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domingo, 22 de julho de 2018

Prenda-me se for capaz: 17 investigados na Lava-Jato estão foragidos


Empresários e doleiros sumiram de cena e provocaram até crise diplomática


Um pequeno grupo de empresários e doleiros lançou um desafio à força-tarefa da Operação Calicute (versão da Lava-Jato no Rio): prenda-me se for capaz. São 17 investigados que desapareceram de cena, passando à condição de foragidos desde que o juiz Marcelo Bretas, titular da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, assinou os seus pedidos de prisão.  Da relação, só há certeza sobre o paradeiro de três deles: Arthur Soares, o Rei Arthur, empresário que o governo americano reconheceu estar em seu território, e Felipe Paiva e José Carlos Lavouras, ambos refugiados em Portugal por terem cidadania lusitana. Paiva e Lavouras, inclusive, são pivôs de uma crise entre as autoridades brasileiras e portuguesas porque, até o momento, o país europeu não tomou providências contra eles com base nas provas remetidas pela força-tarefa.

No esforço de levar o grupo para trás das grades, a Lava-Jato incluiu os 17 nomes na difusão vermelha da Interpol (alerta internacional para fins de extradição) e busca acordos de cooperação internacional. Os casos mais frustrantes são justamente os que envolvem foragidos com paradeiro conhecido, mas que seguem a vida sem incômodos. Os procuradores da República no Rio cobram dos colegas portugueses o cumprimento da Convenção de Palermo (IT) sobre o crime organizado transnacional, que estabelece como dever dos estados colaborar amplamente, em especial sobre extradições, ou, não sendo possível, a deflagração da investigação no país onde a pessoa está refugiada.

Com cidadania portuguesa, José Carlos Lavouras estava no país europeu quando a operação aconteceu. Foi preso pela Interpol, mas solto pela Justiça local sob o compromisso de se apresentar diariamente. Lavouras, empresário do setor de transportes, e Paiva, dono de um badalado restaurante carioca, dividem com Rei Arthur, o empreiteiro que fez fortuna no governo Cabral, e o doleiro Dario Messer, apontado como o “doleiro dos doleiros”, a condição de nomes mais expressivos da lista de foragidos. Outro personagem que chama a atenção é o doleiro Chaaya Moghrabi, o Monza, ex-funcionário do Banco Safra delatado pelo doleiro-colaborador Cláudio Barbosa, o Tony, que, em parceria com Vinícius Claret, o Juca Bala, lavava do Uruguai o dinheiro de Cabral.

O APELIDO MONZA
A investigação, sustentada por provas fornecidas pelo colaborador, já demonstrou que Moghrabi é o campeão da movimentação de dólares no sistema de contabilidade paralelo gerenciado por Juca e Tony. Pelos dados apreendidos pelo Ministério Público Federal (MPF), estão atribuídos a seu nome cerca de US$ 240 milhões. No sistema, Moghrabi é apelidado pelos doleiros de Monza porque, em 1997, envolveu-se numa operação suspeita de compra de um carro desse modelo do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta.

No caso de Arthur Soares, dono da Facility e amigo de Cabral, as autoridades dos Estados Unidos já admitiram a presença do empresário em território americano. Porém, não houve avanço em acordo de cooperação. Na força-tarefa brasileira, também não há certeza sobre quem, em Portugal, estaria cuidando do paradeiro de Lavouras e Paiva. Até agora, o país europeu não informou se designou uma equipe responsável pela atuação, não bloqueou ativos ou abriu investigação. O GLOBO entrou em contato com o Ministério Público português, que não quis se manifestar sobre o assunto.  A localização dos demais foragidos, a maioria doleiros, está a cargo da Polícia Federal (PF). A demora em agir aumenta a tensão entre os procuradores da República, delegados e agentes.

Foragido desde 6 de setembro de 2017, alvo da Operação Unfair Play, Rei Arthur é suspeito de integrar o esquema criminoso de Cabral e teria ajudado o ex-governador a corromper autoridades internacionais na escolha do Rio como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Arthur Soares ganhou notoriedade durante os dois mandatos do ex-governador (2007-2014) à frente do grupo Facility, posteriormente rebatizado de Prol, formado por empresas que fecharam R$ 3 bilhões em contratos para fornecer serviços de limpeza, segurança, alimentação e na área da saúde.

Arthur Soares tem contra ele e sua sócia, Eliane Pereira Cavalcante, mandados de prisão preventiva. Os dois são acusados de lavar parte do dinheiro do esquema a partir de uma sofisticada operação envolvendo offshores nas Ilhas Virgens Britânicas e contas nos Estados Unidos e Antígua e Barbuda. Já Dario Messer, foragido desde abril, é o principal alvo da Operação Câmbio, Desligo — que mandou prender 44 doleiros e empresários acusados de participar de uma rede que movimentou ilegalmente US$ 1,6 bilhão por meio de 3 mil offshores sediadas em 52 países. A suspeita é que ele esteja no Paraguai, onde tem cidadania. O presidente paraguaio, Horacio Cartes, é amigo de Messer e já o chamou de “irmão de alma”. O nome do doleiro foi incluído na lista da Interpol. José Carlos Lavouras, ex-conselheiro da Fetranspor e considerado o foragido mais longevo da força-tarefa desde a deflagração da Operação Ponto Final, em julho de 2017, chegou a ser preso em Portugal, mas logo em seguida foi beneficiado por ser cidadão português.

Em acordo de delação premiada, o doleiro Álvaro José Novis contou que, em 1990 ou 1991, foi procurado por Lavouras para ajudar no recolhimento dos valores. Ele seria o responsável por organizar a arrecadação dos recursos, pagos pelos empresários ligados à Fetranspor. Um dos alvos da operação Pai Nosso, deflagrada em março deste ano, Carlos Felipe Paiva, dono do Esch Café, é apontado pelos investigadores como coordenador dos pagamentos de propina em troca de contratos para o fornecimento de alimentação aos presídios do estado.

UMA LONGA LISTA:
Outros 14 foragidos da Lava-Jato no Rio: Carlos Felipe da Costa Almeida de Paiva, dono da rede de cafés Esch; Bruno Farina, doleiro que está foragido no Paraguai e mora no mesmo condomínio de Dario Messer; Claudine Spiero, que já foi condenada por operação ilegal de moeda; doleiro René Maurício Loeb, que deixou o Brasil em abril em um cruzeiro rumo à Alemanha; além dos doleiros Ernesto Matalon, Patricia Matalon,Bella Kayreh Skinazi, Chaaya Moghrabi (Monza), Diego Renzo Candolo (Zorro), Wu Yu Cheng (Molleja), Richard Oterloo (Xou), Carlos Alberto Braga de Castro (Algodão), Alberto Cesar Lisnovetzky (Telê) e Wander Bergman Vianna.