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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

ESCOLAS CÍVICO-MILITARES - por Percival Puggina

No Brasil, um bom teste para saber se certa ideia é boa consiste em identificar quem a ela se opõe. Tal é o caso, por exemplo, das escolas cívico-militares, que encontram resistência entre pedagogos paulofreireanos. No entanto, o governo federal, que lançou o programa no final do ano passado, vai atender, neste ano, menos de 10% da manifestação de interesse de quase 700 municípios brasileiros.

 O interesse das administrações locais expressa o desejo de muitos pais que acompanham a vida escolar de seus filhos. Pais sabem o quanto a disciplina e a ordem cobradas em educandários com esse formato resultam saudáveis e se expressam em resultados positivos no aprendizado e na vida dos jovens. Então, logicamente, querem isso para os seus filhos. Acompanho há muitos anos os fatos relacionados à Educação em nosso país. Minha mulher foi professora e, durante longo período, diretora de escola estadual do ensino fundamental. Viveu na experiência cotidiana as questões disciplinares e conheceu de perto os problemas que lhe dão causa. Eles se situam entre dois extremos: o abandono pela família e a sacralização dos pequenos rebeldes. Em 2020, o Ministério da Educação canalizará R$ 54 milhões para 54 escolas cívico-militares, distribuídas entre as regiões do país e tem planos para alcançar 216 escolas até 2023. O projeto-piloto prevê gestão compartilhada entre professores civis e militares.

Reportagem da revista Veja, de 31 de agosto de 2018, relata que uma em cada cinco crianças de até oito anos, submetidas à Prova Brasil, que compõe o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), diante de uma imagem de pipoca, identificaram-na como piloto, pijama ou pirata. Outro tanto se atrapalhou ao contar nove balões na mão de um palhaço. Os dados da Prova Brasil, informa a matéria, mostram que “apenas 5% dos alunos brasileiros se encaixam na faixa adequada, ou seja, possuem o conhecimento esperado para sua série”.

Os dados, aliás, tornam difícil entender que as escolas cívico-militares encontrem resistência por parte daqueles profissionais dos ambientes sindical e acadêmico que acompanham os fatos e os dados, com o toco de giz na mão dos outros... A propósito, leio no site Último Segundo reclamação contra o governo federal por, de um lado, demonizar o pedagogo Paulo Freire, que preconizava uma educação política, orientada para a conscientização dos alunos sobre sua condição social e, de outro, enaltecer o modelo cívico-militar, baseado na ordem e na disciplina”. Disso deduz que tal opção “reforça uma orientação autoritária e uma vontade de impor uma visão de mundo unificada e conformista.” 

Enquanto a Educação disponibilizada fica tão aquém do necessário para a inserção proveitosa do estudante no conjunto das relações sociais e econômicas, a educação paulofreireana não se importa com o insucesso nas avaliações contanto que o produto da sala de aula responda aos anseios políticos do “patrono” da educação brasileira.

Não, não têm algo melhor do que isso para dizer. No vazio de ideias em que orbita a Educação em nosso país, não há lugar para ordem e disciplina

Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.



 

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Devagar, quase parando




Uma nova radiografia do ensino básico, divulgada pelo MEC, mostra que a imensa maioria dos alunos não aprendeu quase nada e seguirá assim até sair da escola


Em qualquer país seriamente comprometido com seu desenvolvimento, garantir aos estudantes que concluam o percurso escolar com boa capacidade de pensar, produzir e inovar está longe de ser um feito acima do comum: é lição de casa elementar. Pois o Brasil vem falhando na tarefa e permanece enredado em notas vermelhas, sem dar sinais de ganhar fôlego para correr em busca da excelência. Na verdade, o país está muito distante de um ensino ao menos decente. Uma nova radiografia da escola brasileira, divulgada pelo Ministério da Educação (MEC) na quinta-feira 30, revela um desastre em todos os níveis e traz uma constatação dolorosa. “Os estudantes vão passando de uma série a outra, mas não avançam quase nada na escala do conhecimento”, diz Maria Inês Fini, presidente do Inep, órgão ligado ao ministério que produziu o levantamento.

Os dados foram extraídos da Prova Brasil, teste de matemática e português aplicado a 5,4 milhões de alunos das redes pública e privada. Eles compõem o Saeb, termômetro que capta o nível dos estudantes no 5º e no 9º anos do ensino fundamental e no 3º ano do médio, quando muitos jovens estão às vésperas de tentar uma vaga na universidade. É justamente nesse patamar que o cenário fica mais dramático. Em matemática, apenas 5% dos alunos se situam na faixa adequada, ou seja, têm o conhecimento esperado para a série que estão cursando. Os demais 95% oscilam entre o nível básico, que exige recuperação contínua para acompanhar a classe, e o insuficiente, em que o aluno só seguirá adiante se passar por uma intervenção pedagógica; do contrário, ficará retido na série em que está. O alívio poderia vir da prova de português, mas não vem, e a situação até piora: apenas 1,7% aparece na faixa adequada.


VEJA teve acesso a questões respondidas por alunos de diferentes idades na Prova Brasil. Uma delas pede a crianças de até 8 anos (supostamente alfabetizadas) que olhem para a imagem de uma pipoca e assinalem entre quatro opções a palavra escrita: uma de cada cinco marcou pijama, piloto ou pirata. Elas também tropeçaram na proporção de um para cinco ao contar os nove balões nas mãos de um palhaço. A defasagem nos primeiros anos escolares tende a se agravar conforme a complexidade aumenta sem que dúvidas básicas tenham sido dissipadas. “O conhecimento é uma construção em degraus. Se há falhas graves na base, a estrutura superior fica comprometida”, compara o professor de matemática Bruno Lima, do Colégio de A a Z, no Rio de Janeiro.

