O Estado de S. Paulo
Do ruim ao péssimo
O novo ministro, que vai ficar aí pelos próximos 27 anos, é o preferido e conterrâneo de um senador do Piauí denunciado na Lava Jato, em fevereiro último, pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, sob a acusação de ter recebido uma propina de R$ 7 milhões da empreiteira Odebrecht, a campeã da roubalheira nos governos Lula-Dilma. Desde então, seu processo jaz num canto qualquer do STF. “Todos nós do Piauí estamos na torcida”, disse o senador pouco antes da indicação ser confirmada – dá para entender perfeitamente, com a sua folha corrida criminal, o quanto ele realmente torceu. Não há nada parecido com isso em nenhum país do mundo. Como o presidente da República e os militares que se apresentam como a rede de segurança moral do seu governo podem explicar uma coisa dessas?
As demais qualificações desse dr. Kassio são uma perfeita desgraça. Ele nunca foi juiz na vida – no STF de hoje, por sinal, parece proibida a entrada de juízes de direito, sendo um “plus a mais”, na verdade, se você é reprovado duas vezes seguidas no concurso para a carreira. Foi nomeado para a magistratura federal pela ex-presidente Dilma Rousseff. É contra a prisão de criminosos depois de serem condenados na segunda instância. No seu entender, não se pode mandar um sujeito para a cadeia só porque ele recebeu duas sentenças de condenação; não é “consectário”, diz ele, que o crime deva ser seguido de punição. “Consectário”? Pois então: essa é a língua que o homem fala.
O dr. Kassio, quando teve de se manifestar sobre o assunto, decidiu que é perfeitamente normal você pagar pelas lagostas servidas aos ministros do STF. Em outras coisas ele não tem pressa nenhuma: está respondendo a mais de 30 queixas no Conselho Nacional de Justiça por ficar segurando processo. Cinco anos atrás ficou a favor da permanência no Brasil do terrorista italiano Cesare Battisti, quatro vezes assassino em seu país. Sua indicação para o cargo foi abençoada por Gilmar Mendes, Antonio Toffoli e o senador Alcolumbre; [se os três ministros citados e o presidente da OAB, tivessem repudiado a indicação, teríamos a certeza que a indicação convinha aos interesses do Brasil]. A reunião em que se decidiu a indicação foi na casa do próprio Gilmar, com Bolsonaro dizendo que quer se entender melhor com o STF e com o Congresso. Houve festa nas gangues do “Centrão”. Todos adoraram. É difícil fazer pior.
Num país com mais de 1 milhão de formados em Direito, por que escolher justo esse? Na única explicação que deu sobre o caso, Bolsonaro disse que indicou o dr. Kassio porque os dois tomaram “muita tubaína” juntos; havia outros bons nomes, mas seu problema, segundo o presidente, é que “não tomaram tubaína” com ele. Lembrou, aí, os melhores momentos de Dilma Rousseff. Em compensação, comprou a paz possível com o STF, o PT, a OAB, o Congresso, os intelectuais, os comunicadores e a ladroagem raiz – que, como ensina a experiência, é o melhor caminho para chegar ao coração da esquerda. [esquecendo que declarou guerra, humilhou, decepcionou milhões de apoiadores.] É onde estamos.
J.R.Guzzo, jornalista - O Estado de S. Paulo