexandre Moraes. Na segunda tentativa, o ministro Fachin também negou-o. Novo sorteio mandou o processo para a ministra Rosa Weber, terceira negativa. A cada pedido os advogados colocavam os ministros que os desatenderam como autoridades coatoras. Desse jeito, aumentavam suas chances de levar o processo a um ministro simpático. Num terceiro caso, a manobra gerou o circuito Luiz Fux-Alexandre Moraes-Celso de Mello, sempre com negativas.
A presidente Cármen Lúcia fechou a roleta e determinou que o primeiro caso deve ficar com Barroso, o segundo, com Rosa Weber e o terceiro, com Fux. Fez mais. Mostrou que o joguinho “configura abuso do direito e defesa" e mandou que as espertezas fossem comunicadas à Ordem dos Advogados do Brasil.


(...)

Excelsos viajantes
Os onze ministros do Pretório Excelso já tinham uma sala exclusiva no aeroporto de Brasília. Agora o Supremo Tribunal Federal tem outra área especial, que custará à Viúva R$ 374 mil anuais, ervanário superior a um ano de salário do presidente da República.
Cada doutor dispõe de um servidor para puxar a cadeira quando senta ou levanta no plenário.

Ócio
Nos quatro próximos domingos o signatário exercitará o ócio.