Análise Política
O pensamento econômico governamental para o curto prazo está delineado
nas medidas anunciadas pelo ministro da Fazenda e nos discursos
pronunciados pelo presidente da República.
A dúvida que persiste é
quanto das ideias expostas nas palavras de Luiz Inácio Lula da Silva se
transformará em providências adotadas pelas pastas econômicas, e quanto
reflete apenas desconforto e inconformismo com limitações materiais aos
desejos do mandatário.
A charada começará a decifrar-se na próxima reunião do Conselho
Monetário Nacional, que dá a largada no último dia deste mês. Ali
saberemos se os arrufos do presidente com a meta inflacionária
provocarão algum movimento da tríade Fazenda, Planejamento e Banco
Central ou se vai ficar por isso mesmo, se vai ser só jogo para a
plateia ir se entretendo enquanto a nova administração pega ritmo.
Aparentemente, o nó político está
- 1) no BC, que mantém a taxa lá em cima
(o juro real brasileiro continua fazendo bonito em escala global), pois
as projeções dos preços superam o teto da meta e persiste alguma
incerteza sobre a estabilização do quociente dívida/PIB;
- e 2) no
governo, que gostaria de ver o BC reduzindo juros para enfrentar outras
projeções, que desenham um cenário de desaceleração econômica.
Visto que o BC tem autonomia para perseguir a meta de inflação, e só
precisa se preocupar com esse objetivo, restam ao governo apenas dois
caminhos para “apertar” o BC para além do plano da retórica:
- 1)
comprometer-se com um aperto fiscal crível e/ou
- 2) elevar a meta de
inflação. No caso deste segundo ponto, correria o risco de despertar a
ira de parte de sua “frente ampla” na opinião pública e assistir a uma
fabricada deterioração de expectativas.
Foi para enfrentar o primeiro ponto que o governo apresentou um plano de
aumento da arrecadação, a fórmula disponível para continuar gastando e
ao mesmo tempo realizar um aperto fiscal.
A dúvida é se a elevação do
gasto público à custa do aumento carga tributária, combinado com juro
real alto (mesmo que o BC baixe, improvável, ele continuará alto), não
agravará a desaceleração econômica já desenhada.
A esta altura, um governo mais ortodoxo estaria vendo como cortar gastos
e reduzir impostos para estimular o BC a cortar juros e assim abrir
espaço ao investimento privado.
E estaria acelerando privatizações e
concessões, para alavancar investimentos mas também para reunir
numerário capaz de fazer frente a ambiciosas metas dos programas
sociais. Só que, por enquanto, o governo não admite recuar para a
ortodoxia.
Posto que os fatos são teimosos, restará aguardar pelos resultados.
Falar mal do governo anterior é recurso válido, porém datado. Ali por
meados do ano, a nova administração precisará dizer a que veio na
economia, o que é especialmente sensível diante da correlação de forças
no Congresso Nacional, onde uma maioria conservadora só aguarda alguma
dificuldade governamental para movimentar-se.
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político