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segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

O vício da liberdade - J. R. Guzzo

Revista Oeste

 Os ministros do Supremo estão convencidos de que a liberdade só pode ser usada pelos cidadãos se for concedida pelo STF


Foto: Shutterstock

O ministro Alexandre de Moraes e os seus colegas de Supremo Tribunal Federal, com o apoio encantado da maior parte da imprensa brasileira, estão metidos numa missão impossível.  
Querem eliminar, através de despachos do STF e da força armada do governo, o princípio segundo o qual a liberdade é uma conquista da civilização humana — como a álgebra, ou a palavra escrita, ou o direito à vida.  
Decretaram que a liberdade é algo que pertence com exclusividade ao Estado, como o direito único de imprimir moeda, por exemplo, ou de passar escrituras de compra e venda de imóveis. 
Mais precisamente, estão convencidos de que a liberdade só pode ser usada pelos cidadãos se for concedida pelo STF, sob a orientação técnica da faculdade particular de Direito do ministro Gilmar Mendes, o IDP de Brasília. 
Não é um direito que todo ser humano recebe ao nascer. 
Para os ministros, e os seus sócios no consórcio Lula-STF, a liberdade é um bem tão precioso que tem de ser rigorosamente racionado. 
É uma das ideias fixas do ministro Moraes, do presidente Barroso e, agora, do seu futuro colega Flávio Dino, para quem o conceito da liberdade de expressão, como ela tem sido entendida nos últimos 300 anos, “acabou no Brasil”.

A encíclica mais recente do ministro Moraes sobre a liberdade de imprensa é um fenômeno sobrenatural — só pode ser entendida como um ataque deliberado ao direito constitucional de livre manifestação, pois não faz nenhum nexo do ponto de vista lógico. 
A primeira reação foi dizer: “Isso é uma estupidez”. Será? 
Até o porteiro do Supremo sabe perfeitamente que não há ditadura com liberdade de imprensa — ou se acaba com a imprensa livre logo no primeiro dia, ou nem adianta pensar em ditadura. 
A verdade, pelo que mostra a observação racional dos fatos, é que o STF não tomou nos últimos cinco anos uma única decisão a favor da liberdade de expressão — nem uma que seja. 
Fez exatamente o contrário. Dia após dia, tenta socar alguma nova medida de repressão ao direito de palavra dos cidadãos. 
Não tem conseguido tudo o que quer, mas sempre age na mesma direção: “Vamos continuar metendo terror em cima de quem quer falar o que pensa. Cada vez a gente ganha um espaço a mais”.  
Se nenhuma ditadura funciona com liberdade de imprensa, e se tudo o que o STF decide na prática é contra a liberdade de imprensa, qual seria a dedução mais simples? Moraes e seus colegas estão abrindo o caminho para o quê — mais democracia ou mais “cala boca”, como disse a ministra Lúcia?
 
A ministra, na única manifestação de sua carreira jurídica que tem alguma chance de merecer registro, disse que a censura não pode jamais ser admitida — mas, para a eleição presidencial de 2022, ela iria abrir uma exceção “até a segunda-feira, dia 31 de outubro”
Passou a segunda, a terça e mais um ano, e até agora a censura está aí. Não do tamanho que o STF gostaria, é claro
Mas Alexandre de Moraes está cuidando de “empurrar a história para a frente”, coisa que não se faz num dia só — e veio com mais um decreto para avançar no plano geral de deixar os meios de comunicação calados. 
Sua ideia, como se sabe, é responsabilizar os órgãos de imprensa pelo que as pessoas dizem nas entrevistas. 
Ou seja, uma autoridade pública, por exemplo, chama alguém de “ladrão”; o veículo que publicou isso pode ser processado por calúnia, injúria ou difamação. 
É censura, e censura prévia, através da ameaça. 
O que o ministro quer é que o jornal, a revista ou a emissora não publiquem entrevistas incômodas
Poderiam ser punidos com multas de R$ 1 milhão por hora, ao estilo STF. Alguém se habilita?

