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segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Bolsonaro teve a sua primeira grande chance de piorar o STF. Não perdeu a viagem

J.R. Guzzo

Não tem preço 

A reação mais notável à decisão do presidente Jair Bolsonaro de indicar para a vaga ora aberta no STF um advogado do Piauí que foi nomeado para a magistratura federal por Dilma Rousseff, é contra a prisão de criminosos depois de condenados em segunda instância e teve a torcida pública de um senador do seu Estado oficialmente denunciado pelos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro foi um silêncio de cemitério do Oiapoque ao Chuí. 

É verdade que ninguém teve a coragem de elogiara não ser o próprio Bolsonaro, é claro, e as gangues que fazem do Congresso brasileiro um dos mais desprezados corpos legislativos do planeta. 
Mas onde foram parar os protestos, a ira e a indignação que se levantam quase automaticamente, desde o primeiro dia do seu governo, a cada vez que o presidente abre a boca ou decide alguma coisa? Não houve nem protesto nem ira nem indignação.

Por que será? É provável que Bolsonaro nunca tenha criado uma calamidade tão maligna quanto essa – nem tão duradoura, visto que o seu preferido vai ficar decidindo o que é certo e o que é errado para o Brasil pelos próximos 27 anos. Mas o que houve, de Lula e da extrema esquerda até a bancada “da bala” e a extrema direita, foi um dos mais intensos movimentos que já se viu neste país em matéria de olhar para o outro lado e fazer de conta que não aconteceu nada demais. [inclusive aqueles partidecos sem votos e sem programa, que a qualquer pretexto judicializam tudo que o presidente tenta emplacar, silenciaram - esquecendo o que se tornou a máxima deles: 'não temos votos, nem programa de governo, mas governamos através do Supremo'; 

E, notem que a primeira ação poderia ter como fundamento qualquer detalhe  e com o estouro curricular, poderiam questionar até a reputação ilibada do indicado.

Nada fizeram, afinal perceberam a possibilidade da gangue esquerdista ainda enrolada com a Justiça ser absolvida.] Nem a constatação de que o novo ministro copiou e colou na sua “tese” trechos inteiros escritos por um advogado amigo – incluindo os erros de português – sem dar um pio sobre o nome do verdadeiro autor, provocou maiores objeções. Para um presidente que é diariamente acusado de genocídio para baixo, fora o pouco-caso com os quilombolas, os incêndios no Pantanal e a sua participação em milícias do crime organizado, trata-se de uma vitória e tanto.

Leia Também: Do ruim ao péssimo

A passividade com que os inimigos de Bolsonaro receberam a indicação do dr. Kássio para o STF, para não ficar enrolando a questão com considerações superiores de ciência política, tem uma explicação bem simples: ninguém falou nada porque todo mundo gostou – ou, se não gostou, engoliu com casca e tudo. O novo ministro, quando se pensa um pouco, é o homem dos sonhos do mundo político brasileiro de hoje agrada ao PT, ao “Centrão”, à OAB, ao ministro Gilmar Mendes, aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, às empreiteiras de obras públicas, aos refugiados da Lava Jato, aos escritórios “top de linha” da advocacia criminal, aos defensores das “instituições democráticas”, à classe intelectual, ao presidente Bolsonaro, à família do presidente Bolsonaro e por aí vamos. O leitor se lembrou de alguém mais? Pode colocar na lista. [com certeza não agradou, não agrada e nem agradará aos bolsonaristas de raiz - esperamos que o presidente Bolsonaro ou as falhas curriculares do indicado revertam a indicação, ou será que só contamos na hora do voto?]

O fato é que ninguém que viaja nesse bonde pode admitir, de jeito nenhum, que o STF melhore, por pouco que seja. Pode tudo – mas melhorar, não. Eis aí o maior risco que todos eles podem correr hoje em dia. Um Supremo menos ruim que esse é uma ameaça direta ao seu bem-estar; é ali que os “garantistas” garantem que os acusados de corrupção sejam deixados em paz, e a garantia dessa impunidade não tem preço para os proprietários da vida pública do Brasil. Uma Justiça mais decente obrigaria a classe política e o resto da massa que hoje vive à custas da máquina do Estado a se comportarem melhor do que se comportam. E quem está querendo se comportar melhor nesse povo? Bolsonaro teve a sua primeira grande chance de piorar o Supremo. Não perdeu a viagem.