Os obstáculos não vencidos na largada podem se fazer sentir ao longo de toda a trajetória acadêmica, até o ensino médio. O Saeb ajuda a dimensionar o problema mostrando como questões consideradas de baixíssima dificuldade assombram os jovens. Uma fábula simples traz como protagonista uma raposa espertalhona. Ao final, a pergunta: a palavra “ladina” significa que a raposa é esperta, rápida, cuidadosa ou engraçada? Mesmo com a deixa do texto, um de cada quatro errou. “Um aluno do 6º ano do ensino fundamental ou saberia o significado de cara ou faria essa interpretação tão simples”, diz a professora de português Rafaela Simões. Quando o desafio era completar a sequência aritmética 3, 7, 11…, outra má surpresa: 56% não sabiam.


O que preocupa não é apenas o retrato do momento traçado pelo MEC, mas a sequência de resultados que mostram a educação brasileira ora avançando em marcha lenta, ora retrocedendo. De duas décadas para cá, a única subida de patamar no Saeb ocorreu no 5º ano do ensino fundamental: o salto, porém, foi do muito ruim (insuficiente) para o ruim (básico). O 9º ano, que marca o fim do ciclo fundamental, manteve-se na linha de insuficiência, enquanto o ensino médio, por incrível que pareça, regrediu de 3 para 2 nesse nível em que o aluno precisa parar e preencher as lacunas de aprendizado antes de poder seguir em frente. De modo geral, é mais fácil elevar a qualidade do ensino nas séries iniciais. “São anos em que uma única professora cuida da turma. Depois, há um professor por disciplina, e ele costuma receber uma educação teórica e distante das reais necessidades da escola”, observa Mozart Neves Ramos, diretor de inovação do Instituto Ayrton Senna. Às vezes, nem a formação necessária existe: quase metade dos docentes não tem diploma específico para a matéria que ensina, segundo o Censo Escolar.

O levantamento do MEC mapeou a qualidade nos 26 estados, mais o Distrito Federal. Daí se originaram rankings para os três níveis de ensino avaliados. As redes públicas de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás e Espírito Santo aparecem nas primeiras colocações em pelo menos dois deles. Alguns padrões se repetem no topo nacional. “Uma das características em comum nesses estados é a adoção de políticas pensadas para resolver problemas típicos de suas redes, no lugar de copiar modelos genéricos”, explica João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto. Oliveira acrescenta outros dois fatores essenciais para um bom desempenho no longo prazo: a integração de estados e municípios e a preservação de iniciativas bem-sucedidas mesmo que haja troca de governantes.

Os lugares que começam a adotar mais maciçamente o ensino integral têm colhido melhores resultados. Uma conta do MEC mostra que as chances de um aluno que estuda em turno estendido se inscrever no Enem são 15% mais altas — o que, em um país com população universitária ainda baixa (18% dos jovens), é algo a ser celebrado. 

Evidentemente, não basta investir um caminhão de dinheiro em mais horas na escola e esperar que a qualidade germine sem que o tempo seja utilizado para ampliar os horizontes do aluno. O Espírito Santo, que, segundo cálculos do Instituto IDados com base no relatório do MEC, surge em primeiro nos rankings de português e matemática do ensino médio, tem um bom exemplo a dar. O estado começou a apostar em um currículo mais enxuto e atento às tão propaladas habilidades do século XXI — produzir em equipe, afiar o raciocínio lógico para navegar em zona desconhecida, fazer uso da criatividade.

Cortar conteúdos de pouca utilidade e transformar a escola em um lugar menos enciclopédico e mais conectado ao que se passa fora de seus muros é o caminho percorrido por países com destaque na educação, como a Finlândia e vários dos asiáticos. O Brasil está prestes a dar uma necessária chacoalhada em seu antiquado ensino médio. A reforma, que planeja trocar o modelo único de hoje por um mais flexível, em que o aluno escolhe as disciplinas em que quer se aprofundar, está para deixar os gabinetes. “A implantação será gradual, a partir do ano que vem. Até 2022, a meta é que o novo ensino médio esteja funcionando em todo o país”, disse a VEJA o ministro da Educação, Rossieli Soares. A modernização de uma fórmula ainda cultivada por muitos, que vê na quantidade de conteúdo um sinônimo de ensino bom, não será fácil: exigirá professores treinados para trabalhar mais de perto uns com os outros e alterações significativas tanto no material didático como no próprio Enem.

No Brasil dos anos 1950 e 1960, prevalecia a ideia de que a educação seria uma consequência natural do desenvolvimento econômico. Foram tempos bicudos para o ensino: o país investia apenas 1,4% do PIB em seu vasto sistema educacional. Na década de 80, começou a ser difundida outra visão, válida até os dias de hoje: a de que boa educação não é efeito, e sim um poderoso motor para o desenvolvimento. Os cofres então se abriram para a sala de aula, o que ajudou a sanar mazelas básicas mas também propiciou um acúmulo de desperdícios. Fica o aviso aos candidatos à Presidência: já passou da hora de o Brasil usar o dinheiro da educação com mais inteligência e garantir um ensino de alta qualidade, indispensável para saltar de patamar.

Publicado em VEJA de 5 de setembro de 2018, edição nº 2598