Até uma criança de 10 anos de idade sabe como isso vai funcionar. Um entrevistado “de esquerda”, por exemplo, pode falar o que quiser e não vai acontecer absolutamente nada.  
Pode dizer que o ex-presidente Jair Bolsonaro é ladrão de joias, racista, pedófilo, homofóbico e genocida, sem provar coisa nenhuma — e o entrevistador estará mais seguro que um ministro do STF em seu carro blindado. 
E o contrário? O contrário vai ser o contrário
A nova doutrina Moraes, se o Brasil fosse um país sério, criaria problemas sem solução. O presidente Barroso, por exemplo, disse o seguinte numa entrevista ao Roda Viva, em junho de 2020: “Não acho que a Lava Jato foi a ‘criminalização da política’. O que houve na Petrobras foi crime mesmo”. 
Como fica, então? 
A TV Cultura não fez a checagem” das informações que o ministro Moraes passou a exigir dos entrevistadores. Na verdade, não fez o menor esforço para issoe nem poderia, humanamente, fazer nada, levando-se em conta que a entrevista foi ao vivo. 
Não houve, enfim, o “dever de cuidado” — obrigação que não existe em lei nenhuma, mas que o STF dá a impressão de ter criado.

Os ministros do STF contam, em seu esforço para estatizar a liberdade, com o apoio intransigente da maioria da mídia — jornalistas e donos de veículos que não têm competência, nem energia, nem interesse em decidir o que vai ser publicado nas suas páginas e nas suas transmissões

A emissora, nesse caso, poderia ser condenada por ter colocado no ar a afirmação de que a Petrobras dos governos Lula-Dilma cometeu “crime”? E se não puder “provar” as acusações feitas por Barroso? Como o próprio ministro Moraes criou o “flagrante perpétuo”, a entrevista de 2020 pode complicar a vida da Cultura em 2023. 
O que Alexandre de Moraes sugere, então, que a emissora (ou o próprio Barroso) faça? 
Não tem pé nem cabeça — mas o Brasil do STF não é um país sério, e as coisas não precisam ter pé e cabeça. 
Na verdade, é cada vez mais inútil solicitar que os ministros tomem decisões com nexo, ou relacionadas de alguma forma com o que está na lei. Moraes não vai fazer ou deixar de fazer nada por motivos de lógica; ele tem propósitos, e, se a lógica estiver atrapalhando, pior para a lógica. Também não tem nenhum interesse em debates jurídicos sobre o espírito da lei. É legal? É ilegal? Tanto faz — não vamos, agora, ficar perdendo tempo com essas miudezas quando o Brasil precisa ser salvo para a democracia. 
Naturalmente, a democracia é o que Moraes, Barroso, Gilmar Mendes e Flávio Dino decidem que ela é. O resto é “bolsonarismo”.

O STF não está interessado em lei nenhuma. Está interessado, nesse caso das entrevistas, em fazer censura; no resto, o que quer mesmo é impor ao Brasil um novo regime em parceria com Lula, o Alto Comando do Exército e a tropa de gatos gordos que se pendura no Tesouro Nacional
É um consórcio para governar o país sem necessidade de Congresso (“pigmeus morais”, segundo Gilmar), sem eleições (só com o TSE) e sobretudo sem o povo brasileiro, com os seus 60 milhões de “fascistas” que tanto perturbam o presidente Barroso em sua encarnação atual
É isso: nenhuma outra opção é válida. Não importa, assim, se o novo decreto do ministro Moraes vai “pegar” ou não; ele vai tentar de novo, e de novo, e sempre. 
Tudo o que decidem é na mesma direção; porque iriam mudar, em matéria de censura ou de qualquer outro assunto? Seu único objetivo para valer é um Brasil com liberdade estritamente controlada, como se faz na aplicação de cortisona na veia — é o STF e mais ninguém que decide a dose correta. 
Moraes já chamou a prisão de um dos indiciados em seu inquérito de “flexibilização do direito de ir e vir”. O que estão fazendo agora é a flexibilização da liberdade de imprensa.
 
