Um relatório da auditoria interna da Petrobras feita
este ano mostra como a corrupção e a má gestão se misturam e provocam
prejuízos continuados. Ao analisar o caso de quatro sondas foi
constatado tudo que tem sido mostrado na Lava-Jato, a mesma sucessão de
decisões suspeitas. Uma dessas sondas está ociosa, ao custo de US$ 500
mil ao dia.
Os eventos se passaram no período em que a diretoria internacional
foi comandada por Nestor Cerveró e Jorge Luiz Zelada. O que foi
analisado neste documento, do qual esta coluna tem cópia, foram os
navios-sondas Petrobras 10000, Vitoria 10000, Pride/Ensco DS-5 e
Titanium Explorer. Em todos houve sobrepreços, cláusulas inexplicáveis
de aumento do que estava contratado, decisões tomadas por poucas
pessoas, quebra dos princípios da própria empresa e presença dos
lobistas da Lava-Jato em negociações.
A primeira conclusão da auditoria é que não havia necessidade de
contratar ou construir as sondas. A decisão foi tomada naquele oba-oba
do “nunca antes” sem ver os custos, sem respeitar os pareceres técnicos. O cenário que se acreditava era o de que a empresa iria adquirir
quatro novos blocos por ano. O estudo inicial foi feito em 2005; a
contratação, em 2008 e 2009. “Estimou-se a necessidade de pelo menos 2
sondas nos cinco anos seguintes e de pelo menos 6 em 10 anos sem base
técnica, mas passando a ideia de perda de oportunidade”. Este mesmo
estudo, feito sem base, foi usado para decidir construir o Petrobras
10000 e o Vitoria 10000 e para contratar, sem licitação, o navio-sonda
DS-5. Este foi cedido a outras empresas duas vezes e está ocioso desde
março. Já o Titanium foi contratado em janeiro de 2009, com o mercado
financeiro parado pela crise. Além disso, contrariava o parecer técnico,
que apontava a necessidade de outro equipamento.
As propostas foram recebidas e os memorandos assinados sem que a
diretoria executiva fosse consultada, “revelando a elevada autonomia
detida pela área internacional”. Não houve “processos competitivos para a
seleção de propostas” e a decisão, no caso da Titanium, ficou restrita a
três pessoas: o diretor, o gerente-geral e o gerente executivo.
Logo depois de fechado o negócio houve um reajuste de 3% na
construção do Petrobras 10000 e do Vitoria 10000. No final de um ano o
acréscimo ao preço já era de 5%, ou US$ 31 milhões. Isso sem falar que o
valor inicial tinha sido superestimado em US$ 11 milhões. A cláusula
cambial, que era a variação entre o dólar americano e a coroa
norueguesa, representou mais um aumento do preço em US$ 11,4 milhões. A
Schahin foi contratada para ser operadora do Vitoria 10000 sob o
argumento de que era “detentora dos melhores índices operacionais”. Não
era verdade. Na época a Schahin tinha apenas um navio-sonda com bons
índices. Os bônus de performance chegavam a 17%, muito acima do mercado.
“A demora em concretizar a negociação com a Schahin para a vinda do
Vitoria 10000 para o Brasil implicou em um custo de aproximadamente US$
126 milhões”. Depois de um tempo a Schahin deixou de honrar os
pagamentos do leasing, mas pediu e recebeu bônus antecipadamente.
No contrato do DS-5, o sobrepreço chegou a US$ 118 milhões. Como ele
está ocioso desde março, pela soma das diárias, a Petrobras perdeu mais
US$ 120 milhões nesse período. O documento é estarrecedor, porque ele foca nos negócios com essas
quatro sondas e vai dissecando o desmazelo da gestão e como o preço vai
sendo inchado a cada decisão insensata. Isso sem falar na promiscuidade
com lobistas hoje investigados ou condenados no mensalão. Eles faziam
reunião na empresa. Em uma delas estavam Cerveró, Julio Camargo,
Fernando Soares, a Mitsui e a Samsung.
A auditoria encerrada em maio de 2015 recomendava tentar reaver
valores pagos a mais na construção dos dois navios-sondas, renegociar os
contratos dos outros dois e, dependendo do que for descoberto sobre a
participação de lobistas, romper o contrato. É apenas uma auditoria, mas
é reveladora do poder corrosivo da corrupção dentro da maior empresa do
Brasil. A Petrobras explicou, em nota, que a DS-5 está na carteira de
“negociação/readequação". O contrato da Titanium foi extinto em 1º de
setembro, por “descumprimento de cláusulas contratuais".
Fonte: Coluna da Miriam Leitão - O Globo
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segunda-feira, 9 de novembro de 2015
Retrato da corrupção
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