O caminho é mostrar a importância da floresta em pé, pelos serviços ambientais e pela riqueza da biodiversidade
Estou na Amazônia para mais uma viagem de aprendizado na região. Ela é
vastíssima, e minha capacidade de aprender é lenta e sinuosa. A floresta
tem cem mil espécies animais, 43 mil vegetais. As queimadas devem arder
até outubro, a julgar pela experiência dos últimos anos. Os ânimos parecem ter se acalmado. Angela Merkel deu o tom no G7 ao
afirmar que é preciso fazer alguma coisa, sem dar a impressão de ser
contra Bolsonaro. Não se trata de um exercício de psicologia individual. Merkel é uma
estadista, tem objetivos maiores, lida com pessoas complicadas como
Trump. Percebeu talvez que Trump e Bolsonaro são frutos de uma época e
que não podem ser tratados com os mesmos critérios do passado.
Bolsonaro anunciou que apresentaria uma política para a Amazônia. Mas,
até o momento, afirmou apenas, em reunião com governadores, que era
preciso explorar as terras indígenas. Essa história de Bolsonaro com os índios brasileiros esbarra na
Constituição. Para avançar sobre a superfície, precisa de emenda
constitucional, e para avançar no subsolo indígena é necessária uma lei
complementar, que Romero Jucá não conseguiu aprovar ao longo desses
anos. [dificil, mas, possível; conseguindo aprovar uma emenda constitucional, uma lei complementar é bem mais fácil.
Agora alguém por favor explique:
- qual a razão das sumidades que elaboraram a CF 88 - a 'cidadã', cheia de direitos sem a contrapartida de deveres e o presidiário Lula era uma das sumidades - estabelecer imensas áreas territoriais como reservas indígenas? ; dificultar o uso do subsolo pela União Federal? Um dos objetivos é bem claro - transformar o indígena no maior latifundiário do Brasil.
O outro é velado, mas, a localização das reservas facilita em muito (talvez em um futuro próximo - para tanto basta o Brasil descuidar da proteção de seu território, da manutenção da SOBERANIA NACIONAL sobre aquelas áreas) uma ocupação indevida.]
Algumas repercussões negativas ainda estão no horizonte: fundos suecos
planejam deixar de investir no Brasil, compradores de couro, como a
Timberland, [eles podem comprar couros feitos em laboratório;
ou inventar um plástico, feito com o petróleo que a Noruega extrai no Ártico, que substitua o couro - com a vantagem de levar mais tempo para se degradar.] querem se fechar para a nossa produção. Importante lembrar que boicotes e sanções contra governos —pelo menos é a
impressão que tenho ao longo dos anos que acompanhei — atingem as
pessoas comuns e acabam fortalecendo os próprios governos visados.
As pessoas vivem grandes paixões políticas. O único caminho é mostrar a
importância da floresta em pé, pelos seus serviços ambientais e pela
riqueza de sua biodiversidade. Nada contra ninguém, é apenas prioritário
divulgar o conhecimento científico sobre a floresta, os serviços
ambientais que presta na regulação do clima, na segurança hidrológica,
na captura do carbono. No meio da semana, visitei o mercado Ver-o-Peso. É impressionante como
convergem para ele os diferentes produtos amazônicos. Há 80 barracas de
ervas medicinais e perfumes. Essas propriedades não são ainda
comprovadas cientificamente. Mas a verdade é que a floresta e a
sabedoria tradicional encontram um caminho suplementar para atenuar
sofrimento e oferecer cuidados que nem o SUS pode oferecer.
O Itamaraty seguiu um novo rumo ao cobrar, no contexto do Acordo de
Paris, o pagamento pela captura do carbono, já previsto. É muito melhor
que pedir ajuda em horas difíceis. Não que a ajuda deva ser rejeitada.
Mas, pensando bem nas dimensões do problema, 20 milhões de euros é o
preço de dois apartamentos de luxo em Paris. O importante é buscar os caminhos previstos no acordo. O governo
Bolsonaro acha que o aquecimento global é uma invenção do globalismo
marxista. É um pouco contraditório apoiar-se num acordo internacional de
redução de emissões, considerando-a uma tarefa desnecessária.
Mas Bolsonaro decidiu continuar no Acordo de Paris. Por que não buscar
também os benefícios que oferece? Um pouco de incoerência não faz mal a
ninguém. Trump também não acredita no aquecimento global. Mas quer
comprar a Groenlândia porque a região se tornará mais explorável com a
temperatura em ascensão. Existe hoje uma hostilidade populista às descobertas da ciência. No
entanto, o caminho do conhecimento e da informação é essencial. Mesmo
porque a maioria dos corações já deseja a floresta em pé. As
manifestações no mundo inteiro demonstram isso. Mas revelam ainda pouca
informação.
Os políticos brasileiros viajam muito para o exterior. Mas muito pouco
para a Amazônia. A própria imprensa internacional é muito centrada em
conflitos e pouco em universos ainda desconhecidos.A sociedade brasileira está diante de um desafio. Certas escolhas, como
já mostrou em livro Jared Diamond, podem selar o êxito ou o fracasso de
um país. A ideia básica é desenvolver a Amazônia de forma sustentável e
inclusiva. O fato de não termos ainda conseguido esse objetivo não pode
significar que é um erro. Na verdade, isto está expresso em todos os planos regionais que o país destinou à Amazônia.
Fernando Gabeira - Publicado em O Globo
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