A máquina do governo Lula, naturalmente, foi posta a serviço de Alexandre de Moraes e do STF na repressão ao direito de livre expressão. 
Seu mais recente ato foi assinar um acordo com o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações para “agilizar a remoção de fake news do ar”. Agora, em vez de serem enviadas por oficiais de Justiça, as determinações de retirada do ar de sites acusados de disseminar de informações prejudiciais ao processo eleitoral será feita eletronicamente. O objetivo, segundo o presidente da Anatel, é “proteger o eleitor e as eleições”.
 
Os ministros do STF contam, em seu esforço para estatizar a liberdade, com o apoio intransigente da maioria da mídia — jornalistas e donos de veículos que não têm competência, nem energia, nem interesse em decidir o que vai ser publicado nas suas páginas e nas suas transmissões. 
Trata-se, tanto quanto parece, de um fenômeno inédito desde a invenção da máquina de imprimir, quase 600 anos atrás: pela primeira vez, o principal inimigo da liberdade de imprensa não é a polícia — e sim os próprios jornalistas. Não é, nem de longe, coisa só do Brasil. Como em quase tudo, isso aqui é um dos últimos lugares aonde as novidades chegam: a rebelião contra a liberdade começou nos Estados Unidos, na Europa e no resto do mundo desenvolvido, e continua à toda por lá. Seja como for, o fato é que o comunicador brasileiro padrão, hoje em dia, é um dos grandes defensores da censura — que chamam de “controle social dos meios de comunicação”, como Lula e o STF. Seu sonho seria transformar toda a imprensa brasileira num veículo único, com notícias iguais e a mesma opinião, para sempre, numa espécie de grande Pravda tropical.
 
Lembra-se do “consórcio” para a publicação de notícias sobre o número de mortos da covid-19?  
Então: a covid-19 acabou, mas um noticiário fornecido exclusivamente por “fontes confiáveis” e submetido a uma posição comum para todo mundo, sem competição entre os veículos, é a situação que a maior parte dos jornalistas considera ideal. 
Acham que isso deve ser feito com um propósito nobre — evitar a publicação de “notícias falsas”, sem falar no combate ao “discurso do ódio”, aos “atos golpistas” e ao “bolsonarismo” em geral. O que querem mesmo é o pensamento único. 
Apurar com profissionalismo as informações, eliminar o que é falso e ficar com os fatos objetivos é o dever fundamental do jornalismo; quando abre mão dessa tarefa, e entrega a definição da verdade a comitês que não têm a capacidade, nem a intenção, de fazer isso, o jornalista está abandonando a sua profissão. 
Vira um agente de propaganda de quem manda na máquina estatal ou de facções ideológicas — da “inclusão”, da “igualdade”, da escolha de sexo para crianças de três anos de idade, do “Black Lives Matter”, da “crise do clima”, e por aí afora.

Um retrato em alta definição dessa maneira de se tratar a liberdade foi fornecido há pouco num seminário sobre a necessidade de estabelecer a lei e a ordem sobre as redes sociais. Um jornalista do New York Times, na sua palestra, disse que as grandes plataformas da internet viciam os leitores e, por causa disso, deveriam ser reguladas como “a indústria de cigarros”.  
No seu entender, os algoritmos utilizados pelas grandes empresas da área são destinados a fazer com que o usuário passe o máximo de tempo possível ligado na plataforma — onde estará condenado a receber, segundo ele, uma “visão de mundo deliberadamente distorcida”.  
O público não teria como se defender, porque a navegação na internet cria uma dependência física. “Sabemos por meio de estudos neurológicos que estar nas mídias sociais produz uma resposta química no corpo”, afirmou. Seria, de acordo com o jornalista, um “feedback háptico”, como nas máquinas caça-níqueis dos cassinos. Não se cogita, aí, que a suposta dependência da internet possa ser mais um hábito dos seres humanos dentro do avanço geral da civilização — as pessoas também são viciadas, ou dependentes, da luz elétrica, da água encanada e do telefone celular. 
O que se combate, no STF e entre os jornalistas, não são as enzimas e as reações hápticas. É o vício da liberdade. 

