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terça-feira, 25 de maio de 2021

Senadores buscam palanque eleitoral, mas isso pode ser ruim para eles - VOZES

CPI da Pandemia

A discussão sobre o voto auditável é uma preocupação.  
O objetivo é que o eleitor possa conferir, por meio de um comprovante, o voto que foi depositado na urna eletrônica caso haja dúvidas. Mas, também é preciso se atentar a uma segunda etapa, tão importante quanto a primeira: a apuração dos votos.


Eu lembro que a Corte alemã decidiu que não poderia existir uma contagem digital no país porque a apuração precisava ser pública. Nessa mesma decisão foi enfatizado que a contagem de votos precisa ser transparente e acessível a qualquer cidadão e não hermética e acessível apenas aos iniciados no mundo digital.

Como a apuração não é um hábito jurídico, e sim administrativo do estado brasileiro, ela se enquadra nas exigências constitucionais que falam sobre publicidade e transparência. Essa etapa precisa ser exposta. Ao pensar sobre isso, o sistema eleitoral se torna mais aberto, transparente e confiável. E isso precisa se estender além do voto e chegar a etapa de apuração. Afinal um voto pode ser decisivo em uma eleição. Todos sempre são. Se você vota em alguém que ganha a eleição, o seu voto fez isso e os outros foram sobras, não é verdade?

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Quando o palanque não é necessariamente bom
A CPI da Covid poderia ser uma comissão sigilosa e a portas fechadas - apesar de não ter razão de ser. Mas, na verdade, se não fosse tão exposta, ela nem existiria, porque o objetivo principal disso tudo é o palanque eleitoral. Mas esse palanque não é necessariamente bom, porque está expondo senadores.

Nesse final de semana eu conversei com pessoas que acompanharam os trabalhos da CPI e verificaram que Ernesto Araújo e o general Pazuello foram muito superiores em argumentação e raciocínio do que muitos senadores. As diferenças de sinapses e neurônios foram abismais. Eu fiquei pensando que alguns senadores tinham problemas mentais. Essa exposição está sendo ruim para eles. Esses parlamentares estão se tornando mais conhecidos, porém a consequência não está sendo tão boa assim. Talvez eles não tenham pensado nisso na emoção do momento. A emoção estraga tudo mesmo.

O general Pazuello e Ernesto Araújo foram modelos de racionalização e cabeça fria. Ambos responderam com todos os dados que tinham. Ao passo que alguns senadores não tiveram essa inteligência emocional. O que vimos me deixou preocupado com as condições de raciocínio e lógica deles.

Criminalização da prescrição médica?
O senador, presidente da CPI, me deixou muito preocupado - inclusive pessoalmente. Ele disse que pretende elaborar um projeto de lei para criminalizar o ato médico de prescrever medicamentos para doenças às quais não haja comprovação científica. Eu particularmente não sei o que é isso.

Eu fiquei assustado porque meu cardiologista pode ser preso e eu também, mas como cúmplice. Afinal ele me prescreve há tempos uma vitamina para manter a flexibilização e o funcionamento da minha válvula cardíaca. Embora seja experimental e não tenha comprovação científica de que funciona, esse medicamento está resolvendo meu problema e tem bons resultados.

Isso acontece com centenas de tratamentos. Médicos prescrevem remédios experimentais a pacientes antes dele ser publicado em revistas e ser comercializado em massa. É assim que funciona a ciência, é preciso experimentar e descobrir o que dá certo. É testando que a ciência descobre remédios e amplia a aplicação de certos medicamentos.

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Cabeça fria, apesar das chamas

O caminho é mostrar a importância da floresta em pé, pelos serviços ambientais e pela riqueza da biodiversidade

