Pôr em pauta no Supremo a votação da prisão em segunda instância significa ceder a pressões e constrangimentos
Com a
decisão unânime da quinta turma do STJ de negar o habeas corpus a Lula, a única
chance de o ex-presidente escapar do xilindró passou a ser que a prisão em
segunda instância seja votada, e derrotada, no Supremo. Há cerca
de dez dias, o decano do STF, Celso de Mello, o mais prudente dos ministros, e
o mais próximo a Cármen Lúcia, deu entrevista defendendo que a presidente
pautasse o tema. Apesar de inapropriado, Celso tinha um ponto: a questão está
longe de ser estar pacificada.
Afinal,
Gilmar vive repetindo que mudou de ideia; [todo ser humano, sem exceção, tem pleno direito a mudar de ideia;
o que é inaceitável é que devido determinada excelência ter mudado de ideia a Corte Suprema desperdice tempo precioso para analisar matéria analisada analisado pelo Plenário - onze ministros presentes - há menos de dois anos;
qual imagem transmite uma SUPREMA INSTÂNCIA que decide sobre uma matéria e após alguns meses volta a discutir o mesmo assunto - discussão apoiada em:
- um dos ministros ter mudado de opinião;
- outro, que postergou sua aposentadoria devido a 'emenda da bengala', ter concedido entrevista querendo pautar a presidente do STF;
- e o assunto interessar diretamente ao condenado Lula da Silva?] ministros (Marco Aurélio e
Lewandowski, em particular) vêm libertando condenados a torto e a direito;
existem processos esperando decisão do Supremo a respeito; boa parte dos
ministros quer reexaminar o tema. Há motivos de sobra para pôr o assunto em
votação. Mas a presidente resiste.
A atitude
de Cármen lembra a de Dias Toffoli, que, sentado em cima do processo do foro privilegiado
há meses, impõe a sua vontade de forma autoritária, impedindo que a Justiça
siga o seu curso. Não surpreende que seja acusada de manipular politicamente a
pauta.
A
presidente afirma que rever uma decisão tomada há tão pouco tempo “apequenaria”
o Supremo, o que é verdade, mas o principal motivo é que, se botar a questão
para votar, será acusada de manipular politicamente a pauta para favorecer
Lula. De ceder à pressão do PT ou de seus próprios pares. De ceder ao
constrangimento que a presença do novo advogado do ex-presidente, Sepúlveda
Pertence, de quem é próxima, lhe impõe.
Com a
derrota acachapante no STJ, o jogo no vestiário ficou ainda mais pesado, e a
pressão para que Cármen paute o tema cresceu violentamente. Cármen
não é famosa por resistir a pressões. Quando Marco Aurélio destituiu Renan
Calheiros da presidência do Senado, ela cedeu, e participou do vergonhoso
esforço para botar Renan de volta na cadeira. No episódio sobre o destino de
Aécio, novamente cedeu, e deu ao Senado o poder de revogar uma resolução do
STF, uma das decisões mais absurdas já tomadas na casa em todos os tempos.
Execrada
pela opinião pública nas duas ocasiões, a presidente do Supremo optou, desta
vez, pela firmeza. Primeiro, deu um calaboca geral, lembrando a todo mundo o
que todo mundo sabe: ninguém precisa da presidente do STF para botar o assunto
em votação. Basta que um ministro leve a julgamento um caso concreto de prisão
em segunda instância que a votação ocorre. Em
seguida, descalçou a bota de vez ao revelar a pauta de abril, que nada inclui a
respeito de prisão em segunda instância: no que depender dela, Lula vai preso,
sim. E estamos conversados.
Ato
contínuo, todo mundo fez cara de paisagem e saiu de fininho. Até Lewandowski,
que, uma vez sim, outra também, vota a favor do PT, avisou que não vai levar a
julgamento nenhum dos dois habeas corpus de que é relator. Lula
corre o risco de ver o sol nascer quadrado simplesmente porque, entre os 11
valorosos ministros do Supremo, Gilmar, Toffoli e Lewandowski incluídos, não há
um único que aceite arcar com o ônus de ser o libertador do ex-presidente (e,
em consequência, ser trucidado nas redes antissociais). [além do citado trucidamento nas redes sociais o 'libertador' terá que evitar aviões de carreira, locais públicos, etc.]
GREVE DOS
JUÍZES
A greve
dos juízes federais vai ser nesta quinta. Dá para emendar e fazer um feriadão.
Coluna: Ricardo Rangel - O Globo