Leia também “Lula não está interessado em paz”ou dependentes, da luz elétrica, da água encanada e do telefone celular. O que se combate, no STF e entre os jornalistas, não são as enzimas e as reações hápticas. É o vício da liberdade. 

sábado, 23 de setembro de 2023

Ruralistas, evangélicos e bancada da bala se unem no Congresso para desafiar Supremo - O Estado de S. Paulo

 Vera Rosa

Clima de tensão entre Poderes preocupa Planalto, que tem projetos considerados prioritários para votar no Congresso, como o da reforma tributária

A ameaça da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) de enfrentar o Supremo Tribunal Federal (STF) e obstruir votações no Congresso enquanto o marco temporal das terras indígenas não for aprovado no Senado conta agora com o apoio das bancadas evangélica e da bala.  
A aliança entre as três frentes provoca tensão entre os Poderes e preocupa o Palácio do Planalto.
 
O movimento que conta com apoio da maioria dos partidos do Centrão e pode unir mais da metade do Congresso contra o Supremo foi iniciado nesta quinta-feira, 21, depois que a Corte considerou inconstitucional o marco temporal das terras indígenas. 
Mas as articulações políticas abrangem outras pautas que opõem conservadores ao STF, como a descriminalização do aborto e do porte de drogas.

Dirigentes da FPA e das frentes parlamentares evangélica e da segurança pública vão se reunir na próxima semana, em Brasília, para definir uma estratégia conjunta. A ideia é pressionar o Senado a aprovar o marco temporal das terras indígenas e dar um “ultimato” ao Supremo.

A união de deputados e senadores tem potencial para prejudicar votações de temas prioritários para o governo Lula. Na lista estão a reforma tributária, novas regras de cobrança de impostos para fundos exclusivos e offshores e até a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

“Nós vamos usar todos os instrumentos regimentais para obstruir as votações na Câmara e no Senado, com o objetivo de garantir o direito à propriedade”, disse o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA.
O coordenador da Frente Parlamentar Evangélica, Silas Câmara (Republicanos-AM), afirmou que o Congresso não pode ficar de braços cruzados diante do protagonismo observado do outro lado da Praça dos Três Poderes.

“O Supremo atropela o Poder Legislativo e tenta implantar uma ditadura da toga. Não podemos aceitar isso”, reagiu Câmara, numa referência ao voto da presidente do STF, Rosa Weber, favorável à descriminalização do aborto nas 12 primeiras semanas de gestação.

A ação que trata do aborto começou a ser analisada na Corte pelo sistema eletrônico de votação, mas o ministro Luís Roberto Barroso – que assumirá a presidência da Corte no próximo dia 28, com a aposentadoria de Weber – transferiu o julgamento para o plenário físico. Não foi fixado prazo para a retomada do tema.

O STF também interrompeu, no último dia 25, o julgamento que vai decidir se o porte de maconha para uso pessoal é crime e trata da fixação de critérios para diferenciar o traficante do usuário de droga. O ministro André Mendonça pediu vista do processo, o que significa mais tempo para análise.

Pressão
Diante de um cenário de confronto frequente com a Corte
, as bancadas do agro, da bala e evangélica decidiram iniciar o movimento de pressão pelo Senado. Motivo: é na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa que tramita o projeto de lei com a tese defendida pelo Centrão, segundo a qual a demarcação de territórios indígenas precisa respeitar a área ocupada até a Constituição de 1988.

O problema é que, caso seja aprovado na CCJ e passe pelo crivo do plenário do Senado, o projeto ainda terá de ser sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, [o presidente petista é fácil de ser enquadrado pelos parlamentares.] que é contra. 

Há também duas propostas de emenda à Constituição (PECs) no Congresso que preveem a demarcação das terras indígenas.

“As nossas frentes parlamentares, juntas, têm condição de aprovar o marco temporal no Senado e as emendas constitucionais que estão na Câmara”, destacou o deputado Alberto Fraga (PL-DF), que preside a frente conhecida como bancada da bala. “Eu sempre digo que é melhor ser da bala do que da mala”, ironizou ele.

