A sessão desta terça-feira escancarou o conflito que se estabeleceu na
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal. De um lado, o minoritário
relator da Lava Jato, Edson Fachin. Do outro, a maioria formada pelos
votos de Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Isolado,
Fachin assistiu à abertura da cela de presos condenados em segundo grau
—entre eles José Dirceu—,
presenciou a anulação de provas e testemunhou a suspensão de
investigações. Se o recurso de Lula estivesse na pauta, a possibilidade
de libertação do principal preso da Lava Jato era real. Foi por essa
razão que, na véspera, Fachin transferiu o julgamento do recurso do
líder máximo do PT para o plenário do Supremo.
O caso de Lula é muito semelhante ao de Dirceu. [apenas semelhante; jamais considerar que seja igual - há muitas diferenças.] Por 3 votos a 1,
a Segunda Turma colocou o ex-chefe da Casa Civil em liberdade até que o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgue recurso da defesa contra a
condenação imposta por Sergio Moro e confirmada pelo TRF-4, o tribunal
de segunda instância que cuida dos casos da Lava Jato. Relator do
recurso de Dirceu, o ministro Dias Toffoli votou a favor da concessão do
hebeas corpus. Fachin ainda tentou manter Dirceu atrás das grades. Ele
pediu vistas do processo. Em condições normais, o pedido provocaria a
suspensão do julgamento. Mas Toffoli estava mesmo decidido a abrir a
cela.
Ex-assessor do PT na Câmara, ex-subordinado do próprio
Dirceu na Casa Civil da Presidência e ex-advogado-geral da União do
governo petista, Toffoli votou a favor da concessão de um habeas corpus
“de ofício”. Os magistrados agem assim, “de ofício”, mesmo sem a
formalização de um pedido da defesa, quando há a necessidade de evitar
uma ilegalidade flagrante. Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski
acompanharam Toffoli. O decano Celso de Mello, que também integra a
Segunda Turma, não compareceu à sessão. Mas ainda que estivesse
presente, seu voto não alteraria a maioria pró-Dirceu. “O Fachin estava antevendo esse desastre”, disse ao blog,
sob o compromisso do anonimato, um ministro do Supremo que não compõe a
Segunda Turma. “Ele fez muito bem em lançar mão das prerrogativas de
relator para afetar o julgamento do recurso do Lula ao plenário. Nessa
hora, é preciso assegurar o respeito ao princípio da colegialidade. A
prisão em segunda instância prevaleceu no plenário do Supremo em mais de
uma oportunidade. Ou respeitamos isso ou vamos para um ambiente de
absoluta insegurança jurídica.”
Normalmente comedido, Fachin não
se conteve diante do voto de Toffoli. Insinuou que o colega ignorava a
posição do plenário da Suprema Corte, que confirmou recentemente, por 6 a
5, no julgamento de um habeas corpus de Lula, a regra sobre a prisão.
Toffoli deu de ombros. Declarou que o fundamento do seu voto não tem
nada a ver com o debate sobre a execução imediata da pena. Apenas
considerou que o recurso de Dirceu apresenta argumentos plausíveis sobre
um hipotético exagero na fixação da pena (30 anos e 9 meses de cadeia).
Para Toffoli, a queixa quanto à dosimetria da pena pode ser considerada
procedente quando o mérito for efetivamente julgado. Portanto, manter
Dirceu atrás das grades antes de esgotada a análise da reclamação
poderia representar uma injustiça.
A certa altura, Toffoli pôs em
dúvida a própria capacidade intelectual de Fachin: “Eu estou falando ‘A’
e vossa excelência está falando ‘B’.” A resposta de Fachin veio de
bate-pronto: “Nós dois estamos entendendo o que estamos falando”. Ficou
subentendido que, para o relator da Lava Jato, seus colegas da Segunda
Turma manobram para transformar em letra morta a decisão do Supremo que
autorizou o encarceramento de condenados na segunda instância do
Judiciário.
Além de Dirceu, a Segunda Turma libertou João Claudio
Genu, um ex-tesoureiro do PP igualmente condenado na segunda instância.
Mais: contra o voto de Fachin, os ministros mantiveram em liberdade
Milton Lyra, um lobista ligado ao MDB que responde a inquérito por
desvio de verbas de fundos de pensão de estatais. Ele havia sido solto
por uma liminar de Gilmar Mendes. Não é só: a Segunda Turma anulou
as provas obtidas contra o ex-ministro petista Paulo Bernardo em batida
de busca e apreensão no apartamento funcional da mulher dele, a
senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Como se fosse pouco, os ministros
suspenderam a ação penal contra o deputado estadual Fernando Capez
(PSDB-SP) num caso de desvio de merenda escolar.
Foi contra esse
pano de fundo que Fachin agiu para evitar que Lula fosse incluído no rol
de beneficiários da políticas de celas abertas da Segunda Turma. Na
sexta-feira, ele pediu que fosse retirado da pauta o recurso da defesa
de Lula. Fez isso depois que o TRF-4 considerou que o recurso não era
admissível. Os advogados de Lula pediram a Fachin que reconsiderasse sua
decisão. Ou submetesse a encrenca aos colegas. O relator da Lava Jato
preferiu transferir a batata quente para o plenário. E encomendou
parecer à Procuradoria, concedendo prazo de 15 dias. Com isso, manteve
Lula preso pelo menos até agosto, irritou os colegas de turma e comprou
briga com o PT. De resto, expôs a conflagração que tomou do Supremo.
Blog do Josias de Souza
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quarta-feira, 27 de junho de 2018
Fachin tirou Lula da 2ª Turma porque possibilidade de libertação era real
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