Agressão em Roma mostra que o debate político adora ressuscitar os mortos: do comunismo aos políticos declarados inelegíveis
Mas, se aos poetas é possível levar ao verbo o inexprimível, aos iracundos é permitido apenas a aridez monótona, vulgar, cansativa e vexatória do xingamento. Dar a Alexandre de Moraes a alcunha de “comunista” mostra que o criador do apodo não leu sequer uma linha do autor que tanto odeia: Karl Marx.
São várias as manifestações dos que pretendem representar o partido da ordem. Luís Roberto Barroso, homem de boas leituras, permitiu-se a frase “Perdeu, mané” para depois achar normal ir a um convescote da UNE e se associar em um palanque à derrota do bolsonarismo.
Açular os órfãos de Jair Bolsonaro tornou-se tão enfadonho quanto o uso da palavra comunismo. Uma revive o fantasma do socialismo real, morto e enterrado nos escombros do Muro de Berlim; outra, o de Bolsonaro, fulminado pelo TSE.[detalhe: Bolsonaro não está morto, nem enterrado.]Moraes, no entanto, não deve se ver só como vítima de um episódio, que expõe o espírito do tempo. O ministro ofendido devia aproveitar a lição do destino de Sergio Moro. Nesse caso, não é preciso consultar o adivinho Tirésias para “perceber a cena e antever o resto”.
Moro viveu dias de Moraes na Lava Jato. E Moraes, viverá dias de Moro? [certamente que não; Moro trocou um cargo vitalício pelo mandato de senador da República - com possibilidade de voos mais altos; já Moraes, se deixar o seu cargo vitalício, e partir para uma candidatura ao Senado ou cargo próximo, jamais será eleito.] Se a Justiça é indissociável da gravitas, o sentimento de honra e dever, ela também o é da pietas, essa virtude cívica que Spinoza ligara em sua Ética à civilidade.
Marcelo Godoy - O Estado de S.Paulo