A melhor
informação de 2015 veio nos últimos dias de 2014: a Petrobras suspendeu novos
negócios com as 23 empreiteiras apanhadas na Operação Lava-Jato
A
melhor notícia de 2015 veio nos últimos dias de 2014: a Petrobras suspendeu novos
negócios com as 23 empreiteiras apanhadas na Operação Lava-Jato e abriu uma
investigação nas contas da Transpetro, da BR Distribuidora e no fundo de pensão
Petros. Com quase um ano de atraso, o comissariado
partiu para o ataque, se é que partiu.
Nesse período, a empresa perdeu
37% do seu valor de mercado e danificou sua credibilidade. [com o barril de petróleo abaixo de US$50, só resta à Petrobras deixar a
ex-salvação quieta no fundo do mar – cada barril que teimar em extrair é um
prejuízo extra de no mínimo US$ 50.]
Assim
como sucedeu com a seleção brasileira na Copa, a defesa da Petrobras sofreu um apagão. No início de 2014, sabia-se
que estourara um escândalo nas suas operações com a companhia holandesa SBM,
que lhe alugara sete navios-plataforma.
Falava-se de um pagamento de comissões que chegavam a US$ 139 milhões. A
doutora Graça Foster poderia ter soado algum alarme. Deu-se o contrário. Uma
delegação da empresa foi a Amsterdam e concluiu que nada houvera de errado. Em
novembro, a SBM foi multada, na Holanda,
em US$ 240 milhões pelas propinas que distribuiu mundo afora.
As petrorroubalheiras tinham três
vértices: o comissariado, funcionários corruptos e empresas corruptoras. Durante todo o ano o governo e
as empresas acreditaram que prevaleceria algum tipo de código de silêncio. O “amigo Paulinho” não contaria o que sabia. Muito menos Alberto Youssef, seu
operador financeiro. Empreiteiras? Nem pensar, isso jamais acontecera.
Em março,
a doutora Graça Foster anunciou que a Petrobras investigaria as roubalheiras, e
“não ficará pedra sobre pedra”. Parolagem. A essa época, a Polícia
Federal e o Ministério Público já puxavam os fios da meada das roubalheiras, e,
paralelamente, sabia-se que o fundo da Petros fechara
2013 com um rombo de R$ 7 bilhões,
corrigido para R$ 2,8 bilhões. O comissariado e as empreiteiras
acreditavam que ninguém desafiaria seus poderes, e seria possível conter as
denúncias brandindo-se o santo nome da Petrobras. Lula chegou a marcar um fracassado ato público em frente à sede da
empresa.
A casa começou a cair em agosto, quando o “amigo Paulinho” passou a colaborar com
as investigações. Num de seus depoimentos, ele mencionou uma propina de US$ 23 milhões da empreiteira Odebrecht.
Foi rebatido pelo presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, que classificou a
afirmação como “denúncia vazia de um
criminoso confesso”. O ano terminou com pelo menos nove “criminosos confessos”, entre os quais,
pela primeira vez, havia uma empreiteira, a Toyo Setal.
Documentos
apreendidos pela polícia revelaram a
estratégia de defesa dos envolvidos. Tratava-se de
conseguir um acordo com o Ministério Público e de tirar o processo das mãos do
juiz Sérgio Moro. Afinal, mexer com as empreiteiras significaria “parar o país”. Um
escritório fixou seus honorários em R$ 2 milhões, mais R$ 1,5 milhão caso o
estratagema fosse bem-sucedido. Como no
fatídico jogo do Brasil contra a Alemanha, deu tudo errado.
A doutora
Dilma disse que a Petrobras “já vinha
passando por um aprimoramento de gestão”. Cadê? Durante todo esse tempo o
governo e a Petrobras foram agentes passivos da crise. Paulinho,
Youssef e Pedro Barusco, um
felizardo do segundo escalão que entesourara R$ 252 milhões, eram velhos conhecidos da rede petista, mas fazia-se
de conta que eram marcianos. Durante quase um ano as poucas iniciativas tomadas
pela Petrobras foram provocadas por fatores externos, sobretudo depois da
abertura das investigações e processos nos Estados Unidos.
A decisão
de Graça Foster ao final do ano passado pode significar uma mudança de
comportamento. Em vez de jogar com uma
defesa bichada, a empresa partiria para o ataque contra as roubalheiras. A
entrada do fundo Petros no elenco pode ser um sinal disso, desde que se coloque
mercadoria na vitrine. A doutora Dilma disse que “vou investigar a fundo, doa a quem doer”. Dor mesmo, seu governo
só deu aos acionistas da empresa, que perderam uma parte de seus investimentos.
Ela assumiu seu segundo mandato dizendo que é preciso defender a Petrobras dos “inimigos externos”. Doze anos de poder
petista mostraram que Lula e ela cevaram “predadores
internos”.
O
último palanque da doutora
Tomara
que os dois discursos de Dilma Rousseff durante as cerimônias de sua posse
tenham sido os últimos lances de uma campanha eleitoral que acabou no ano
passado. Se não fossem tão longos e defensivos, poderiam ser atribuídos ao
marqueteiro João Santana. Prova da sua
falta de assunto foi a enésima defesa de uma reforma política (há um projeto no
Congresso, cuja discussão é obstruída pelo PT). “Pátria educadora” é um slogan ruim, que parece ter saído dos
versos oitocentistas do Hino Nacional.
O comissariado acusa a oposição
de não ter saído do palanque. Viu-se em Brasília que quem não quer deixá-lo é o governo.
Repetindo o Lula de 2003, apropriou-se da agenda econômica dos tucanos, no que
pode ter feito bem. Quem falou aos brasileiros como presidente da República foi
a representante de uma facção, porta-voz dos “nossos governos” (o dela e o
de Lula). Tudo bem, mas a partir de
amanhã ela e seus 39 ministros terão um serviço para tocar.
Lei da Anistia
Foram para o fundo do mar as
possibilidades de qualquer revisão da Lei da Anistia. As chances de que o Supremo
Tribunal Federal mexesse na questão eram quase nulas, mas uma discreta movimentação dos comandantes militares, somada ao
desinteresse do Planalto, tornaram-nas inexistentes.
Fonte: Elio Gaspari – O Globo