Comissão aprova estatuto que define família como relação apenas entre homem e mulher
Projeto de lei que exclui laço homoafetivo da definição de família vai ao Senado se não for contestado por 51 deputados
Após cinco horas de debate, polêmica e bate-boca a comissão especial
da Câmara aprovou o Estatuto da Família, que conceitua família a partir
da união entre homem e mulher, excluindo as relações homoafetivas. O
placar foi de 17 votos a favor e 5 contrários. Parlamentares contrários a
esse conceito classificaram o relatório do deputado Diego Garcia
(PHS-PR), ligado a movimentos católicos, como retrógrado, intolerante e
que atropela a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu
relações entre homossexuais. Os deputados que votaram a favor, quase
todos ligados a setores religiosos, argumentaram que essa composição de
família é o defendido pela sociedade e dizem que o STF atropelou as
prerrogativas do Congresso Nacional.
O relator Diego Garcia é ligado ao Grupo Pró-Vida, da Igreja
Católica, e também da Renovação Carismática. Ele levou sua esposa e a
filha de três meses para o plenário da sessão. A votação do estatuto é
terminativo na comissão, mas, se algum parlamentar recolher assinaturas
de 51 colegas pode levar a votação ao plenário.
A deputada Erika Kokay (PT-DF), contra o texto, afirmou que o
estatuto rasga a Constituição e que o dia de hoje deve ser reconhecido
como o dia em que a Câmara "mergulhou nas trevas". — Quanto mais essa comissão caminha, mas tenho convicção de que está
sendo tramado um golpe no país. Temos que ter liberdade nas nossas
relações. Que lógica é essa que impede a relação de um com o outro. Esse
estatuto nasce morto. Será barrado no STF — disse Kokay.
O deputado Gilvado Carimbão (PROS-AL), ligado à Igreja Católica,
disse ser legítimo defender a união entre homem e mulher e que não se
trata de um golpe. Ele afirmou que essa foi uma de suas bandeiras na
campanha eleitoral. — Quando fui candidato fui para as portas das minhas bases. Disse que
a base da família é um homem e uma mulher. Não se trata de um golpe. A
sociedade é quem decidiu que família é assim. E a sociedade elege seus
representantes para defender aqui seus pensamentos — disse Carimbão.
Manifestantes de movimentos homossexuais compareceram à reunião e
levaram cartazes e bandeiras nas cores do arco-íris e protestaram contra
o texto. Um dos cartazes dizia: "Se nasceu mulher, coloca a burca; se
nasceu negro, coloca a algema; se nasceu LGBT, apedreja. Como pode tanto
retrocesso na casa do povo".
O deputado Takayama (PSC-PR) protagonizou as principais cenas de
bate-boca. Discutiu com os manifestantes e, antes, disse a deputada
Erika Kokay que ela não nasceu de uma relação de homem com homem nem de
mulher com mulher. — A senhora não vem de dois homens nem de duas mulheres. Homem com
homem não geram. Mulher com mulher não geram — disse Takayama.
O autor do projeto é o deputado Anderson Ferreira (PR-PE), que, na
reunião, sentou entre o presidente da comissão, Sóstenes Cavalcante
(PSD-RJ), e o relator Garcia. Ferreira coordenava a votação e convencia
deputados a abrirem mão da palavra para votar logo o texto. Se começasse
a ordem do dia no plenário da Casa, os trabalhos da comissão seriam
suspensos. Ferreira fez campanha eleitoral em cima desse tema e espalhou
outdoors como autor do Estatuto da Família no seu estado.
Somente os quatro parlamentares contrários ao texto - além de Erika
Kokay assim se posicionaram Glauber Braga (PSOL-RJ), Maria do Rosário
(PT-RS) e Bacelar (PTN-BA) - esgotavam seus prazos para discursar e
apresentar requerimentos de adiamento. Como eram minoria, tentavam
protelar ao máximo para evitar a votação. O deputado Bacelar (PTN-BA) também foi contrário ao estatuto. — Esse relatório é anacrônico. O conservadorismo brasileiro quer
regular a vida privada das pessoas. Quer se meter dentro das quatro
paredes dos indivíduos — disse Bacelar.
O deputado Flavinho (PSB-SP) defendeu o estatuto e disse que o texto protege as famílias brasileiras. — Somos achincalhados como obscurantistas e retrógrados. Fui eleito
pela minha base católica. O que não posso aceitar é a intervenção do
Estado marxista nas nossas famílias e induzir nossas crianças a uma
sexualidade precoce, como tentou fazer o Ministério da Educação — disse o
parlamentar, se referindo a uma iniciativa do governo que, segundo ele,
propõe ensinamento nas sobre sexualidade nas escolas.
Glauber Braga (PSOL-RJ) acusou uma manobra do presidente do Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para permitir que a sessão da comissão especial
durasse tanto tempo. Enquanto ocorria reunião no colegiado, Cunha
ocupou a presidência no plenário, começou a ler a resposta à questão da
oposição sobre rito do impeachment, mas não abriu a ordem do dia. Se o
fizesse, comissão especial teria que encerrar seus trabalhos e, assim,
não teria como votar o relatório. — Mais uma do 'manobrômetro' (artifícios de manobra) do senhor presidente da Câmara — disse Braga.
[deputada Kokay! espero que acorde e ao ouvir as palavras do nobre deputado Takayama, lembre-se das sábias palavras do Levy Félix: 'aparelho excretor não
reproduz'.]