É a “governabilidade” – todo o mundo se ajeita, a “resistência” continua fazendo discurso, mas deixa Bolsonaro em paz nas coisas que de fato importam, e o público pagante fica no papel de otário.

J.R. Guzzo, Jornalista - O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Bolsonaro conseguiu algo que parecia fora do alcance humano: piorar o STF

O Estado de S. Paulo

Do ruim ao péssimo

O nome que o presidente Jair Bolsonaro indicou para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal tem todos os requisitos para ser a pior de todas as decisões que tomou no seu governo ou uma das duas piores, já que ele promete fazer com o próximo lugar a ser preenchido no STF, no ano que vem, o mesmo que está fazendo agora. Bolsonaro teve quase dois anos inteirinhos para pensar direito numa das decisões mais importantes que um presidente da República pode tomar enquanto está no Palácio do Planalto, sobretudo quando o mais alto tribunal de Justiça do País, como acontece no momento, está desesperadamente necessitado de ficar um pouco melhor do que é. Veio com isso aí que foi anunciado. Bolsonaro conseguiu algo que parecia fora do alcance humano: piorar o STF.

O novo ministro, que vai ficar aí pelos próximos 27 anos, é o preferido e conterrâneo de um senador do Piauí denunciado na Lava Jato, em fevereiro último, pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, sob a acusação de ter recebido uma propina de R$ 7 milhões da empreiteira Odebrecht, a campeã da roubalheira nos governos Lula-Dilma. Desde então, seu processo jaz num canto qualquer do STF. “Todos nós do Piauí estamos na torcida”, disse o senador pouco antes da indicação ser confirmada – dá para entender perfeitamente, com a sua folha corrida criminal, o quanto ele realmente torceu. Não há nada parecido com isso em nenhum país do mundo. Como o presidente da República e os militares que se apresentam como a rede de segurança moral do seu governo podem explicar uma coisa dessas? 

As demais qualificações desse dr. Kassio são uma perfeita desgraça. Ele nunca foi juiz na vidano STF de hoje, por sinal, parece proibida a entrada de juízes de direito, sendo um “plus a mais”, na verdade, se você é reprovado duas vezes seguidas no concurso para a carreira. Foi nomeado para a magistratura federal pela ex-presidente Dilma Rousseff. É contra a prisão de criminosos depois de serem condenados na segunda instância. No seu entender, não se pode mandar um sujeito para a cadeia só porque ele recebeu duas sentenças de condenação; não é “consectário”, diz ele, que o crime deva ser seguido de punição. “Consectário”? Pois então: essa é a língua que o homem fala.

O dr. Kassio, quando teve de se manifestar sobre o assunto, decidiu que é perfeitamente normal você pagar pelas lagostas servidas aos ministros do STF. Em outras coisas ele não tem pressa nenhuma: está respondendo a mais de 30 queixas no Conselho Nacional de Justiça por ficar segurando processo. Cinco anos atrás ficou a favor da permanência no Brasil do terrorista italiano Cesare Battisti, quatro vezes assassino em seu país. Sua indicação para o cargo foi abençoada por Gilmar Mendes, Antonio Toffoli e o senador Alcolumbre; [se os três ministros citados e o presidente da OAB, tivessem repudiado a indicação,  teríamos a certeza que a indicação convinha aos interesses do Brasil]. A reunião em que se decidiu a indicação foi na casa do próprio Gilmar, com Bolsonaro dizendo que quer se entender melhor com o STF e com o Congresso. Houve festa nas gangues do “Centrão”. Todos adoraram. É difícil fazer pior.

Num país com mais de 1 milhão de formados em Direito, por que escolher justo esse? Na única explicação que deu sobre o caso, Bolsonaro disse que indicou o dr. Kassio porque os dois tomaram “muita tubaína” juntos; havia outros bons nomes, mas seu problema, segundo o presidente, é que “não tomaram tubaína” com ele. Lembrou, aí, os melhores momentos de Dilma Rousseff. Em compensação, comprou a paz possível com o STF, o PT, a OAB, o Congresso, os intelectuais, os comunicadores e a ladroagem raiz – que, como ensina a experiência, é o melhor caminho para chegar ao coração da esquerda. [esquecendo que declarou guerra, humilhou, decepcionou  milhões de apoiadores.] É onde estamos.

J.R.Guzzo, jornalista - O Estado de S. Paulo