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sábado, 4 de fevereiro de 2017

É hora do fim do sigilo

É hora de tornar público os depoimentos. Só assim a Lava Jato cumprirá seu papel

Escolhido o ministro Edson Fachin para relatar a Lava Jato, não faz mais sentido que os depoimentos da Odebrecht permaneçam cobertos sob o manto do segredo. 

A divulgação das delações é essencial para que a população possa distinguir o joio do trigo, os corruptos sejam punidos e o Brasil reencontre a pacificação

A defesa de um liberalismo moderno capaz de assegurar liberdades individuais e ao mesmo tempo atender a interesses coletivos granjeou ao juiz da Suprema Corte americana, Louis Brandeis (1856-1941), o epíteto de advogado do povo – People´s Attorney. Sua maior lição encontra-se resumida numa frase seminal entoada até hoje com a mesma ênfase, significado e importância histórica de seu tempo. Dizia ele: “o melhor detergente é a luz do Sol”. Passadas mais de sete décadas, o ensinamento de Brandeis se impõe quase como um ditame obrigatório.

 Os delatores e os que estão na fila

Nunca a exposição ao escrutínio público de graves e relevantes fatos envolvendo autoridades e os mais altos hierarcas foi tão imperativa como agora. Na última semana, em um lance de sorte que não surpreendeu ninguém, o ministro Edson Fachin foi o escolhido pelo impessoal algoritmo do sistema informatizado do Supremo Tribunal Federal para ser o novo relator da Lava Jato. A relatoria do magistrado, o mais novo na casa, foi festejada por investigadores, celebrada por advogados dos encrencados na operação, comemorada pelo Palácio do Planalto e reverenciada pela opinião pública. Há praticamente um consenso de que este foi o melhor desfecho para o futuro das investigações, pois Fachin, embora indicado ao posto pela ex-presidente Dilma Rousseff, tem demonstrado ser um juiz técnico, discreto e independente. 

Ciente do tamanho da responsabilidade que lhe pousa sobre a toga, sua primeira mensagem por meio de uma curta nota oficial foi a de que trabalhará com “prudência, celeridade, responsabilidade e transparência”. O que o Brasil aguarda ansiosamente, no entanto, é pelo próximo e mais decisivo passo de Fachin: o levantamento do sigilo das 77 delações da Odebrecht. 

(...) 

OS BASTIDORES DA ESCOLHA DE FACHIN
 TENSÃO O ministro Marco Aurélio Mello (segundo da dir. à esq.) reclamou por não ter sido consultado: “Talvez não pertença ao clube”, disse
  As pressões, a guerra de vaidades e as contrariedades que embalaram a definição do novo condutor da Lava Jato

A escolha do ministro Edson Fachin como novo relator da Lava Jato foi em parte fruto de um acaso da sorte, mas também passou, em certa medida, por uma estratégia da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, para dar uma força ao algoritmo do sistema de informática do STF que, espontaneamente e com lisura, acabou sorteando a solução mais consensual entre os magistrados da Suprema Corte, governo e o meio jurídico. Isso porque Fachin não fazia parte da segunda turma, formada por cinco magistrados. Após a morte de Teori Zavascki no mês passado, abriu-se nessa turma a vaga de relator. Qualquer um dos ministros da primeira turma teriam prioridade na intenção de se transferir para onde o sorteio da vaga de Teori seria realizado, porque têm preferência os integrantes mais antigos da corte. E Fachin era o novato. Mas, justamente por ter menos tempo de casa, ele detém o menor número de processos acumulados em comparação com os outros companheiros de toga. Por isso, teve uma pequena vantagem no sorteio em relação aos colegas. Mas se por um lado o resultado foi satisfatório, por outro acabou causando desgastes e algumas rusgas no caminho.
Cármen terminou esta semana exaurida. Passou dias tentando costurar um acordo para que não houvesse contestação sobre a decisão de fazer um sorteio da relatoria apenas entre membros da Segunda Turma. ISTOÉ apurou que a estratégia da migração entre turmas foi construída com a ajuda do ministro Gilmar Mendes, que tem estado mais próximo de Cármen desde que ela assumiu a presidência do STF. Apesar do perfil contrastante dos dois – ela, uma esfinge; ele, comunicativo -, ambos jogaram afinados na última semana.

Mas nem tudo correu como ela imaginava. “Antes de receber ofício às duas da tarde de quarta 1, eu não havia sido procurado. Talvez eu não pertença ao clube do bolinha ou clube da luluzinha”, reclamou o ministro do STF Marco Aurélio Mello. “Mas ao ser formalmente consultado, eu disse que não iria migrar de turma, pois acho que o juiz não deve escolher a relatoria que quer pegar”, arrematou.

O sorteio de Fachin foi considerado um “jogo de cartas marcadas” e causou certo constrangimento e até competição entre os magistrados. Apesar do volume imenso de trabalho, alguns ministros estavam esperançosos em assumir a responsabilidade no STF pela mais gigantesca investigação de corrupção no País.

MAIS REVELAÇÕES
O Ministério Público Federal apresenta suas cautelas. Até a sexta-feira 3, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não havia pedido o levantamento do segredo de nenhum dos depoimentos. Segundo ISTOÉ apurou, ele deve, sim, nos próximos dias solicitar a publicidade do material. Porém, não do inteiro teor. O argumento é o de que o sigilo contribui às próximas diligências, como buscas e apreensões, evitando, por exemplo, a ocultação de provas por parte dos investigados. No início de 2015, porém, a PGR teve outra interpretação.


Ao enviar ao Supremo Tribunal Federal uma lista com o nome de aproximadamente 50 autoridades com foro privilegiado, Janot pediu ao mesmo tempo abertura de inquérito e o fim do sigilo dos processos. Na ocasião, as apurações estavam baseadas nas revelações feitas pelo doleiro Alberto Yousseff e pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Naquele caso, Janot avaliou que a sociedade tinha o direito de saber quem eram os acusados.

“É preciso que fique bastante claro a toda sociedade o papel de cada um dos envolvidos no esquema” Claudio Lamachia, presidente da OAB

O presidente da OAB insiste em chamar atenção, marcar presença, mas seu discurso é tão óbvio que só o torna percebido devido a completa ausência de utilidade de suas manifestações



Fonte: Revista IstoÉ