Para conter a inflação, gestão Lula obriga a estatal a reter reajuste dos combustíveis, repetindo estratégia que já trouxe prejuízos à empresa e ao país
Um dos slogans mais famosos da história do capitalismo certamente ajudou o banco americano de investimentos Salomon a se tornar um colosso com atuação global. A frase, de fato, é inesquecível: “Nós fazemos dinheiro do modo tradicional — nós o ganhamos”.
De tempos em tempos, a Petrobras parece subverter a lógica que, teoricamente, deveria mover qualquer tipo de negócio.
A petrolífera brasileira, em especial nos governos petistas, tem demonstrado vocação para ir na direção oposta.
Ou seja, como poucas companhias no mundo, a estatal parece não se incomodar em perder dinheiro. Basta dar uma olhada no quadro que está à direita desta página para entender o tamanho do problema. Enquanto os preços internacionais do barril do petróleo sobem, a companhia reduz o valor médio do litro da gasolina enviada para as distribuidoras. Para que não haja dúvidas: a Petrobras, numa estratégia duvidosa, subsidia o preço dos combustíveis.
Como a história recente ensina, trata-se de situação insustentável.
A conta não fecha e, cedo ou tarde, a bomba explodirá.
CORTE - Prates: o presidente da Petrobras reduziu o pagamento de dividendos
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Cálculos recentes estimam que a defasagem do valor da gasolina vendida no Brasil em comparação com as cotações internacionais de petróleo está em torno de 20%.
No caso do óleo diesel, a disparidade aproxima-se dos 30%.
De que forma isso afeta os negócios da Petrobras?
Como o Brasil não é autossuficiente em sua produção, a empresa é obrigada a importar parte do combustível para atender à demanda do mercado.
Por isso, os preços praticados no exterior afetam diretamente as contas da companhia.
Procurado pela reportagem de VEJA, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, não quis dizer o que a empresa fará para corrigir essa distorção.
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Mesquita tem razão. Nos anos Dilma Rousseff, a Petrobras foi usada como instrumento político, e a estratégia revelou-se um desastre completo.
Sob o pretexto de controlar a inflação e estimular o consumo, Dilma mandou segurar o preço cobrado nas bombas de combustível. Em 2014, quando o modelo ganhou tração, a Petrobras encerrou o ano com prejuízo de 21,5 bilhões de reais. É um caso para ser estudado como exemplo clássico de má gestão.
Para efeito de comparação, em 2013 a companhia havia lucrado 23,6 bilhões de reais.
Nos anos Dilma, a petrolífera perdeu quase 60% em valor de mercado, ou algo como 100 bilhões de reais. Trata-se de um processo de destruição de valor poucas vezes visto na história corporativa brasileira. O montante, ressalte-se, nem sequer leva em consideração os escândalos de corrupção que envolveram a Petrobras nos governos petistas, que também arruinaram os cofres da empresa.
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O que está ruim pode piorar. Atualmente, o preço do barril do petróleo tipo Brent, principal referência do mercado, está em torno de 85 dólares. Segundo o banco francês Société Générale, o valor chegará a 100 dólares em 2024. Não se trata de mera suposição.
Em decisão conjunta, as nações que integram a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) decidiram diminuir a produção em 1,4 milhão de barris por dia até janeiro do ano que vem.
De seu lado, a Arábia Saudita, maior produtora de petróleo do mundo, também determinou o corte de 1 milhão de barris diários.
A estratégia é óbvia: com produção menor, os preços aumentam. Acrescente-se a isso o provável crescimento da demanda diante da expectativa de aceleração econômica global e o que se tem é um quadro de preços em ascensão.
O governo Lula mantém a pressão sobre a gestão da empresa.
No início de agosto, anunciou a revisão da política de dividendos, com corte na distribuição dos recursos aos acionistas, uma crítica à fartura dos anos Bolsonaro.
A justificativa é que uma proporção dos proventos seja destinada a investimentos.
O problema é que, no passado recente, o uso dos recursos sob tal pretexto levou a obras superfaturadas e trocas de favores políticos — daí para a corrupção é um passo curto.
Lula também teme que o aumento do preço dos combustíveis impulsione a inflação.
De fato, existe correlação direta entre as duas coisas.
Estudos mostram que uma alta de 1% no preço da gasolina gera impacto imediato de 0,05 ponto no IPCA.
Os preços dos combustíveis sempre foram uma questão sensível no Brasil. Em maio de 2018, a greve dos caminhoneiros, que pleiteavam queda do custo do diesel, interrompeu o fornecimento de itens essenciais à economia por dez dias, levando caos ao país.
A situação agora é bem diferente, mas é inegável que a Petrobras vive momento desconfortável.
Segundo um ex-presidente da companhia, há o temor de um novo ciclo de prejuízos, mais cortes nos pagamentos de dividendos e até redução dos investimentos.
“Quando a Petrobras perde, todo o Brasil é afetado”, disse Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, em entrevista ao programa VEJA Mercado.
O governo, portanto, deveria zelar pela saúde financeira da empresa.
A melhor maneira de fazer isso é deixá-la seguir o seu próprio caminho.
MATÉRIA COMPLETA - Com reportagem de Felipe Erlich
Publicado em VEJA, edição nº 2854 de 11 de agosto de 2023