É como se um empregado valesse dois terços
A pergunta é simples e
decisiva. A resposta deveria ser simples e precisa. Quantos brasileiros
estão, a cada mês, empregados, recebendo seus plenos direitos
trabalhistas?
E vice-versa?
Quantos brasileiros estão, a cada mês, desempregados, sem receber seus plenos direitos trabalhistas?
Interessa saber a todo
brasileiro, empresas, sindicatos, partidos, Banco Central. Sem o que não
se pode avaliar se a política econômica do governo faz bem ou mal ao
país. Espera-se que bem.
O sucesso da política financeira não se mede apenas por inflação e juros baixos. Quanto mais baixos, melhor. Vejam a dura crítica
social, indignação, mesmo criminosa, do povo, nos filmes “Coringa” e
“Parasita”, ao atual sistema financeiro que gera desemprego. Países adotam juros
negativos. Outros querem subir juros e não conseguem. Outros querem
baixar – até onde? – e conseguem. O doente econômico ficou sem remédio
unívoco e eficaz. O normal seria comparar o
índice de emprego deste mês com o índice de emprego do mês passado,
dentro da mesma métrica. Simples assim.
Mas não somente cada
instituição tem seu índice. OIT, IBGE, CAGED etc. Como cada índice tem
sua métrica. Cada métrica tem conceitos diferentes de emprego e
desemprego. Em nome de buscar a
transparência total da realidade do emprego – o que é bom – criaram-se
tantos conceitos, preconceitos, distintas realidades econômicas,
especificidades, que a confusão é geral. Pura Babel. Vejam só. Começam
conceituando “força de trabalho” como todos os trabalhadores acima de 14
anos. Podem ser do setor privado, do setor público, empregadas
domésticas. Com ou sem carteira assinada. Dividem-se depois em
“ocupados” e “desocupados”. Mas nem todos os ocupados estão empregados.
Ocupados podem fazer bicos, trabalhar por conta própria; podem ter ou
não a carteira assinada; uns estão procurando emprego, outros já
desistiram, desesperados.
Tem os desalentados. Existem os empregadores do “bloco do eu sozinho e os empregadores com mais de dois empregados”. Existem os que estão no setor formal, e os que estão no setor informal, o subemprego, e por aí vamos. Na ânsia de dar boas
notícias, o governo aumenta a confusão. Canta como vitória da política
econômica o maior número de ocupados naquele mês, quando decaiu, no
mesmo mês, o número de empregados com direitos plenos. É como um empregado valesse dois terços.
Cheguei mesmo a procurar
autoridades do IBGE, doutores de think tanks econômicos, professores de
economia de escolas acima de qualquer suspeita. Nada. Não consegui as
respostas simples e precisas que procurei. Aumentou-me a confusão. No máximo, sabem que a
produtividade do PIB continua diminuindo. Precisamos de mais horas de
suor do trabalhador para fazer o mesmo. Ou menos.
Exemplo? Antes,
precisávamos de oito horas de trabalho de um trabalhador para fazer o
produto X. Hoje, precisamos de 9 horas para fazer o mesmo produto.
Para entender é preciso um doutorado em economia. E não apenas um título de eleitor.
Não são poucos os que
acham que a queda de juros, em vigor há três anos – desde Temer -, não
trouxe mais e melhor emprego para nossos trabalhadores e empresas. A moda econômica é dizer
que este é problema global. Ou culpar o UBER e os diversos aplicativos
de entrega. Ocupam, mas não empregam. Se chegarmos assim em 2022, vai
ter problema. Ou mesmo antes. Quando anunciam que a
taxa Selic está em 4.5, são precisos e concordes. Quando dizem que o
Banco X lucrou vinte bilhões no semestre, também. Mas com o número de
empregados e desempregados com plenos direitos, não. Às vezes fico pensando que os economistas, financistas e estatísticos, em vez de entrarem em acordo, viraram advogados e juízes.
Se continuarem assim, vão todos acabar no Supremo. Onde, às vezes, a vítima, o Brasil, vira o culpado, o Brasil.
Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - VEJA
Joaquim Falcão é sociólogo, diretor da Fundação Getúlio Vargas e membro da Academia Brasileira de Letras.