Se provar falha na fiscalização, trabalhador tem direito de responsabilizar governo
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de só responsabilizar a
União por empregados terceirizados se houver prova de que não houve
fiscalização tem potencial de acabar como uma grande pedra no sapato do
governo. A União enfrenta, na Justiça do Trabalho, uma série de ações
relacionadas à responsabilidade sobre os passivos trabalhistas das
empresas terceirizadas que contrata para prestar serviços à
administração pública. Segundo um levantamento do Tribunal Superior do
Trabalho (TST), entre 2012 e 2017 houve um salto desse tipo de ação no
acervo do tribunal. Em 2012, eram 1.337 casos. Em fevereiro de 2017,
eles somavam 13.052, um avanço de 876%.
TRABALHADOR PODE PERDER
Para o coordenador Nacional de Combate às Fraudes do Ministério Público do Trabalho (MPT), Paulo Joarez, o problema é que muitas das empresas contratadas pela União não são sólidas e bem estruturadas. Como o governo exige preços mais baixos do que os do mercado, elas começam a acumular um passivo grande, por horas extras e verbas indenizatórias, por exemplo. — Quando conseguem chegar ao final do contrato, essas empresas estão quebradas, porque a conta não fecha. O funcionário processa a empresa e, quando vai buscar o patrimônio, ele não existe — disse Joarez.
Nesses casos em que há incapacidade de pagamento, a União responde subsidiariamente pelo prejuízo desde 2001, com a edição de uma súmula que estabelecia essa obrigação. Com a decisão do STF, isso fica mais difícil. Se o trabalhador não provar que o governo federal falhou na fiscalização da empresa, não recebe. Segundo Joarez, na prática, provar a falha da União é impossível. No fim das contas, avalia, quem perde mais nessa queda de braço é o trabalhador, que pode ficar sem nada.
Guerreiro, da AGU, pondera que, diante dos vários casos de empresas que vão à falência e deixam o passivo para a União, o governo federal editou uma instrução normativa em 2008 que permite o bloqueio de recursos quando a terceirizada não realizar os pagamentos. Esse bloqueio garante a quitação das verbas principais: salários, férias, 13º salário e multa sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS): — Realmente, é difícil comprovar que a União não fiscalizou, porque não existe a possibilidade dela não fiscalizar por conta dessa instrução normativa. Hoje, já há uma garantia de pagamentos de verbas salariais. O que a gente não consegue é arcar com a verba indenizatória. As pessoas entram na Justiça, muitas vezes estimuladas pelos sindicatos, atrás dessa verba indenizatória.
A advogada trabalhista Fernanda Nasciutti pondera que a raiz do problema, a contratação de empresas sem solidez financeira, não deve mudar. Ela afirma que não há um estímulo a União, estados e municípios para que essa contratação seja mais rigorosa. Na avaliação da advogada, antes mesmo da decisão do Supremo, já era muito difícil comprovar o vínculo do terceirizado com o governo, o que levava esses processos a tramitarem por vários anos. Isso porque, explica a advogada, pela Constituição, só tem vínculo com o governo quem é concursado: — No ramo privado, empresas sérias têm preocupação em fazer uma fiscalização propriamente dita. A União não tem uma preocupação com isso. Como é difícil de comprovar o vínculo, o trabalhador fica prejudicado.
FUNDO PARA PAGAMENTOS
Para os especialistas, a solução passa por combater o problema na raiz para evitar que isso chegue ao Judiciário. Joarez explica que o governo — ou empresa privada que contratar uma terceirizada — deveria exigir, por exemplo, que a empresa faça um fundo para garantir os pagamentos.
Um projeto que tramita no Senado Federal e que muda as regras para a terceirização prevê que haja uma fiscalização, por meio de exigência mensal, pela contratante, da comprovação de cumprimento das obrigações trabalhistas, como pagamento de salário, benefícios e depósito do FGTS. No entanto, como já sancionou recentemente outra lei que regulamenta a terceirização, o governo não está disposto a levar à frente esse projeto. Um dos motivos é que ele altera vários dos pontos já “pacificados” com a lei sancionada e que reacenderiam a polêmica.
[ESCLARECIMENTO:
O Conselho Nacional de Justiça - CNJ, órgão auxiliar do Poder Judiciário mas que tem mais poder para legislar que o Poder Legislativo, baixou uma norma há uns 3 ou 4 anos criando uma conta vinculada que é abastecida com dinheiro descontado pelo Contratante da Fatura Mensal emitida pelo Contratada e que se destina a, no caso da contratada não ter condições de efetuar o pagamento das verbas trabalhistas , pagar todos os direitos trabalhistas do empregado.
A Conta Vinculada, mantida no Banco do Brasil só pode ser movimentada com autorização do órgão contratante.
Por ser uma norma criada pelo CNJ só é aplicável no âmbito do Poder Judiciário.
Mas, nada impede que o Poder Executivo edite norma para valer no âmbito do Executivo e o Legislativo edite norma para os órgãos da sua esfera do Legislativo.
O ideal mesmo seria que o Poder Legislativo, que é constitucionalmente o Poder responsável pela edição das leis, elaborasse lei específica abrangendo os três Poderes e alcançando tanto os órgãos federais, quanto os estaduais e municipais.
Mas, infelizmente, no Brasil o Poder que possui menos poder para legislar é exatamente o PODER LEGISLATIVO - não é a toa que o Brasil é mais conhecido como república da Banânia.
Para finalizar a Conta Vinculada criada pelo CNJ é na realidade um confisco, o Poder Público confisca da empresa privada recursos para compensar a sempre presente omissão do poder público. Mas, é aquele negócio, quem vai ter coragem de contestar uma decisão emanada do CNJ???]
Fonte: O Globo