Para Fraga, a Câmara e o Senado precisam “tomar providências” para conter o “ativismo judicial” dos magistrados. “O Supremo ultrapassou todos os limites e está usurpando as funções do Congresso”, declarou. “Vamos até as últimas consequências para vencer essa batalha”, insistiu Lupion.

A ideia é que outras bancadas também se juntem ao movimento, como a Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana, que se posiciona contra a descriminalização do aborto e reúne 193 deputados.

Na prática, muitos estão em mais de uma frente e, por isso, não é possível fazer uma conta exata do número de congressistas dispostos a enfrentar o Supremo: a FPA conta com 347 parlamentares; a bancada evangélica, com 236, e a de segurança pública, com 292.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse não ter recebido qualquer sinal de obstrução no Congresso. O Estadão apurou, no entanto, que o movimento das frentes fez acender o sinal amarelo no Planalto. Recentemente, Lula selou acordo com o Centrão, após a entrada na equipe dos ministros André Fufuca (Esporte), filiado ao PP, e Sílvio Costa Filho (Portos e Aeroportos), do Republicanos. Ao que tudo indica, porém, o primeiro racha já está no horizonte. “Temos a convicção de que o esforço que já existia no primeiro semestre para votar e aprovar a agenda prioritária do governo, a recuperação econômica do País e a recriação dos programas sociais não só vai continuar como se ampliar”, amenizou Padilha.

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo 

 


quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Julgamento do 8 de Janeiro é histórico e desafiador - Editorial - O Globo

A opinião do GLOBO - 12 setembro 2023

Começa amanhã no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento dos primeiros réus pelos ataques golpistas de 8 de janeiro contra o Palácio do Planalto, o Congresso e o próprio STF. Não se trata de um julgamento qualquer. 
O trabalho da Justiça faz parte da reação necessária das instituições na defesa do Estado de Direito contra a ação de forças antidemocráticas. 
O rigor das penas precisa refletir com fidelidade as provas colhidas, mas também a gravidade da ameaça que o país enfrentou.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) pede, nesta primeira fase, a condenação de quatro presos em Brasília, acusados dos seguintes crimes: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa armada, golpe de Estado e deterioração de patrimônio tombado. A PGR apresenta fartas provas para justificar as acusações, muitas produzidas pelos próprios réus — Aécio Lúcio Costa Pereira, Thiago de Assis Mathar, Moacir José dos Santos e Matheus Lima de Carvalho — com seus telefones celulares.

Os quatro afirmam ter ido a Brasília para uma “marcha pacífica”. Mathar diz ter entrado no Palácio do Planalto só para se proteger do conflito violento nas imediações. Versões semelhantes deverão surgir no julgamento. A defesa também alega que não há provas capazes de vinculá-los a danos específicos, como janela quebrada, obra de arte vandalizada ou arrombamento (mas há inúmeros casos em que imagens ligam criminosos a ações específicas; num caso que não será julgado nesta fase, o acusado foi flagrado por uma câmera do Planalto destruindo um relógio trazido ao Brasil por Dom João VI).

O argumento da defesa é falho, pois não se trata apenas de vandalismo. A conspiração para atacar as sedes dos Três Poderes, a incitação à violência e a mobilização antidemocrática configuram crimes tão graves quanto os ataques em si. Ninguém ficou semanas acampado em quartéis bradando em favor de um golpe de Estado, à espera de um sinal para agir, sem saber o que fazia. É incontestável que houve um movimento golpista coletivo, e a mera participação nele é crime.

É certo que nem todos tiveram o mesmo grau de envolvimento na conspiração e na violência, portanto nem todos têm a mesma parcela de culpa. Justamente por isso, caberá aos ministros do Supremo analisar as provas com serenidade e afinco para estabelecer punições proporcionais à gravidade dos crimes cometidos.

Os magistrados podem se inspirar nos julgamentos que têm condenado os responsáveis pela invasão do Capitólio, o Congresso dos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021. Os expoentes das cenas de selvageria para tentar manter Donald Trump no poder têm sido levados para trás das grades depois de processos exaustivos, em que têm exercido na plenitude seu direito de defesa (o último foi Enrique Tarrio, líder do grupo de ultradireita Proud Boys, condenado a 22 anos neste mês).

