O
chanceler brasileiro Ernesto Araújo telefona para o secretário de Estado
americano, Mike Pompeo. Precisava fazer uma consulta urgente antes de
participar de reunião ministerial com Jair Bolsonaro sobre a crise na
Venezuela. Pompeo estava ocupado. Não pôde responder imediatamente. Araújo
deixou recado. Súbito, quando o chanceler já estava quase saindo, tocou o
celular. Era a secretária de Pompeo: "Ele disse que é para você usar
aquela vermelhinha."
Araújo agradeceu, tirou a gravata verde que havia escolhido, amarrou a
'vermelhinha' no pescoço e foi para reunião com o presidente. A anedota é um
convite aos brasileiros para se acostumar com a ideia de que, sob Bolsonaro, a
estratégia nacional para lidar com o caos venezuelano faz escala em Washington.
Nesta quarta-feira (1º), Mike Pompeo voltou a declarar que a hipótese da
intervenção militar na Venezuela não está descartada. Em Brasília, Bolsonaro
foi questionado sobre o eventual uso do solo brasileiro por tropas americanas.
E ele: "Por enquanto, não há nenhum contato nesse sentido." Hummmm…
"Se por ventura vier, o que é normal acontecer é que o presidente reúne o
Conselho de Defesa, toma a decisão e participa ao Parlamento brasileiro."
Na véspera, em entrevista à Band, Bolsonaro havia declarado: "A hipótese
de nós participarmos de forma mesmo indireta de uma intervenção armada é muito
difícil. Não vou dizer que é zero, mas é próxima de zero." Bolsonaro disse
mais: "Eu entendo que isso [intervenção militar na Venezuela] não é uma
figura de retórica por parte dele [Donald Trump], é uma possibilidade, sim. Em
ele, por ventura, querendo usar o território brasileiro, eu digo o seguinte: eu
convocaria o Conselho Nacional de Defesa, ouviria todas as autoridades do
Conselho Nacional de Defesa e tomaria uma decisão."
Como se fosse pouco, Bolsonaro voltou ao tema nas redes sociais: "A
situação da Venezuela preocupa a todos. Qualquer hipótese será decidida
exclusivamente pelo presidente da República, ouvindo o Conselho de Defesa
Nacional. O governo segue unido, juntamente com outras nações [pode me chamar
de Estados Unidos], na busca da melhor solução que restabeleça a democracia
naquele país." O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, também foi às redes
para informar a Bolsonaro que a Constituição anota que "é competência
exclusiva do Congresso Nacional autorizar uma declaração de guerra pelo
Presidente da República." Puxa daqui, estica dali, o senador Flávio Bolsonaro
esclareceu a Maia, por WhatsApp, que seu pai não cogita declarar guerra à
Venezuela de Nicolás Maduro. Maia deu-se por satisfeito: "Isso nos
tranquiliza, porque é uma postura de respeito ao Parlamento." Será? E
quanto à eventual utilização do mapa brasileiro como tapete para a passagem de
tropas americanas a caminho da Venezuela? Bolsonaro "toma a decisão e
participa ao Parlamento brasileiro"? É assim que a banda deve tocar? O adequado
não seria consultar o Legislativo antes de decidir? Em nome do bom senso e da
tranquilidade nacional, Bolsonaro deveria falar com mais clareza sobre essa
hipótese de participação brasileira, ainda que indireta, num confronto armado
na Venezuela. É preciso que o defina "próximo de zero"
Se
depender dos seus chanceleres —Ernesto Araújo, o oficial; e Eduardo Bolsonaro,
o paralelo—, o Brasil assumiria imediatamente com Trump o compromisso de abrir
alas para a passagem de soldados americanos por esta terra de palmeiras. Tomado
pela retórica ensaboada, o próprio Bolsonaro parece namorar essa ideia. Não
fosse a resistência dos generais que o cercam, o presidente talvez já tivesse
amadurecido uma decisão. Num contexto assim, "próximo de zero" pode
significar um erro monumental situado na fronteira entre o tic e o tac..
[regramento constitucional sobre a matéria objeto do POST acima:
A CF é de clareza meridiana sobre o assunto - não deixando margens nem para o Supremo interpretar de forma diversa.
CF....
"
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
...
II - autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a
paz, a permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele
permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei complementar;
Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República,
auxiliado pelos Ministros de Estado.
...
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
...
XIX - declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo
Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões
legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização
nacional;
XX - celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional;
...
XXII - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças
estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente;
...
Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente
da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado
democrático, e dele participam como membros natos:
§ 1º Compete ao Conselho de Defesa Nacional:
I - opinar nas hipóteses de declaração de guerra e de celebração da paz,
nos termos desta Constituição;..."
É conveniente a leitura da Lei Complementar nº 90, 1º Outubro 77. Por contemplar várias opções sobre o trânsito de tropas estrangeiras em território nacional, é conveniente sua LEITURA INTEGRAL.
Editores do Blog Prontidão Total]