Gazeta do Povo
"Parasita" foi o grande vencedor do Oscar deste ano e o diretor do filme, também premiado, divide com Paulo Guedes o uso desse título que frequenta o noticiário. O sul-coreano com o filme e o ministro com esta manifestação, pronunciada na Fundação Getúlio Vargas: “O funcionalismo teve aumento de 50% acima da inflação. Tem estabilidade de emprego, tem aposentadoria generosa, tem tudo. O hospedeiro está morrendo, e o cara virou um parasita. O dinheiro não chega ao povo, e ele quer aumento automático. Não dá mais”.Os parasitas e os que não são parasitas ficaram furiosos. O ministro da Economia pediu desculpas pela generalização. Mas o episódio deu munição para os que querem torpedear qualquer transformação no Estado brasileiro que tire do conforto os que vivem uma situação privilegiada em relação aos demais contribuintes brasileiros.
No fundo, no fundo, a denúncia de que há parasitas deve ter sido aplaudida pelos que "carregam o piano". Em qualquer instituição pública que se examine vai se identificar aqueles que deixam o paletó no espaldar da cadeira, os que ficam no cafezinho, os que saem para tratar de seus assuntos particulares, os que ficam de enganação dias, meses e anos, e aqueles hospedeiros dos parasitas, sobrecarregados, que precisam realizar as tarefas, como quietas vítimas da injusta distribuição do peso. "Carregam o piano" em hospitais públicos, nos postos de saúde, nas escolas públicas, na previdência, nos ministérios, nas estatais.
O concurso público é a forma mais justa de admissão em carreira do Estado, porque avalia o mérito. Mas esse mérito precisa ser continuamente avaliado no desempenho do servidor do público. No entanto, a estabilidade e o direito adquirido são tentações a que muitos não resistem, ao encontrar quem trabalhe em seu lugar. E não se pode elogiar o "carregador de piano" sem que isso signifique admitir como simbiose essa relação entre parasita e hospedeiro. É preciso libertar esse hospedeiro.
A agenda de transformação administrativa do Estado que vai ser oferecida ao Congresso quer romper isso para o futuro, já que no presente não pode ofender o direito adquirido, que está abrigado pela Constituição. As propostas de mudanças vêm da experiência crítica dos melhores das carreiras do Estado, os que dominam todas as nuances desse intrincado ser que é o inchado Estado brasileiro. Agente público escolhido e mantido por mérito, sem militância partidária, de caráter incorruptível, sem ser servidor de um governo ou de outro, mas do povo brasileiro e para as próximas gerações.
Ao longo dos anos, separou-se dos demais brasileiros um contingente estatal com mais direitos que os outros, contrariando a Constituição, que fala em igualdade, "sem distinção de qualquer natureza". E, convenhamos, as diferenças não são apenas entre os servidores do público e o público. Existem distinções também entre os próprios servidores, com a coexistência de parasitas e de "carregadores de piano".
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Alexandre Garcia, colunista - Vozes - Gazeta do Povo