O
suborno de US$ 30 milhões que o agente da Mitsui e Samsung diz que pagou ao
deputado Cunha revela a
submissão da Petrobras a múltiplas perversões na era Gabrielli-Lula
Uns
poucos passos sobre o piso de isopor em argamassa de concreto armado separavam os escritórios do presidente e dos diretores no 23º
andar da sede da empresa estatal.
Era,
literalmente, impossível a um estranho manter-se
invisível numa rotina de visitas àquele ambiente. No entanto, isso
parece ter acontecido na Petrobras na gestão de José Sérgio Gabrielli. Fernando Soares
Falcão, o Baiano, por cinco anos frequentou uma sala ao lado, da Diretoria
Internacional, para tratar de contratos nos quais, oficialmente, nunca
representou as empresas envolvidas — apenas cultivava interesses obscuros de
líderes do PMDB.
Ninguém o viu, soube quem era ou
o que fazia por ali, segundo
depoimentos em juízo de Gabrielli e outros graduados da estatal. Registros da
portaria, no térreo, indicam que Baiano
fez 72 visitas ao diretor Nestor Cerveró, entre fevereiro de 2004 e janeiro
de 2008, antes, durante e depois de a Petrobras
gastar US$ 1,2 bilhão na contratação de dois navios-sonda.
Na
quinta-feira 14 de setembro de 2006, por exemplo, ele chegou à diretoria antes do meio-dia e saiu à noite, oito horas
depois. Baiano, Cerveró e o
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), receberam US$ 30 milhões em suborno para garantir que a Petrobras contratasse os navios sonda
Petrobras 10000 e Vitória 10000 com a Samsung (Coreia do Sul) e a Mitsui (Japão), conforme documentou em juízo o
representante desses grupos no Brasil, Julio Camargo.
Semana
passada o deputado Cunha foi denunciado ao Supremo por
corrupção e lavagem de dinheiro, junto com a deputada Solange Almeida
(PMDB-RJ), sua auxiliar na cobrança de propinas em atraso. É um caso simbólico
da submissão da Petrobras durante a era
Gabrielli, no governo Lula, a
múltiplas formas de perversão política e administrativa.
A documentação
informa que o diretor Cerveró passou 14 meses ao lado do presidente da
companhia negociando a encomenda do primeiro navio-sonda (Petrobras 10000) no valor de US$ 586 milhões. E, só depois desse tempo, é que a
diretoria executiva soube do negócio, autorizou tratativas e assinou o
contrato.
As duas
sondas foram encomendadas por US$ 1,2
bilhão sem licitação ou simples cotação de preços, procedimento rudimentar. A proposta dos fornecedores foi aceita, sem
questionamentos. As sondas saíram do mesmo projeto, mas o segundo navio custou 12,7% mais caro (US$
661milhões) que o primeiro.
Os
contratos foram feitos sem locais de operação definidos. Também não havia
estudo geológico adequado. Os poços em
Angola, por exemplo, resultaram “secos”. Um navio (Vitória 10000) precisou ficar estacionado
em porto na África do Sul durante um semestre, depois de pronto, simplesmente porque não se sabia o que
fazer com ele. Estão presos 60%
dos diretores da Petrobras da era Gabrielli, no governo Lula. Três foram condenados. A empresa
tem o Estado como acionista principal e, sabe-se, seu caixa era usado para pagar subornos a
políticos e partidos aliados do governo.
Como
ninguém sabe, ninguém viu nada durante
uma década no 23º andar do “Edise”, o
edifício-sede no jargão dos funcionários, a conclusão possível é a de que havia
uma grande rede de cumplicidade no topo da estrutura projetada no final
dos anos 60 por uma equipe de jovens arquitetos do Paraná.
Fonte: José Casado – O
Globo