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quarta-feira, 22 de junho de 2016

O Rio e o mito do governo de eventos

A falência de um modo de administração irresponsável, espetaculoso e demófobo

O decreto que colocou o Rio de Janeiro num regime de calamidade é mais uma pirueta do estilo de administração que arruinou o estado. Havendo um problema, cria-se um evento. O problema era a falência, assinou-se um decreto, criou-se um evento, e transferiu-se o problema para Brasília. Lá, um governo fraco e fiscalmente combalido capitulou, concedendo uma moratória a estados administrados por perdulários.

O governo do Rio faliu pelo mais elementar dos motivos: gastou o que não tinha e pôs dinheiro onde não devia. O mesmo núcleo do PMDB controla o estado desde 2007. Não é um núcleo qualquer. Seus caciques são Sérgio Cabral, Luiz Fernando Pezão, Eduardo Cunha e Jorge Picciani. Uns, como Cabral e também o prefeito Eduardo Paes, são políticos com tino para o espetáculo. Outros, como Pezão, Cunha e Picciani, costuram por dentro.

A atividade espetacular cavalgou a Copa do Mundo, reformou o Maracanã e deu à cidade uma eventual sensação de segurança com a criação das Unidades de Polícia Pacificadora e a ocupação militar de comunidades. A Copa foi-se embora, o Maracanã transformou-se num escandaloso elefante branco e as UPPs adernaram por falta de ações sociais complementares e excesso de corrupção policial. Sobrou o teleférico do Complexo do Alemão, onde a diretora do Fundo Monetário Internacional sentiu-se nos Alpes. A madame ecoava a cultura cosmopolita do governador Cabral no restaurante Louis XV do Hôtel de Paris, em Mônaco: “Este é o melhor Alain Ducasse do mundo”. (Referia-se ao chef da casa.)

Quando um governo vive de eventos, uma crise jamais começa com a paralisação de alguma grande obra ou de um projeto da vitrine. A conta vai sempre para os serviços básicos oferecidos ao andar de baixo. A falência do Rio foi exposta no final de 2015 com o colapso da rede de saúde pública. Havia fornecedores que não recebiam há meses. Na ocasião, o governador Luiz Fernando Pezão ensinou: “O estado não fabrica recursos”. Consome-os, mas deixa pra lá.

A aula de economia de Pezão passou longe da prática da gestão pública. Na hora de suspender serviços para a população, a matemática funciona, mas quando se trata de gastar dinheiro para sustentar a máquina, a administração pública brasileira contorna uma lei da física, segundo o qual dois corpos não podem ocupar, ao mesmo tempo, o mesmo espaço. 

Um servidor pode ocupar, ao mesmo tempo, duas folhas de pagamento, trabalhando num só lugar. A repórter Carina Bacelar mostrou que no Rio os secretários Christino Áureo, da Agricultura; Wagner Victer, de Educação; e Júlio Bueno, da Fazenda, acumulam seus vencimentos com os salários de funcionários do Banco do Brasil ou da Petrobras.  

Victer acumula salários desde 1999. Bueno, o homem das contas, recebe R$ 16.579 como secretário, e os contribuintes do Rio pagam R$ 49 mil à Petrobras pela cessão de seus serviços. Tudo de acordo com a lei, sempre superando os tetos constitucionais. 

O próximo evento desse estilo espetacular de administração será a Olimpíada. Como explicou o secretário Moreira Franco, ex-governador do Rio e fundador do PMDB, “não podemos pagar um mico internacional”. Disse isso no dia em que o governo pagou um orangotango nacional.


Fonte: Elio Gaspari,  jornalista - O Globo


terça-feira, 14 de junho de 2016

O roteiro de realeza de Eduardo Cunha na Europa



Segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República, parte da propina recebida no petrolão foi usada para cobrir os gastos de luxo do peemedebista e da família
Do alto do morro de Adlisberg, a vista da cidade de Zurique e dos Alpes é de cartão-postal. No local, impera o Grand Hotel Dolder desde 1899, decorado com obras de Salvador Dalí e Andy Warhol. Além de ter sido cenário do filme "Os homens que não amavam as mulheres", de David Fincher, o hotel já hospedou Henry Kissinger, Winston Churchill, Luciano Pavarotti, Hillary e Bill Clinton, o príncipe William, e o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Além do hotel suíço, o peemedebista descansou em vários outros hotéis de luxo da Europa.

Parte das despesas dos passeios pelo velho continente foi paga com propina do esquema de corrupção da Petrobras, segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República acatada pela Justiça Federal contra a mulher do deputado, a jornalista Cláudia Cruz. A PGR sustenta que ela usou recursos ilícitos para cobrir gastos com luxos comprados no exterior, incluindo as hospedagens.

No dia 12 de fevereiro de 2013, por exemplo, a conta do casal alvo da Lava Jato foi de 1.043,40 dólares no Dolder. O casal usou o cartão Corner Card. O dinheiro de desvios na estatal teria sido transferido para a conta Kopek, em Genebra, que está no nome de Cláudia Cruz. No dia seguinte à estadia no Dolder, Cunha foi para outro hotel de Zurique, o Baur au Lac, com uma conta maior: 3.600 dólares. O local, dois anos depois, seria o mesmo palco da operação policial conduzida pelos suíços que terminou com a prisão de outro brasileiro acusado por corrupção: José Maria Marin, o ex-presidente da CBF.

