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quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Celso de Mello e as 'trevas que dominam o poder do Estado' - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo/O Globo

Diante da presepada de Crivella, decano é luz na luta contra a treva 

[a luz do 'supremo' ministro é tão intensa que rasga até o véu, que protege a inocência das crianças, que Crivella e outros insistem em preservar]

Ministro mostrou que vai à luta contra ‘as trevas que dominam o poder do Estado’

A mensagem do ministro Celso de Mello para a repórter Mônica Bergamo tinha 15 pontos de exclamação. Diante da presepada do prefeito Marcelo Crivella na Bienal do Livro, o decano do Supremo Tribunal Federal fez um curto e indignado protesto contra as “trevas que dominam o poder do Estado”, a “intolerância”, a “repressão ao pensamento” e a “interdição ostensiva ao pluralismo de ideias”. Não deu nome aos bois, mas qualificou a manada: as “mentes retrógradas e cultoras do obscurantismo (que) erigem-se, por ilegítima autoproclamação, à inaceitável condição de sumos sacerdotes da ética e padrões morais e culturais que pretendem impor, com o apoio de seus acólitos, aos cidadãos da República !!!!”. [a qualificação da 'manada' produz nos legítimos conservadores e defensores da inocência das crianças, a sensação de um elogio de autoria de um ilustre jornalista.]

Celso de Mello não é só o decano do Supremo Tribunal Federal, pois esse título mostra apenas que é o ministro que está lá há mais tempo, desde 1989. Ele é uma espécie de fiel da balança nas divergências e idiossincrasias de seus pares. Ele havia sinalizado seu desconforto em agosto passado, quando Jair Bolsonaro republicou uma medida provisória que havia sido rejeitada pelo Congresso: “Ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade suprema da Constituição da República”. 

Habitualmente oceânico em seus votos, o ministro foi breve em sua mensagem a Mônica Bergamo. Com 173 palavras, falou do tempo “novo e sombrio” que se anuncia. Seus 15 pontos de exclamação mostram que está zangado. É a zanga de um homem da lei. Acaba de sair nos Estados Unidos uma boa biografia de Oliver Wendell Holmes, o grande juiz da Suprema Corte, onde sentou-se de 1902 a 1932.

Flor do orquidário de Mello, Holmes foi o autor do grande voto em defesa da liberdade de expressão que ficou em minoria na época mas hoje é um marco na jurisprudência americana. Certo dia, aos 90 anos, o juiz pediu a uma secretária que lhe lesse “O amante de Lady Chatterley”, de D. H. Lawrence. A certa altura, mandou que parasse: “Filha, não vamos acabar este livro, sua chatice não é aliviada por sua pornografia”. Hoje “O Amante de Lady Chatterley” é apenas um romance chato. Quando a moça lia para Holmes, ele estava proibido nos Estados Unidos. (A licenciosidade de Lawrence é light se for comparada com a retórica de Bolsonaro.)