Estatísticas desencontradas e falta de critérios na
consolidação de dados atrapalham a gestão pública e o dia a dia de empresas e
cidadãos
O coronavírus expôs uma endemia brasileira: a
precariedade na produção de estatísticas. Dados imprecisos e com atraso geram
informações distorcidas para quem precisa tomar decisões importantes.
Dirigentes públicos, empresários, executivos e mesmo cidadãos comuns ficam
frequentemente perdidos frente aos números. Especialistas chegam a utilizar
expressões como “apagão de dados” e “voo cego” para descrever a situação
pela qual passa o país. Enquanto a maior parte do Brasil ainda caminha no
escuro, medidas autoritárias e de isolamento severas são impostas à
população. Políticos e “gestores” de vários Estados afirmam que suas
decisões são amparadas pelo rigor científico, embora não exista a mais remota
comprovação disso.
O cientificismo usado para justificar o #ficaemcasa
escancara uma realidade: há mais dúvidas do que certezas sobre a pandemia, e a
própria ciência não sabe o que fazer diante do inimigo desconhecido. Teses
sobre isolamento, contaminação, vacina e medicamentos são defendidas a todo
instante e desacreditadas na semana seguinte, com a mesma rapidez com que são
revistas medidas que impactam a vida de todos. Notavelmente ilustrativo é o caso da Organização
Mundial da Saúde (OMS). Para boa parte da imprensa e para quem decide se você
pode ou não sair de casa, a entidade é considerada autoridade máxima. Só que,
desde a chegada do vírus chinês, o que se viu foi uma sucessão de trapalhadas
por parte da OMS que só geram descrédito e desinformação em escala global. Para
ficar só nos últimos acontecimentos, de modo a não cansar o leitor, em 8 de
junho a médica-chefe da entidade, a epidemiologista norte-americana Maria Van
Kerkhov, veio a público dizer que a transmissão do coronavírus a partir de
assintomáticos era “muito rara”. Um dia depois, a OMS voltou atrás. “Estamos
absolutamente convencidos de que a transmissão por casos assintomáticos está
ocorrendo, a questão é saber quanto”, disse o diretor de emergências da
organização, Michael Ryan.
No caso da revista britânica The Lancet, a questão foi
em torno do uso da hidroxicloroquina. Em 22 de maio, a revista publicou um
estudo sem comprovação científica que indicava a ineficácia do uso da medicação
em fase hospitalar, ou seja, no estágio mais avançado da covid-19. Menos de
duas semanas depois, a publicação emitiu nota de retratação dos autores do
estudo. Informou que, após auditoria independente dos dados, já não “poderiam
mais ter certeza da veracidade do material analisado e, portanto, dos
resultados obtidos”.
Outro exemplo foi o polêmico estudo do Imperial College
London, divulgado em março, que prognosticou nada menos do que até meio milhão
de mortes no Reino Unido caso o governo do primeiro-ministro Boris Johnson não
abandonasse sua estratégia flexível de combate à pandemia. Pouco depois, o
principal responsável pela previsão, o epidemiologista Neil Ferguson, admitiu a
uma comissão do Parlamento britânico que novos dados o teriam induzido a
modificar os números originais do estudo — que ele acabou finalmente baixando
para menos de 20 mil mortes no Reino Unido.
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Fernandes explica a razão pela qual as terças-feiras têm apresentado um
pico em relação aos outros dias. “Os números de mortos do fim de semana e
também da segunda-feira ficam represados, acabam acumulando e elevam os números
da terça-feira”, diz.
No eixo horizontal, os dias indicam a terça-feira de cada
semana e mostram o pico de mortes. A linha vermelha do gráfico é a média
variável das semanas de epidemia. Neste caso, em que são consideradas as mortes
acumuladas no período e não as mortes ocorridas no dia, a curva indica uma
ascendente constante.
O atraso na divulgação dos dados de mortes no país gera
distorções que impactam as medidas de combate ao coronavírus. Para o médico
Juliano Fernandes de Lara, se um gráfico que representa o número de mortes diárias
mostra uma curva de tendência estável ou em queda, esse dado pode indicar que o
sistema de saúde está sob controle — portanto, medidas de flexibilização do
confinamento podem ser tomadas com mais segurança. Por outro lado, “se há
curvas irregulares apontando 700 mortes em um dia, 400 no outro e depois 300, é
difícil entender a lógica e a tendência da curva”, pondera. Segundo Fernandes,
a análise dos gráficos indica que o mês de maio foi muito mais de “consolidação
e saída da pandemia” do que de intensificação e piora do quadro no
país. Ou seja, desde que não haja uma segunda onda de contaminação no
Brasil, o pior já passou. [Amém. DEUS SEJA LOUVADO.]
Na Revista Oeste, MATÉRIA COMPLETA, incluindo gráficos