Outro sinônimo de sofisticação foi desfrutado por Cunha já no mês seguinte, só que na Espanha. O W. Barcelona já recebeu nobres do Oriente Médio, como o Rei Abdala II da Jordânia e a rainha Rania. No dia 25 de março, sua conta no local chegou a 3.500 dólares. No mesmo mês do ano seguinte, a família Cunha pagou 4.900 dólares para se hospedar em um dos hotéis mais caros da Itália, o Danieli, em Veneza. No Four Seasons, em Florença, Cunha deixou 2.700 mil dólares. No Raphael, em Roma, a conta ficou mais barata, 1.900 dólares, no dia 3 de março de 2014.

Paris também foi bem explorada pelo casal Cunha. Em fevereiro de 2015, no auge da Lava Jato, Cunha, Cláudia e sua filha escolheram o Plaza Athénée, um palácio francês frequentado pelas maiores afortunados do mundo. A família pagou a fatura no dia 19 de 15.880,26 dólares. No restaurante do hotel, uma refeição pode chegar a 390 dólares. Cinco dias antes, a rotina gastronômica havia começado no Guy Savoy, um restaurante à beira do Rio Sena, com três estrelas no Guia Michelin. Valor: 1.357,24 dólares.

No dia seguinte, a família resolveu pagar menos. Em 15 de fevereiro, o gasto foi de 965,69 dólares no Les Tablettes - Jean-Louis Nomicos, de só uma estrela no Michelin, situado no 16.º Distrito de Paris, um dos mais elitistas da capital. Na véspera de partir, no dia 18, o trio voltou a escolher um três estrelas, o Le Grand Véfour, ao preço de 1.177,76 dólares.
Entre almoços e jantares, Cláudia e a filha conseguiram encaixar compras em lojas de luxo. Na Louis Vuitton, deixaram 1.482,11 dólares. Na Ermenegildo Zegna, 8.111,79 dólares. Na Chanel, 2.879,51 dólares. Na Charvet Place Vendôme, 6.537,77 dólares. Na Hermès, 1.676,65 dólares. E na Balenciaga, 960,58 dólares.

Já em Cascais, em Portugal, Cunha soube o que é dormir em um palácio real, tal como diz o slogan do Grande Real Villa Hotel, em 22 de fevereiro de 2015. No local, gastou 2.900 dólares.

Fonte: Revista VEJA

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Uma aula da fantasia oligárquica

O teleférico do Alemão seria um retrato do futuro, mas tornou-se uma amostra das conexões do andar de cima

Num ridículo episódio de caipirice cosmopolita, ao passear no teleférico do Complexo do Alemão, Christine Lagarde, diretora do Fundo Monetário Internacional, disse que estava se sentido “numa estação de esqui” dos Alpes. A doutora achou que viajara ao futuro, mas estivera a bordo das maquinações do passado e das empulhações do presente. Em breve, o teleférico será operado pela empresa de Tiago Cedraz, filho do presidente do Tribunal de Contas da União, o veterinário e ex-deputado Arnaldo Cedraz.

A obra custou R$ 253 milhões e foi inaugurada duas vezes (em 2010 e 2011) sem que o serviço estivesse em plena operação. Funcionando, ele reduz para 19 minutos uma caminhada que pode durar até duas horas. Quando madame Lagarde esteve nos Alpes cariocas, o governo do Rio já começara a atrasar os repasses para a manutenção do serviço, e a concessionária se desinteressara pela renovação do contrato, dispensando alguns funcionários. O colapso financeiro do Rio já havia começado.

No mundo da fantasia, dera tudo certo no andar de cima. As empreiteiras Odebrecht, OAS e Delta orgulhavam-se da obra. A Delta foi apanhada nas traficâncias do bicheiro Carlinhos Cachoeira e foi declarada inidônea pela Controladoria-Geral da União. A OAS, apanhada na Lava-Jato, está em recuperação judicial. A empresa Supervia, filhote da Odebrecht, ficou com a exploração do serviço.

À época, Lula, Dilma, Sérgio Cabral e Pezão saciaram-se na publicidade. Sobrou um teléferico para ser operado. Essa, a parte que exige trabalho e não rende propaganda, tomou outro curso, o dos serviços públicos para o andar de baixo. Às vezes o teleférico funcionava num horário proibitivo para quem precisava pegar no batente de manhã cedo.

A SuperVia desistiu da operação e devolveu a maravilha à Viúva. O repórter Ítalo Nogueira revelou que o governo do Rio concluiu a licitação para escolher a nova operadora do teleférico do Alemão. Venceu-a uma empresa do advogado Tiago Cedraz, criada em abril passado. Sem licitação, a prefeitura do Rio já entregara a Cedraz a operação de outro teleférico, menor, no Morro da Providência.

Ricardo Pessoa, um dos empreiteiros presos pela Lava-Jato, contou ao Ministério Público que deu R$ 1 milhão a Tiago para ajudar na liberação de um contrato de R$ 2 bilhões para obras da usina nuclear de Angra 3. Pessoa pagava também R$ 50 mil mensais ao escritório do advogado para cuidar de seus pleitos. Ele confirma ter trabalhado para a UTC, mas nega ter tocado em propinas.

Tiago Cedraz tem 33 anos e diplomou-se em 2006. Entre 2009 e 2013, formou um patrimônio imobiliário avaliado em R$ 13 milhões, mais um jatinho Cessna de dez lugares. Teve um conversível vermelho, mas seu pai fez com que o devolvesse. Vive em Brasília, e seu escritório acompanha 35 mil processos. Em 182 atuou no Tribunal de Contas. Em julho, a Polícia Federal visitou-o, cumprindo um mandado de busca e apreensão. Cedraz informa que criou a empresa Providência Teleféricos “quando surgiu a oportunidade de participar das concorrências”.

Quando madame Lagarde for esquiar nos Alpes, poderá perguntar se há por lá algum teleférico que tenha passado por tantas peripécias, com personagens tão pitorescos.

Fonte: Elio Gaspari, jornalista - O Globo