Tribunal vota na semana que vem questão de ordem que pede suspensão da denúncia até que se esclareçam os eventos escabrosos da delação da JBS
Não sei se o ministro Edson Fachin
abusa, às vezes, da própria ignorância ou da alheia. Talvez as duas
coisas. Por que afirmo isso? Vou explicar. Como se sabe, despedindo-se
do mundo dos vivos, Rodrigo Janot produziu a sua última quimera: a
segunda denúncia contra Michel Temer, na qual incluiu Joesley Batista e
Ricardo Saud, além de parte considerável da cúpula do PMDB. O presidente
da República é acusado de obstrução da investigação e de integrar
organização criminosa. Não! A estrovenga não seguirá imediatamente para a
Câmara porque, antes, o STF irá decidir se a porcariada produzida por
Janot será ou não suspensa. Na verdade, o STF vai dizer, por maioria, se
lhe resta um pouco ao menos de dignidade, de honra, de vergonha na
cara. Já volto ao ponto.
Espírito das Trevas hoje esmaga e rebaixa moralmente o Supremo. É preciso reagir
No meu blog e no programa “O É da
Coisa”, que vai ao ar nesta emissora, às 18h, faço uma leitura detida
das 245 páginas daquela aberração. Mas é possível sintetizá-la aqui de
forma eficiente. O quase ex-procurador sustenta, na prática, que o PMDB é
uma organização criminosa, da qual Temer passou a ser o chefe. Boa
parte dos eventos que ele considera pagamentos de propina se deu antes
de o peemedebista estar na Presidência. Nem poderiam estar listados na
denúncia, pois. O Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição impede que o
presidente seja investigado, no curso do mandato, por atos estranhos ao
exercício de sua função. Ainda que assim não fosse, Janot não apresenta
uma maldita prova ou evidência contra Temer. O que há de supostamente
contundente sai da boca de delatores premiados.
Como reza jurisprudência do STF, delação
não é prova, mas apenas um dos meios para a obtenção da dita-cuja. No
post em que destrincho aquele bicho exótico, jogo luzes no caso de
Furnas. Segundo o aloprado Janot, a prova de que o PMDB recebeu propina
por obras contratadas pela Estatal está no fato de que houve um aumento
de doações eleitorais de empreiteiras que trabalhavam para a empresa no
tempo em que ela esteve sob o comando de um indicado do partido. Mas
quem afirma que as doações eram propinas? Ora, os delatores! E o que
Temer tem a ver com isso? Ele era um dos chefe do PMDB. É tudo de uma
ruindade assombrosa.
Qual é o trâmite de uma denúncia dessa
natureza? Ela deve ser protocolada no Supremo, que a enviará à
Presidência da Câmara, que vai remetê-la à Comissão de Constituição e
Justiça da Casa. Pouco importa a decisão desse grupo, o texto vai a
plenário. São necessários 342 votos contra o presidente. Se houver, a
peça volta ao STF, e os ministros decidem se será ou não aberta a ação
penal.
Muito bem! Desta feita, há um empecilho.
O Supremo precisa julgar uma questão de ordem apresentada pela defesa
de Temer, que pede a suspensão do processo até que não se esclareçam as
coisas escabrosas que vieram a público sobre a delação dos diretores da
JBS. As evidências de que a delação passou por caminhos criminosos são
imensas. E muita coisa ainda vem por aí. O caso estava pautado para esta
quarta, mas a ministra Carmen Lúcia houve por bem transferir a decisão
para a semana que vem.
Fachin está espalhando por aí que ele
até poderia ter enviado a denúncia à Câmara, mas que decidiu esperar a
decisão do Supremo. É mesmo, é? Em primeiro lugar, quem envia a
dita-cuja à Presidência da Câmara é Carmen Lúcia, presidente do STF, não
Fachin. Em segundo, a questão de ordem já está pautada para a semana
que vem. Não depende da vontade do relator ela ter sequência ou não. Se a
maioria decidir suspender o trâmite dos delírios de Janot, suspenso
está.
Qual vai ser a decisão do Supremo?
Vamos ver. São tantos e de tal monta os descalabros nas delações da JBS, com benefícios ora revogados, que o tribunal não pode ignorar as escandalosas agressões à ordem legal. No centro da confusão está o ex-procurador Marcelo Miller, ex-braço direito de Janot. Já está mais do que evidenciado que ele participou, de forma ilegal, das tratativas pré-delação.
Vamos ver. São tantos e de tal monta os descalabros nas delações da JBS, com benefícios ora revogados, que o tribunal não pode ignorar as escandalosas agressões à ordem legal. No centro da confusão está o ex-procurador Marcelo Miller, ex-braço direito de Janot. Já está mais do que evidenciado que ele participou, de forma ilegal, das tratativas pré-delação.
Reitero: não sei o que vai fazer o
Supremo. Mas sei que suspender o trâmite dessa denúncia — que seria
rejeitada pelo plenário da Câmara — é uma vereda que se abre para o
Supremo resgatar parte de sua dignidade. O tribunal já evidenciou que
pretende preservar o MPF como instituição. Hoje, a melhor maneira de
fazê-lo e pondo o freio do bom senso em Janot. Sim, ele está para sair,
mas o tribunal, ainda assim, tem de evidenciar que não vai tolerar ações
ilegais sob o pretexto de combater a corrupção.
De resto, não há ministro naquela Corte
que não saiba que virão à luz gravações que contribuirão para, quando
menos, manchar a honra do tribunal. Aceitar a tramitação de uma nova
denúncia sem que esses fatos estejam devidamente esclarecidos
corresponde a abraçar o crime sob o pretexto de combatê-lo. A nova denúncia de Janot é uma das peças
mais patéticas produzidas pela PGR em sua história. Mas nem se cuida
agora de dar uma resposta a essa ruindade. Ainda que ela fosse o Moisés
das denúncias, não poderia ter curso até não se conheçam todos os
detalhes dos crimes cometidos no processo de delação dos diretores da
JBS, que resultaram na primeira investida de Janot contra Temer.
O STF vai dizer se lhe restou ou não um tanto de caráter, de responsabilidade e de respeito por sua própria história.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo
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