Análise Política
Na política, às vezes a sorte ou o azar estão conectados ao calendário. Barack Obama teve sorte quando a crise financeira
de 2008 estourou na véspera das eleições presidenciais. Azar do John
McCain. Donald Trump teve azar quando a eleição do ano passado aconteceu já
com uma montanha de mortos ali pela Covid-19 mas antes de as vacinas entrarem em
campo. Sorte do Joe Biden.
Se as coisas no Congresso Nacional não desandarem antes para
Jair Bolsonaro – um round fundamental será jogado na eleição para presidente da
Câmara dos Deputados –, o ponto a monitorar serão as projeções para a situação
do presidente e candidato à reeleição em meados do segundo semestre de 2022.
Como estarão ali as três variáveis mais presentes hoje em qualquer
análise prospectiva?
São elas, não necessariamente na ordem de
importância:
1) a assim chamada guerra cultural, 2) a economia e 3) a
Covid-19. Sobre a primeira, é visível que
pelo menos no plano internacional a corrente a que o bolsonarismo se
filia
sofre revezes. O mais vistoso foi a derrota de Trump,
porém não o único. 2022 ainda vai politicamente longe, mas não se
enxergam por enquanto possibilidades que revertam essa tendência até
lá.
Sobre a economia, os dados de atividade, emprego e confiança
apontam recuperação. A dúvida é se o paciente continuará recuperando depois de
extubado do auxílio emergencial e demais medidas extraordinárias. E ainda tem a inflação a acompanhar, com uma possível
elevação de juros no horizonte. Os mercados andam otimistas, mesmo descontado o
fator excesso de liquidez.
E a Covid-19? O cenário mais provável é chegarmos a
meados
do segundo semestre de 2022 com uma contabilidade estonteante de mortes,
mas
também com o grosso da população brasileira vacinado.
O que vai
prevalecer?
A polêmica sobre quem foi o culpado pelos números trágicos?
Ou o alívio
pelo sucesso da imunização? Sempre supondo, é claro, que a vacina seja
mesmo um sucesso. Mas não custa otimismo de vez em quando.
Por enquanto, o presidente leva a melhor na guerra das
narrativas, como mostrou o Datafolha.
Só 8% acham que ele é o principal culpado
pelas mortes da pandemia. E 52% acreditam que ele não tem culpa nenhuma.[oito por cento é um número excessivo, visto que NÃO EXISTE um único fato que prove ser o presidente Bolsonaro o responsável pelas mortes.
Apontem uma ÚNICA MORTE causada por alguma ação do presidente, ou mesmo omissão.
O presidente teve cassado seu poder de interferir nas ações de combate à pandemia. Uma decisão do STF determinou que tudo ficasse sob a tutela dos governadores e prefeitos, sem uma coordenação centralizada. Foram mais de 5.000 cabeças a pensar e deu no desastre agora notório.] Um
aspecto intrigante nesses números é eles estarem descolados da clássica divisão
do eleitorado em três terços: pró, contra e centristas. Ou seja, os números da pesquisa não
foram capturados pela dita polarização.
Cada um que faça seu prognóstico. O meu é que a
Covid-19, e
quem foi o culpado pelas mortes por ela provocadas, talvez não venha a
ser o
filé mignon da campanha de 2022. E se a economia estiver razoável,
tampouco esta
será. É possível que a eleição aqui mimetize em algum grau a americana
do ano
passado, onde a chave foi a formação de uma frente
sócio-política-cultural anti-Trump cujo único ponto de convergência era
tirá-lo do poder.
Por isso, não basta ao presidente chegar forte e
competitivo
em 2022, com a economia bem e senhor da narrativa que coesiona seu
campo. Trump chegou e perdeu, também pelo azar com o calendário. E
apesar dos
sucessos na economia. Bolsonaro precisará dar um jeito de evitar a
convergência
do oposicionismo. Por enquanto, ele vem trabalhando para fazer o
contrário,
para juntar os que a ele se opõem. O primeiro grande sinal é a ensaiada união do PT
com os algozes de Dilma Rousseff no impeachment dela.[alguém acredita que o 'perda total' = PT vai se unir a alguma coisa?]
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político