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domingo, 5 de setembro de 2021

‘Estão fazendo confusão’, diz jurista, sobre artigo 142 da Constituição - Ricardo Ferraz

Para Ives Gandra Martins, um dos mais respeitados advogados constitucionalistas do país, não há ruptura institucional por parte do STF

Se tornou comum, durante os discursos do presidente Jair Bolsonaro, em que ele insinua o rompimento da ordem institucional e a possibilidade de interferência em outros poderes, a claque responder com a frase “eu autorizo”. A palavra de ordem remete ao artigo 142 da Constituição Federal, que trata do papel das Forças Armadas no país. Na interpretação dos apoiadores do governo, o chefe do poder Executivo, poderia evocar o Exército, a Marinha e a Aeronáutica para interferirem em outros poderes e, assim, restabelecer a “aplicação da Lei e da Ordem”
[do alto da nossa alardeada ignorância jurídica, de há muito concluímos que o 'filho de uma mãe' que redigiu o artigo 142, da Constituição Federal, produziu de forma proposital um enigma  = quanto mais o artigo é lido, dissecado, mais argumentos surgem a favor de qualquer tese.
É tão confuso que o constituinte de 88 impôs no parágrafo primeiro do famoso artigo 142, um comando: " § 1º Lei complementar estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas." 
Em obediência ao comando transcrito foi promulgada a Lei Complementar nº 97/99, 9 junho 1999. Portanto, no democrático governo do presidente sociólogo.
Lendo o artigo 142 da CF em conjunto com a LC 97/99, a confusão aumenta, especialmente devido o artigo 15 da LC.
A confusão é de tal ordem que a interpretação do ilustre IVES GANDRA apresentada nos parágrafos 2, 3 e 4 deste Post,  sustenta interpretações diferentes, quando a leitura é efetuada em conjunto com o artigo 15 ou sem ler o artigo 15. 
Para esclarecer ou confundir nossos dois leitores, sugerimos ler o artigo  e assistir vídeo do próprio IVES.] 
 
A ideia não é nova, grupos de direita saudosos da ditadura militar a defendem desde as manifestações de 2013,  mas os pedidos de uma “intervenção militar constitucional” se tornaram mais frequentes e incisivos às vésperas dos atos de 7 de setembro, quando apoiadores do governo pretendem ir às ruas para protestar contra atos do Supremo Tribunal Federal. Na visão de um dos mais respeitados juristas do Brasil, no entanto, a interpretação bolsonarista do artigo está equivocada. Ives Gandra Martins, advogado constitucionalista,  acredita que estão fazendo “uma tremenda confusão” ao redor do tema.
 
O artigo 142 prevê que As Forças Armadas destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Ou seja, os chefes do Executivo, do Judiciário, e do Legislativo, podem solicitar intervenção do Exército, Marinha e Aeronáutica, caso haja conflitos entre eles. Ives Gandra ressalva, no entanto, que “isso só pode acontecer para restabelecer a lei, e não para rompê-la. A garantia da Lei e da Ordem deve ser pontual, não foi criada para derrubar poderes, nem para tirar ministros do STF. Não há, até o momento, nenhum rompimento da ordem institucional que justifique essa medida”, explica.
 
Para o jurista, mesmo o presidente sendo o chefe das Forças Armadas, ele não  poderia comandar uma intervenção caso a solicitasse. “Isso caberia exclusivamente aos comandantes de cada força, nem o ministro da Defesa poderia interferir”, diz. “Essa interpretação [de que Bolsonaro poderia interferir no conflito entre os poderes] está completamente equivocada. O artigo 142 existe para ser usado em casos excepcionalíssimos, como último recurso”, finaliza.
 
A postura de Ives Gandra, um conservador assumido com bom trânsito nas Forças Armadas é professor da Escola Superior de Guerra e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército – causou decepção entre os advogados bolsonaristas que se mobilizam para oferecer apoio jurídico aos manifestantes no dia da independência. Em grupos de troca de mensagens, diversos operadores do direito disseram que ele “mudou de lado”.
Ricardo Ferraz,  jornalista - VEJA