Relatados pelo ministro Alexandre de Moraes, os processos têm tramitado com celeridade e, em razão de seu ineditismo, chamado atenção do público. Como Moraes e o próprio Supremo foram alvo de ataques, será fundamental que os ministros mantenham o equilíbrio, tomem suas decisões com base nos autos e façam o possível para que nem de longe o julgamento possa ser visto como um espetáculo de vingança política. Nada seria mais frustrante para a democracia. [Nota do Blog Prontidão Total: entendemos ser conveniente, para propiciar mais informações aos nossos leitores, a transcrição do presente Editorial, Jornal O Globo.
Porém, destacamos NOSSA DISCORDÂNCIA com quase 100% do que está escrito,
Porém, em respeito ao direito dos nossos leitores, optamos pela não apresentação de qualquer comentário fundamentando com minúcias nossa discordância.]

 Editorial - Jornal O Globo

 

terça-feira, 29 de agosto de 2023

Supremo - Drogas: o único ministro que votou bem é o que está sendo criticado - Alexandre Garcia

Vozes - Gazeta do Povo 

Eu vejo nas redes sociais as pessoas cobrando o ministro que, neste julgamento das drogas, deu o único voto até agora em favor da família, em favor da saúde pública, em favor da segurança pública, em favor da lógica. Ainda está 5 a 1, no Supremo, em favor de isentar de qualquer medida educativa, de pagar cesta básica, aquele que comprar droga para satisfazer o seu trágico vício.

É um voto em favor da família porque não há família feliz se houver viciados na família. O drogado não tem saúde; se o número de drogados se multiplicar, vai ter efeito sobre a saúde pública. 
E, além disso, a lógica diz que, se a venda de droga pelo traficante é crime, a compra também é. Compra e venda formam um pacto entre dois. Se a pessoa compra de um criminoso uma mercadoria cuja venda é crime, o comprador também está praticando crime. 
É como no crime de receptação: a pessoa que compra um celular de um desconhecido assaltante por R$ 200 comete crime de receptação. [oportuno lembrar que o atual presidente concedeu uma espécie de 'anistia informal' aos 'meninos', nas palavras do estadista petista,  que roubam celulares, quando considerou injusto puni-los; 
se o furto de celular  deixou de ser crime, por enquanto informalmente, a compra de celular roubado não é crime  = raciocínio que se estende aos que 'trabalham' na compra e venda de drogas.]

Mas estão criticando justamente o Cristiano Zanin, que deu seu voto com base nessa lógica, com base na defesa da família, em primeiro lugar, mas também da saúde pública e da segurança pública, porque o viciado desesperado pode assaltar, praticar furtos dentro de casa, todo mundo sabe. Mas mesmo assim ainda falta apenas um voto para o Supremo formar maioria em favor da isenção para aquele que, viciado, vai comprar drogas para agravar sua saúde mental e física.

Inversão de valores total na Justiça
Falando em drogas, em abril devolveram para o André do Rap um Porsche, um helicóptero e quatro jet skis, por ordem do Supremo, porque onde é que já se viu fazer busca e apreensão contra ele. 
Também em maio, um sujeito com 257 pinos de coca foi liberado. Outro estava com 695 quilos de droga, que a Polícia Federal descobriu por acaso, e a apreensão foi anulada. 
Em junho, o Superior Tribunal de Justiça liberou Batatinha, um dos líderes do PCC. Enquanto isso, há 1.390 brasileiros que foram presos, viraram réus, os que foram para casa estão até hoje com tornozeleira, outros continuam presos.
 
Por que eu estou contando isso? Estou influenciado pela motorista que nesta segunda-feira me levou da Barra até o Santos Dumont, uma carioca da gema. Ela foi me contando como é que foi a festa com um DJ famoso no centenário do Copacabana Palace.  
Quinhentas pessoas foram presas por assalto, muitas armas foram aprendidas, mas 24 horas depois só 20 ainda estavam presos. Está havendo uma total inversão que as pessoas não aceitam, porque agride.
 

