Não basta ser realista e, logo, favorável ao modelo
de reforma da Previdência proposto. Não basta discursar. Não se for alguém com
meios para fazê-la prosperar
Todo candidato
a presidente deveria ser desafiado a responder: é a favor ou contra a reforma
da Previdência? Uma questão concreta, especificada ao máximo — a ser respondida
sem desvios: é a favor ou contra a reforma da Previdência conforme oferecida,
hoje, pelo governo? Isso
porque quem quer presidir o Brasil precisa ser provocado a pisar no mesmo chão
daquele ao qual pedirá voto, a se ajustar aos dados da existência objetiva, a
se posicionar sobre a proposta que é possível agora. Não é o projeto dos
sonhos, nem sequer é o original formulado pelo Executivo, mas um — negociado e
mitigado — que, ainda assim, uma vez aprovado, representará economia de R$ 480
bilhões em dez anos. Uma enormidade.
E aí?
Falo de realismo e sensatez. Quem pretende governar o fará somente sob as
condições que idealiza, ou aplicará o ideal às circunstâncias do tráfego
institucional e da atividade política? No caso em que a resposta não for a
opção autoritária, pergunta-se: por que a composição — a própria essência do
trânsito democrático — que serviria ao hipotético governante não pode ser
aceita para aquele que de fato governa? Falo de lógica e discernimento.
Sim, o
candidato Fulano pode ter uma proposta melhor. Espero mesmo que a tenha. Mas,
se a preparou, se a tem na conta de prioridade, é porque sabe que o sistema
previdenciário atual logo colapsará — e que é da ordem da responsabilidade
esgrimir com as armas disponíveis no presente. É a posição declarada de João
Amoêdo, do Partido Novo: crê que a transformação poderia ser maior, mas apoia o
que é ora factível. É isso mesmo: às vezes, muitas vezes, tudo o que se pode
fazer é um remendo (de R$ 480 bilhões!), e assim ganhar tempo — talvez cinco
anos — para criar as condições a uma intervenção estrutural sobre o problema.
Não há
muitas outras formas de avançar. Não numa República; não numa democracia
representativa. E certamente, neste debate, não há lugar para mistificação. Ou
melhor: Lula já tem espaço; já tomou esse território; já ocupa o latifúndio da
inconsequência. A ele — sujeito que não opera senão com o cálculo da
oportunidade eleitoral — não interessa que o projeto tenha como cerne o combate
à desigualdade, uma vez que enfrenta, sobretudo, os privilégios do
funcionalismo público, notadamente daquela porção que ganha mais, trabalha menos
e se aposenta cedo. Não importa. Ao ex-presidente, homem condenado pela
Justiça, a verdade tem de ser inconveniente — e então temos a pregação
mentirosa de que o governo golpista vai mais uma vez espoliar a classe
trabalhadora etc.
Lula
depende — historicamente — do “quanto pior, melhor”. Quererá mesmo o senador
Álvaro Dias (Podemos-PR) disputar esse terreno — o da empulhação — com o
petismo e suas linhas auxiliares? É o que parece. Ou haverá outra forma de
encaixar o comentário demagógico — que divulgou nas redes sociais — segundo o
qual a reforma não será a “salvação do Brasil” porque não geraria renda,
emprego e crescimento econômico? Votará contra, senador?
Não
basta, porém, ser realista e, logo, favorável ao modelo de reforma proposto.
Não basta discursar. Não se for alguém detentor de meios para fazê-la
prosperar. É preciso botar a mão na massa. Refiro-me a Geraldo Alckmin.
Pré-candidato tucano ao Planalto e recém-eleito presidente do PSDB, o
governador de São Paulo tem obrigação política de conduzir seu partido a que
feche questão pela reforma. Falo de antevisão e liderança.
Nada a ver com
coragem. Falo de uma obviedade. A modernização do sistema previdenciário é
bandeira histórica do PSDB. Falo também, pois, de coerência. Um postulante
tucano à Presidência que não seja capaz de unir o partido em prol de elemento
fundador de sua própria identidade não passará boa mensagem a que forças de
centro — ali onde se resolverá a eleição — agrupem-se por ele em 2018.
E Jair
Bolsonaro? É contra ou a favor? É com senso de urgência que a sociedade precisa
cobrar alguma resposta do candidato relativa a temas do mundo real. Sua posição
sobre a reforma previdenciária é especialmente significativa. Afinal, é
deputado federal — e, ao contrário de seus prováveis futuros adversários, o
único que terá de votar a matéria na Câmara.
E aí?
Teremos o
Bolsonaro real, o da prática estatista, provado e comprovado em seus votos
sempre contrários a qualquer mudança que possa afetar os interesses
corporativos que representa, aquele que quase sempre, como parlamentar, votou
junto com os petistas? Ou o da teoria, o recente, de laboratório, esse do
discurso pró-mercado, o que se acercou de economistas liberais e que tateia um
papo de redução do tamanho do Estado?
E aí? É
tempo de responsabilidade. Não cabem abstenções como “minha equipe trabalha num
projeto melhor, que apresentarei no ano que vem”. O país não pode esperar, e o
eleitor liberal seduzido por Bolsonaro quer saber: o deputado vai votar como?
Contra? E, nesse caso, usando o mesmo argumento do filhote, também deputado
federal, que chegou a negar a existência de déficit na Previdência?
Essa
resposta — a ser inscrita no painel da Câmara — é decisiva para que o
brasileiro saiba se Jair Bolsonaro venceu mesmo a paixão pelo privilégio de
classe, ou se está apenas, como creio, empilhando o lustro dos economistas
liberais como escada para ascender.
E aí,
deputado: como vota? Citará Ustra ou Mises na hora H?
Por: Carlos
Andreazza é editor de livros