Que evento
poderia ter tornado um termo que nunca levantou a menor das preocupações
pelo planeta Terra ao topo das prioridades jurídicas, políticas,
sociais e “last but not least, policiais em todo o globo? A resposta é
simples, mas não seu contexto: a eleição americana que sagrou Donald
Trump como o 45º Presidente americano em 8 de novembro de 2016."
Flávio Morgenstern
Nunca
imaginei que ia chegar um tempo em que “eu não acredito nisso” seria a
frase que eu diria com mais constância. E sabe qual a última?! Um
amigo me contou que seu professor de universidade disse que a soberania
do povo há que ser relativizada. Em seguida falou de manipulação das
informações por uma tal “indústria” de “fake” News. “Eu não acredito
nisso!”.
O pior de tudo é eu teimar em dizer essa frase constante diante
de uma constância que deveria me fazer acreditar imediatamente em
qualquer coisa nesse sentido, ainda mais se vier da majoritária parcela
ideológica da imprensa e da academia: especificamente quanto a essa
parcela totalitarista e antidemocrática, mas majoritária em seus campos,
eu tenho orgulho de ser contramajoritário...
Mas essa
colocação do tal professor ajuda a entender bem a coisa, revela
muito... Vamos trabalhar em partes como quem fatia ansioso um bife
Ancho, enquanto não proíbem o consumo de carne.
Notem que ele
fala em manipulação por “fake” News. E o que seriam fake News para ele
e outros ideológicos? “Fake News é tudo aquilo de que eu discordo”
diria ele se falasse francamente. Morgenstern, em artigo do best
seller O Inquérito do Fim do Mundo, demonstra que a expressão “fake
News” foi propositalmente introduzida e artificialmente multiplicada no
debate público no contexto da eleição de Trump como um artifício para
justificar os erros crassos decorrentes da análise política ser
substituída por torcida ideológica: até então, as estatísticas do Google
registravam pouquíssimo uso dessa expressão.
Com isso, além de uma
desculpa, davam o primeiro passo para justificar a escalada de censura
que se seguiu, para garantir que ninguém mais vencesse contra
o establishment.
Notem que ele
fala em “indústria” de “fake” News. Nessa parte, ele está se referindo
a dois mitos, duas falácias que os ideológicos criaram. A primeira
delas são os tais “robôs” .
A partir do momento que eles percebem que
nas redes sociais existe a verdadeira Liberdade de Expressão, num nível
que nunca houve antes, quando eles percebem que pessoas comuns,
influenciadores e jornalistas independentes, sem apoio dos poderosos,
podiam expor opiniões sem o controle, sem a censura de um editor, eles
tinham que desestimular isso a todo custo, inventar que não eram
milhares de pessoas opinando, mas sim uma meia dúzia controlando robôs,
poderia convencer muitos incautos e justificar, usando as verdadeiras
“fake news”: o desprezo pela opinião da maioria afirmando que não era
maioria .
A segunda
falácia é destinada a atingir os conservadores que conseguissem deixar
claro que não eram robôs: bastaria chamá-los de milícias virtuais. E
por quê?
Porque a expressão milícia teve seu sentido mudado, apropriado
por bandidos que, como o tráfico de drogas, dominam grandes áreas do Rio
e de outras cidades, formando um estado paralelo.
Assim, qualquer um
que tivesse uma opinião contrária ao establishment e comprovadamente
existisse, passava a ser tratado como um miliciano, como um
bandido desumano.
Note que há poucos anos se falava até em cursos e
treinamentos de MAV, “militância em ambiente virtual” (procurem no
Google as notícias antigas sobre isso), que atuariam politicamente nas
redes, de forma coordenada e organizada, divulgando material de forma
centralizada, e isso não foi tachado de milícia virtual mesmo sendo um
grupo treinado e que atuaria de forma coordenada. Obviamente: não eram
conservadores...
Com essas
duas falácias, se consegue duas coisas: desumanizar quem não concordar
com a “nobreza” iluminada e; deslegitimar a opinião majoritária das
redes, negando que ela signifique o pensamento da maioria da população,
negando representatividade a quem opina nas redes contra a opinião
que determinaram como autorizada.
Completando a
análise do que disse o tal professor, chegamos ao ponto principal:
a confissão!!!
Quando ele fala em relativizar a soberania
popular chegamos ao ponto em que esse pessoal não aguenta a coceira na
língua e confessa aquilo que já sabemos: o desprezo que eles têm pelo
povo, e que o objetivo deles é submeter a maioria a um governo da
minoria, mesmo que esses estratagemas não funcionem. Não é à toa o
orgulho de alguns se afirmarem contramajoritários.
“O povo está
certo só quando expressa as opiniões que nós queremos e vota em quem nós
queremos” seria a frase que eles poderiam dizer, agora, se fossem
sinceros. Mas, como a Aurora, eles não são. Chamando de mentira,
de “fake” News opiniões contrárias e até fatos, usando leftcheckers para
garantir que opiniões contrárias à esquerda sejam censuradas, chamando
de crime e de organização criminosa o funcionamento básico de qualquer
rede social (algum influencer ou qualquer pessoa comum posta algo,
muitos concordam e passam a divulgar espontaneamente, sem lideranças
treinamento ou coordenação), surgiu o ambiente perfeito para uma censura
progressiva que sob a cínica chave-mestra “a liberdade de expressão não
é absoluta” e o complemento que não verbalizam – “e eu digo qual o
limite caso a caso” – garantiu “liberdade” ilimitada aos que repetem,
digo, dizem só o que eles permitem... Em breve, se você não repetir o
que Pravdas e Granmas oficialmente disserem, você não poderá publicar
nada e as pessoas só conhecerão os fatos e versão permitidos...
E aí, por fim, surgiu a pandemia que garantiu a supressão de várias garantias e relativizou totalmente a Constituição.
Mas foi então, que Einstein descobriu a relatividade
E tudo que era espúrio passou a ser moralidade.
Millôr Fernandes
P.S. Agora o livro 2020 D.C. Esquerdistas Culposos e outras assombrações tem uma trilha sonora com canções e músicas de filmes citados.
- Publicado originalmente no excelente Portal Tribuna Diária
- O autor é mestre em
Direito, membro do Movimento Contra a Impunidade (MCI) e do Ministério
Público Pró Sociedade (MP Pró Sociedade), autor de “2020 D.C.,
Esquerdistas Culposos e Outras Assombrações” e de “Hierarquia e
Disciplina são Garantias Constitucionais”.