Governo vai atrás do dinheiro de empresários que geram emprego e renda
O salário mínimo foi fixado em R$ 1.320
, está sancionada a lei. E a isenção do Imposto de Renda Pessoa Física aumentou para R$ 2.640. Imaginem o sujeito que ganha R$ 2.641 e vai pagar IR; já está pagando 20%, 30%, 35% sobre tudo o que compra, e ainda vai ter de pagar imposto de renda.  

Para compensar, o governo anunciou que vai tirar R$ 7 bilhões de 2,5 mil pessoas que aplicam dinheiro em offshore, trustes, empresas, bancos, de lugares que não estão sob a jurisdição do Estado que cobra imposto; agora vão pagar de 15% a 20%. Quem são essas pessoas?  
São grandes empresários. Ninguém recebeu herança, ninguém achou pote de ouro no fim do arco-íris. 
É gente que trabalha, que produz, que emprega, que paga impostos habitualmente, já pagou a vida toda, cria empregos.

Um seguidor sugeriu uma vez que, assim como a igreja é separada do Estado, por que não separar a economia do Estado também? 
Aí a economia poderia crescer sem o Estado inchar à custa dos pagadores de impostos. Uma bela ideia, não? 
Em suma, é isso: se o Estado não atrapalha, as pessoas vão abrir empresas, vão produzir mais, vão pagar mais impostos, vão dar mais empregos e vão pagar mais salários. 
A liberdade econômica é fértil, muito fértil.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Máquina parada - Revista Oeste

Cristyan Costa 

Segundo Parlamento mais caro do mundo, o Congresso Nacional gasta R$ 40 milhões por dia. Em troca, os brasileiros recebem um Legislativo inerte e pisoteado pelo Supremo


 Congresso Nacional | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Jefferson Rudy/Agência Senado

Desde os escândalos do Mensalão e do Petrolão, os brasileiros perceberam que o Congresso Nacional, com raras exceções, trabalha para atender aos próprios interesses.  
Nos quatro anos do governo Jair Bolsonaro, o Parlamento assistiu inerte ao avanço do Poder Judiciário, que atropelou suas competências constitucionais e passou a legislar. 
Hoje, encontra-se em estado de “morte clínica”. Ainda está aberto para visitação de turistas aos fins de semana e para algumas votações esporádicas — às vezes, on-line, porque depois da pandemia foi instituído o voto à distância. O problema é que essa máquina estatal parada custa (muito) caro para os pagadores de impostos.
 
O Congresso custa quase R$ 14 bilhões por ano. Ou cerca de R$ 40 milhões por dia. É o segundo Parlamento mais caro do planeta, depois dos Estados Unidos.  
 

(.....)

 

A maior parte do orçamento do Legislativo é direcionada ao pagamento dos salários e dos benefícios de congressistas e servidores: R$ 6,5 bilhões
Só para assistência médica e odontológica, a verba disponível é de cerca de R$ 500 milhões. 
O segundo maior gasto é com aposentadorias e pensões, que totalizam R$ 5,5 bilhões.
 
Ao todo, o Congresso tem 20 mil servidores. A Câmara é quem mais abriga funcionários: 15 mil comissionados, efetivos (concursados) e estagiários. O maior grupo é formado pelos assessores dos gabinetes (pouco mais de 10 mil), também conhecidos como secretários parlamentares. No Senado, há 6,1 mil servidores. A maioria, 4,1 mil, é comissionada
O gasto com cada um dos parlamentares corresponde a aproximadamente 530 vezes a renda média dos brasileiros.

Além dos altos salários, verba de gabinete e veículo funcional, deputados e senadores dispõem de quatro superquadras residenciais em Brasília, que acomodam os apartamentos funcionais. Neste ano, pouco mais de R$ 20 milhões estão reservados para a manutenção dos imóveis. Se o parlamentar decidir não morar em um desses apartamentos, pode requisitar o auxílio-moradia de R$ 4,2 mil. Em 2022, foram usados R$ 10,5 milhões com tal finalidade.

