A resistência de Bolsonaro em assumir a coordenação e formar uma coalizão partidária pode ser o caminho para o fracasso
Há duas “moedas” legítimas: a nomeação de indicados pelos parlamentares para cargos e a liberação de emendas parlamentares. O presidente pode estabelecer critérios de reputação ilibada e de aptidão para o cargo e para aceitar a indicação. A liberação de emendas não implica aumento de gastos, mas mera antecipação do prazo de sua liberação, pois elas são de execução obrigatória pela Constituição.
Há “moedas” ilegais, que são as associadas à corrupção. Foi o que ocorreu no período petista com o mensalão (compra de lealdade dos parlamentares) e a franquia da Petrobras para abastecer de recursos os partidos políticos.
Bolsonaro sugere que negociação política equivale a corrupção, um sério equívoco. O presidente é o coordenador do jogo político em uma coalizão, mas ele sinaliza que já exerceu o seu papel, o de enviar a proposta. Caberia ao Congresso cumprir o seu, qual seja o de aprovar a reforma. Nesta segunda-feira, em Jerusalém, ele reiterou essa ideia ao afirmar que “a decisão (da Previdência) está com o parlamento”. Sem formar uma coalizão com partidos, que garanta uma base parlamentar majoritária, é muito difícil promover a coesão e a coordenação necessárias à decisão do Congresso. É muito arriscado deixar ao critério de cada um dos 513 deputados e 81 senadores votar de acordo com a visão de mundo de cada um.
Parte da eleição de Bolsonaro se deveu à promessa de que não repetiria o chamado “toma lá dá cá” de governos anteriores. Muitos acham que essa promessa veio em boa hora, imaginando que é assim que nasce a corrupção. Outros sustentam que os tempos mudaram e que o Congresso precisa assumir suas responsabilidades. Mesmo que tais ideias fossem corretas, seria temerário adotá-las em regimes multipartidários como o nosso.
O capital político do presidente e as condições de governabilidade dependem da reforma da Previdência, a qual também é crucial para assegurar a solvência do Tesouro e para confirmar as esperanças de restauração do crescimento sustentável da economia.
Os riscos de derrota na reforma aumentarão se o presidente mantiver o propósito de não assumir a liderança da negociação com o Congresso e de resistir a formar a coalizão que garanta uma base parlamentar coesa e comprometida com a aprovação da proposta.