O
crime de responsabilidade não se confunde com os crimes comuns, previstos no
Código Penal. Não pode
resultar na prisão do governante e nem é julgado por juiz togado
No
último dia 17 de abril, por 367 votos, de 513 possíveis, a Câmara dos Deputados recebeu a denúncia formulada contra Dilma, por
crime de responsabilidade. O processo já seguiu para o Senado. Lá, por maioria simples, os senadores poderão (ou não) confirmar o recebimento da denúncia e afastar Dilma do cargo,
devendo julgá-la no prazo máximo de 180 dias.
A tese de defesa da presidente pode ser resumida no seguinte
lema: “Impeachment sem crime de
responsabilidade é golpe”. O mantra é reproduzido, incansavelmente, pela
militância do PT e repercute nas mídias sociais e nos meios de comunicação.
Muitos dos que se opõem ao impeachment pontuam que Dilma não promoveu qualquer
desvio de verbas e nem é acusada da prática de crimes de corrupção. É pessoa
honrada e, portanto, não poderia ser afastada, por divergências ideológicas ou
por mera incompetência gerencial.
É verdade: não é possível, a teor do artigo 85 da Constituição,
o impedimento sem crime de responsabilidade. O crime de responsabilidade, contudo, não se
confunde com os crimes comuns, previstos no Código Penal. Não pode resultar na prisão do
governante e nem é julgado por juiz togado. É infração político-administrativa,
cujo exame compete ao Parlamento, podendo levar, apenas, ao impedimento para o
cargo. Por isso mesmo, a sua
caracterização não exige prova da prática de atos de corrupção. Isso é relevante para o Direito penal; não para o processo de impeachment. Tanto assim que, muito embora Collor tenha sido absolvido
na Justiça comum, jamais se questionou a legitimidade do processo contra ele
deflagrado no Congresso.
O crime de responsabilidade, como bem diz o nome, guarda relação com
o dever dos governantes de cumprir as suas responsabilidades com observância
das leis e da Constituição. E uma das obrigações presidenciais de
maior relevo é respeitar as leis orçamentárias. Entendeu
a Câmara dos Deputados que a irresponsabilidade
da presidente, no campo do Orçamento público, com a abertura, por
decreto, de créditos suplementares e a prática das “pedaladas fiscais”, é causa suficiente para a abertura do
processo. Caberá agora ao Senado definir
se houve crime de responsabilidade.
O julgamento, como é da
essência parlamentar, será eminentemente político. E o eventual impedimento da
presidente não importará em qualquer mácula à democracia. O impeachment é instrumento típico do sistema de separação de
poderes e foi concebido, precisamente, para coibir o exercício abusivo do
poder. A preservação do regime democrático, neste caso, é assegurada
pelo cumprimento dos ritos legais e constitucionais, isto é, pelo respeito às
regras do jogo democrático. Respeitado o
procedimento previsto na Constituição e definido pelo Supremo Tribunal Federal,
Dilma poderá
sofrer o impeachment, se for a decisão de dois terços do Senado.
Seja qual for o
resultado, não vai ter golpe.
Por: Gustavo da Rocha Schmidt é advogado e professor da
FGV Direito Rio