Estou na Amazônia para mais uma viagem de aprendizado na região. Ela é vastíssima, e minha capacidade de aprender é lenta e sinuosa. A floresta tem cem mil espécies animais, 43 mil vegetais. As queimadas devem arder até outubro, a julgar pela experiência dos últimos anos. Os ânimos parecem ter se acalmado. Angela Merkel deu o tom no G7 ao afirmar que é preciso fazer alguma coisa, sem dar a impressão de ser contra Bolsonaro. Não se trata de um exercício de psicologia individual. Merkel é uma estadista, tem objetivos maiores, lida com pessoas complicadas como Trump. Percebeu talvez que Trump e Bolsonaro são frutos de uma época e que não podem ser tratados com os mesmos critérios do passado.
Bolsonaro anunciou que apresentaria uma política para a Amazônia. Mas, até o momento, afirmou apenas, em reunião com governadores, que era preciso explorar as terras indígenas. Essa história de Bolsonaro com os índios brasileiros esbarra na Constituição. Para avançar sobre a superfície, precisa de emenda constitucional, e para avançar no subsolo indígena é necessária uma lei complementar, que Romero Jucá não conseguiu aprovar ao longo desses anos. [dificil, mas, possível; conseguindo aprovar uma emenda constitucional, uma lei complementar é bem mais fácil.
Agora alguém por favor explique:
- qual a razão das sumidades que elaboraram a CF 88 - a 'cidadã', cheia de direitos sem a contrapartida de deveres e o presidiário Lula era uma das sumidades - estabelecer imensas áreas territoriais como reservas indígenas? ; dificultar o uso do subsolo pela União Federal? Um dos objetivos é bem claro - transformar o indígena no maior latifundiário do Brasil.
O outro é velado, mas, a localização das reservas facilita em muito (talvez em um futuro próximo - para tanto basta o Brasil descuidar da proteção de seu território, da manutenção da SOBERANIA NACIONAL sobre aquelas áreas) uma ocupação indevida.]
Algumas repercussões negativas ainda estão no horizonte: fundos suecos planejam deixar de investir no Brasil, compradores de couro, como a Timberland, [eles podem comprar couros feitos em laboratório;
ou inventar um plástico, feito com o petróleo que a Noruega extrai no Ártico, que substitua o couro - com a vantagem de levar mais tempo para se degradar.] querem se fechar para a nossa produção. Importante lembrar que boicotes e sanções contra governos —pelo menos é a impressão que tenho ao longo dos anos que acompanhei — atingem as pessoas comuns e acabam fortalecendo os próprios governos visados.

As pessoas vivem grandes paixões políticas. O único caminho é mostrar a importância da floresta em pé, pelos seus serviços ambientais e pela riqueza de sua biodiversidade. Nada contra ninguém, é apenas prioritário divulgar o conhecimento científico sobre a floresta, os serviços ambientais que presta na regulação do clima, na segurança hidrológica, na captura do carbono. No meio da semana, visitei o mercado Ver-o-Peso. É impressionante como convergem para ele os diferentes produtos amazônicos. Há 80 barracas de ervas medicinais e perfumes. Essas propriedades não são ainda comprovadas cientificamente. Mas a verdade é que a floresta e a sabedoria tradicional encontram um caminho suplementar para atenuar sofrimento e oferecer cuidados que nem o SUS pode oferecer.
O Itamaraty seguiu um novo rumo ao cobrar, no contexto do Acordo de Paris, o pagamento pela captura do carbono, já previsto. É muito melhor que pedir ajuda em horas difíceis. Não que a ajuda deva ser rejeitada. Mas, pensando bem nas dimensões do problema, 20 milhões de euros é o preço de dois apartamentos de luxo em Paris. O importante é buscar os caminhos previstos no acordo. O governo Bolsonaro acha que o aquecimento global é uma invenção do globalismo marxista. É um pouco contraditório apoiar-se num acordo internacional de redução de emissões, considerando-a uma tarefa desnecessária.
Mas Bolsonaro decidiu continuar no Acordo de Paris. Por que não buscar também os benefícios que oferece? Um pouco de incoerência não faz mal a ninguém. Trump também não acredita no aquecimento global. Mas quer comprar a Groenlândia porque a região se tornará mais explorável com a temperatura em ascensão. Existe hoje uma hostilidade populista às descobertas da ciência. No entanto, o caminho do conhecimento e da informação é essencial. Mesmo porque a maioria dos corações já deseja a floresta em pé. As manifestações no mundo inteiro demonstram isso. Mas revelam ainda pouca informação.
Os políticos brasileiros viajam muito para o exterior. Mas muito pouco para a Amazônia. A própria imprensa internacional é muito centrada em conflitos e pouco em universos ainda desconhecidos.A sociedade brasileira está diante de um desafio. Certas escolhas, como já mostrou em livro Jared Diamond, podem selar o êxito ou o fracasso de um país. A ideia básica é desenvolver a Amazônia de forma sustentável e inclusiva. O fato de não termos ainda conseguido esse objetivo não pode significar que é um erro. Na verdade, isto está expresso em todos os planos regionais que o país destinou à Amazônia.
Fernando Gabeira - Publicado em O  Globo