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quinta-feira, 20 de maio de 2021

Somos todos idiotas - O Globo

Nós idiotas que ficamos em casa fazemos o possível para evitar que o vírus circule. É pouco, de fato, mas é o que podemos fazer 

Sendo uma das idiotas que não saem de casa, na gentil descrição do senhor Presidente da República, tenho tido muito tempo para pensar na vida; o que me leva, invariavelmente, a concluir que, num mundo de idiotas, o melhor a fazer é não pensar. Todos nós, idiotas, estamos cansados. Do isolamento e das restrições da pandemia, da solidão e da monotonia, mas, sobretudo, das notícias que nos chegam a respeito dos outros idiotas, aqueles que se rebelam contra as máscaras, não respeitam distanciamento social e acham que vírus se combate no grito.[por favor, antes de  pensar em dar razão a esta senhora - que certamente está  entre as que tem tudo em casa, fazem tudo via trabalho remoto, ou algo parecido, e no dia em que um porteiro, um faxineiro do condomínio onde vive luxuosamente se atrasa, propõe a demissão imediata  e sem direito a nada - LEIAM AQUI: Desempregados - O Estado de S. Paulo

Eles não aprenderam que, além dos cientistas que desenvolvem vacinas, ninguém pode fazer nada de concreto contra uma pandemia.[contra a pandemia não, mas, devem ter o direito de sair de casa - ainda que morrendo de medo de ser contaminado - e tentar arrumar um bico para comprar pelo menos o pão;
pensa essa senhora, que o faxineiro que sai do trabalho as 17 horas, chega em casa por volta das 22h, tem um pedaço de pão e um copo com água como jantar, deita e às 3 ou 4 horas, da madrugada,   faz o caminho de volta, desta vez forra o estômago com um pedaço de pão e um café ralo, pode ficar em casa??? e faxineiro, porteiro, vigilante, e outros possuem um emprego e os que nem isso possui - tem que sair a pé e se aventurar no sinal...]

Nós idiotas que ficamos em casa fazemos o possível para evitar que o vírus circule. É pouco, de fato, mas é o que podemos fazer. Ficar em casa quando se pode ficar em casa não é desdouro nem falta de coragem, é consciência social: quanto menos gente houver nas ruas menos o vírus estará em circulação e menos pessoas serão contaminadas. Não parece difícil de explicar, mas, pelo visto, é impossível de entender. Há alguma mutação genética ou ausência de atividade cerebral que impede que os idiotas, aqueles, compreendam essa verdade basilar. Um dia eles ainda vão ser estudados pela Ciência.

A nossa idiotice de isolados é um sentimento tingido pela melancolia, intenso mas inofensivo. Passamos os dias trabalhando, lendo, cozinhando, lavando louça, participando de lives, cuidando de plantas e de bichos, refletindo e torcendo para que haja vacina logo para todo mundo. Enquanto isso o idiota lá desdenha das máscaras, aglomera, voa de helicóptero, faz churrasco, anda de moto, cavalga pela Esplanada dos Ministérios e oferece ao mundo o espetáculo da sua estupidez relinchante e orgulhosa de si mesma.[a senhora está preocupada é com o sofrimento dos que não podem ficar em casa - muitos nem um barraco possuem - ou está chateada, por não ter sido convidada pelo presidente da República?]

Genocida.
Desde os tempos em que trabalhei em Brasília, numa outra encarnação, eu já sabia que educação, caráter e hombridade não são requisitos básicos para assumir cargos importantes na administração pública. Mas eu ainda guardava uma ilusão solitária, e imaginava que era preciso ter um mínimo de inteligência e de sofisticação intelectual para ser Ministro das Relações Exteriores. [só das Relações Exteriores? e os de outros cargos, muitas vezes com outras denominações, que precisam possuir conhecimentos que a Constituição descreve com imprecisão e o Senado confere em sabatina simbólica?
Os deputados e senadores podem fazer muita ..., mas pelo menos receberam votos, foram escolhidos.

A Mauritânia fica na costa africana, ao Norte, logo abaixo do Marrocos e colada à Argélia, em pleno Saara: sua capital Nouakchott, com cerca de um milhão de habitantes, é a maior cidade do deserto. Eu não sabia disso, e não foi por falta de interesse na região, porque antes da chegada do Exército Islâmico ao Mali cheguei a fazer planos de viajar para o país, ali ao lado. Eu também não sabia que a Mauritânia só aboliu a escravidão oficialmente em 1981 e que conserva o antigo hábito berbere de engordar as mulheres: meninas com 8 ou 9 anos são obrigadas a beber leite de camelo aos litros e, aos 12, já são obesas de 30 anos.

Como idiota que sou, tenho fugido da vida real mergulhando em documentários, e foi no canal Tracks, no YouTube, que encontrei uma série holandesa sobre os países do Saara. Ela é apresentada por Bram Vermeulen, e está em inglês; há opção de legendas automáticas. O Tracks é um aglutinador de conteúdo que reúne documentários sobre o mundo todo realizados por emissoras de diversos países, e tem uma coleção extraordinária de vídeos.[vídeos para serem visto pelos que podem ficar em casa e não querem se expor, conhecendo in loco tais locais;
continuamos querendo é que o problema dos brasileiros conseguirem trabalhar, para ter comida para si e seus filhos, seja resolvido.]

 Córa Ronai - O Globo