Os apartamentos funcionais também são disponibilizados para integrantes do Executivo e do Judiciário e, da mesma forma, os custos são previstos no Orçamento Geral da União.

Cada Casa possui ainda algumas regalias. Os senadores, por exemplo, têm à disposição um restaurante subsidiado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac).  
O espaço é amplo e iluminado pela luz natural que entra por grandes janelas com vista para um belo jardim de inverno. 
Milimetricamente organizadas, as mesas retangulares de madeira maciça são adornadas com toalhas brancas de linho que quase tocam o chão. Pequenos vasos de flores amarelas fazem contraste com os jogos americanos na cor preta acompanhados de talheres polidos feito prata. 
Os garçons trazem a comida em bandejas de aço escovado, cuja cloche metálica é coreograficamente erguida por eles, ao mesmo tempo, quando a bebida e os três pratos do dia são servidos: salada, carnes variadas e sobremesa.
 
(.....)

Mesmo com toda essa estrutura custeada pelo povo, Câmara e Senado têm obedecido mais ao Judiciário que ao seu verdadeiro patrão, ao permitirem absurdidades dignas de uma república de bananeiras

Nos últimos anos, o Congresso — sobretudo as bancadas de deputados — também passou a frequentar as manchetes da imprensa por outro motivo: cada votação de interesse do Palácio do Planalto tem um preço. A moeda se chama emenda parlamentar, que no passado ficou conhecida como verba doorçamento secreto”, para desgastar Bolsonaro — apesar de ser um expediente dos parlamentares. Emendas são recursos destinados a obras em redutos eleitorais dos deputados — como recapeamento de vias, praças, quadras esportivas e postos de saúde.

Neste ano, Lula já liberou quase R$ 10 bilhões para aprovar, por exemplo, o remendo de reforma tributária e a medida provisória que assegura o funcionamento da imensa estrutura ministerial.

Omissão
Mesmo com toda essa estrutura custeada pelo povo, Câmara e Senado têm obedecido mais ao Judiciário que ao seu verdadeiro patrão, ao permitirem absurdidades dignas de uma república de bananeiras. Em 2021, o então deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) foi preso depois de criticar os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). 
Silveira passou nove meses detido em regime fechado. 
Só depois desse período é que conseguiu a domiciliar. 
Hoje, está detido no Presídio de Benfica, na zona norte do Rio, apesar de um indulto concedido por Bolsonaro.  
Tudo isso ocorreu sob o olhar inerte do presidente da Câmara, Arthur Lira, que tem o dever de proteger a imunidade parlamentar, uma garantia constitucional.
 
Recentemente, Lira também se calou quanto à cassação do agora ex-deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), pelo Tribunal Superior Eleitoral. 
No Senado, a letargia se repete sob a gestão de Rodrigo Pacheco. 
Há algumas semanas, Pacheco liberou a Polícia Federal para fazer uma operação de busca e apreensão, a mando do ministro Alexandre de Moraes, no gabinete do senador Marcos do Val (Podemos-ES). A mesma inércia de Pacheco deve se repetir com Sergio Moro, cujo mandato pode acabar antes de 2030 (União Brasil-PR). 
Isso porque, nos bastidores, a esquerda já dá como certa a cassação do ex-juiz da Lava Jato, por causa de processos movidos na Justiça Eleitoral contra ele pelo PT, PCdoB, PV e PL.
 
O Congresso deu, ainda, um “cheque em branco” para Lula gastar R$ 145 bilhões acima do que a lei permite, ao aprovar a PEC da Gastança um assalto explícito ao Tesouro. 
Os deputados e senadores não têm mais nenhum medo de seus eleitores só têm medo dos ministros do STF e das punições que podem receber deles, inclusive por seus problemas com o Código Penal. Todos desfrutam do foro privilegiado; é o STF que decide se são processados ou se ficam fora da cadeia
Têm, hoje, o grande privilégio de obedecer às ordens da ditadura do Judiciário.
 

Leia também “Esquecidos no cárcere”

Coluna Cristyan Costa, jornalista - Revista Oeste