Não! O
presidente da República não é obrigado a indicar para a Procuradoria Geral da
República um nome da lista tríplice, saída da eleição promovida pela ANPR
(Associação Nacional dos Procuradores da República), entidade de caráter sindical.
Essa foi uma das jabuticabas inventadas pelo PT, de que o partido deveria se
envergonhar e se arrepender. Mas não fez nem uma coisa nem outra. Sei lá se
Bolsonaro indicaria alguém melhor ou pior do que o trio. O fato é que a eleição
é ilegal e, de fato, absurda.
O Artigo
84 da Constituição dispõe que indicar o procurador-geral é prerrogativa do
presidente da República (Inciso XIV). Nada diz sobre eleição. O Artigo 128
define que o Ministério Público abrange "I – o Ministério Público da União
e II – os Ministérios Públicos dos Estados". O Ministério Público da
União, por sua vez, compreende: "a) Ministério Público Federal; b)
Ministério Público do Trabalho; c) Ministério Público Militar; d) Ministério
Público do Distrito Federal e Territórios".
O
Parágrafo 1º deste Artigo 128 é claríssimo: "O Ministério Público da União
tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da
República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após
a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal,
para mandato de dois anos, permitida a recondução." Fim de papo! Em nenhum
lugar está escrito, como se pode notar, que o Procurador-Geral da República tem
de ser um membro do Ministério Público Federal, que é apenas um dos entes que
compõem o Ministério Público da União.
Ocorre que há uma Lei Complementar que
tem de entrar na conversa: LEI COMPLEMENTAR 75
Sérgio Moro, ministro da Justiça, quer emplacar o
nome de Deltan Dallagnol para a Procuradoria-Geral da República. Se Bolsonaro
for doido, faz isso e entrega a chave do país a seu subordinado. Na hipótese de
o coordenador da Lava Jato sobreviver politicamente a uma disputa, será que ele
pode ser procurador-geral?
A Lei Complementar 75 disciplina a organização do
Ministério Público da União.
O Artigo 67 define que cabe privativamente a
subprocuradores-gerais da República, cargo mais alto do Ministério Público
Federal, as funções de "I – Vice-Procurador-Geral da República; II –
Vice-Procurador-Geral Eleitoral; III – Corregedor-Geral do Ministério Público Federal;
IV – Procurador Federal dos Direitos do Cidadão; V – Coordenador de Câmara de
Coordenação e Revisão." Notaram? O vice do procurador-geral, que por este
é escolhido, tem de ser um subprocurador-geral da República, coisa que
Dallagnol não é.
Nomear um procurador de primeira instância, que não tem
competência para atuar junto a tribunais superiores, como procurador-geral
seria uma excrescência. É só em processos eleitorais que capitão se subordina a
general. Desde que todos sejam reformados, claro! Assim, ainda que a escolha do
procurador-geral da República ficasse restrita ao Ministério Público Federal —
a Lei Complementar 75 não trata do assunto —, não faz sentido botar o menor
para chefiar o maior. De todo modo, essa restrição, como resta evidente, não
existe. A coisa tem lá a sua graça. O MPF, por intermédio da Lava Jato — e não
de Olavo de Carvalho ou de Carlucho — foi fundamental na eleição de Jair Bolsonaro
à medida que devastou a chamada classe política. E agora corre o risco de ver
cassado um privilégio corporativo. [com o pedido de escusas ao ilustre articulista e proprietário do Blog, faço dois registros que, entendo necessário:
- em processos eleitorais, ainda que com militares participando, não há hierarquia militar, visto que a participação em processo eleitoral exige a filiação a um partido político, o que é vedado ao militar em serviço ativo, e estando fora do serviço ativo, devido a filiação a um partido político, a hierarquia não prevalece;
- se tratando de uma indicação que fica ao exclusivo arbítrio do presidente da República, desde que recaia sobre integrante da carreira, nada impede que o indicado seja, dentro da carreira, hierarquicamente inferior aos subordinados, visto se tratar de um cargo de confiança do presidente da República, com a ressalva que não pode ser demitido 'ad nutum'.
Seria interessante que Bolsonaro indicasse um membro do Ministério Público Militar - MPM, apesar de não se tratar de um militar, o fato de integrar o MPM já deixaria a turma anti Bolsonaro, adeptos do 'quanto pior, melhor', bastante agitada.]
O que eu penso? Como sempre, digo: que se cumpra a Constituição.
Bolsonaro não tem de se subordinar a lista nenhuma. Encerro com uma pergunta a
Bolsonaro: ele afirma que vai escolher alguém que respeite o Artigo 53 da
Constituição, justamente aquele que julga ter sido agredido no seu caso —
embora isso seja falso. Diga, presidente: o senhor também faria a mesma
exigência sobre o Inciso LVII do Artigo 5º? A saber: "Ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória". Se não entendeu: cumprindo-se a Constituição nesse caso,
Lula não poderia estar preso. Ou o senhor só aprecia a parte da Carta que julga
beneficiá-lo?