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domingo, 13 de agosto de 2023

Governo faz Petrobras segurar preço da gasolina e repete fórmula duvidosa

Para conter a inflação, gestão Lula obriga a estatal a reter reajuste dos combustíveis, repetindo estratégia que já trouxe prejuízos à empresa e ao país

Um dos slogans mais famosos da história do capitalismo certamente ajudou o banco americano de investimentos Salomon a se tornar um colosso com atuação global. A frase, de fato, é inesquecível: Nós fazemos dinheiro do modo tradicional — nós o ganhamos”. 
De tempos em tempos, a Petrobras parece subverter a lógica que, teoricamente, deveria mover qualquer tipo de negócio. 
A petrolífera brasileira, em especial nos governos petistas, tem demonstrado vocação para ir na direção oposta. 
Ou seja, como poucas companhias no mundo, a estatal parece não se incomodar em perder dinheiro. Basta dar uma olhada no quadro que está à direita desta página para entender o tamanho do problema. Enquanto os preços internacionais do barril do petróleo sobem, a companhia reduz o valor médio do litro da gasolina enviada para as distribuidoras. Para que não haja dúvidas: a Petrobras, numa estratégia duvidosa, subsidia o preço dos combustíveis.  
Como a história recente ensina, trata-se de situação insustentável. 
A conta não fecha e, cedo ou tarde, a bomba explodirá.  
 CORTE - Prates: o presidente da Petrobras reduziu o pagamento de dividendos 
 
(...)
 
Cálculos recentes estimam que a defasagem do valor da gasolina vendida no Brasil em comparação com as cotações internacionais de petróleo está em torno de 20%.  
No caso do óleo diesel, a disparidade aproxima-­se dos 30%. 
De que forma isso afeta os negócios da Petrobras? 
Como o Brasil não é autossuficiente em sua produção, a empresa é obrigada a importar parte do combustível para atender à demanda do mercado. 
Por isso, os preços praticados no exterior afetam diretamente as contas da companhia. 
Procurado pela reportagem de VEJA, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, não quis dizer o que a empresa fará para corrigir essa distorção.

arte gasolina

(.....)

Mesquita tem razão. Nos anos Dilma Rousseff, a Petrobras foi usada como instrumento político, e a estratégia revelou-se um desastre completo.  
Sob o pretexto de controlar a inflação e estimular o consumo, Dilma mandou segurar o preço cobrado nas bombas de combustível. Em 2014, quando o modelo ganhou tração, a Petrobras encerrou o ano com prejuízo de 21,5 bilhões de reais. É um caso para ser estudado como exemplo clássico de má gestão. 
Para efeito de comparação, em 2013 a companhia havia lucrado 23,6 bilhões de reais. 
Nos anos Dilma, a petrolífera perdeu quase 60% em valor de mercado, ou algo como 100 bilhões de reais. Trata-se de um processo de destruição de valor poucas vezes visto na história corporativa brasileira. O montante, ressalte-se, nem sequer leva em consideração os escândalos de corrupção que envolveram a Petrobras nos governos petistas, que também arruinaram os cofres da empresa.

arte gasolina

(...)


CRISE - Greve dos caminhoneiros em 2018: economia parada por dez dias
CRISE - Greve dos caminhoneiros em 2018: economia parada por dez dias (Miguel Schincariol/Getty Images)
O que está ruim pode piorar. Atualmente, o preço do barril do petróleo tipo Brent, principal referência do mercado, está em torno de 85 dólares. Segundo o banco francês Société Générale, o valor chegará a 100 dólares em 2024. Não se trata de mera suposição. 
Em decisão conjunta, as nações que integram a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) decidiram diminuir a produção em 1,4 milhão de barris por dia até janeiro do ano que vem.  
De seu lado, a Arábia Saudita, maior produtora de petróleo do mundo, também determinou o corte de 1 milhão de barris diários
A estratégia é óbvia: com produção menor, os preços aumentam. Acrescente-se a isso o provável crescimento da demanda diante da expectativa de aceleração econômica global e o que se tem é um quadro de preços em ascensão.
 
O governo Lula mantém a pressão sobre a gestão da empresa.  
No início de agosto, anunciou a revisão da política de dividendos, com corte na distribuição dos recursos aos acionistas, uma crítica à fartura dos anos Bolsonaro. 
A justificativa é que uma proporção dos proventos seja destinada a investimentos. 
O problema é que, no passado recente, o uso dos recursos sob tal pretexto levou a obras superfaturadas e trocas de favores políticos — daí para a corrupção é um passo curto. 
Lula também teme que o aumento do preço dos combustíveis impulsione a inflação.  
De fato, existe correlação direta entre as duas coisas. 
Estudos mostram que uma alta de 1% no preço da gasolina gera impacto imediato de 0,05 ponto no IPCA.
Os preços dos combustíveis sempre foram uma questão sensível no Brasil. Em maio de 2018, a greve dos caminhoneiros, que pleiteavam queda do custo do diesel, interrompeu o fornecimento de itens essenciais à economia por dez dias, levando caos ao país. 
A situação agora é bem diferente, mas é inegável que a Petrobras vive momento desconfortável. 
 Segundo um ex-presidente da companhia, há o temor de um novo ciclo de prejuízos, mais cortes nos pagamentos de dividendos e até redução dos investimentos. 
“Quando a Petrobras perde, todo o Brasil é afetado”, disse Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, em entrevista ao programa VEJA Mercado
O governo, portanto, deveria zelar pela saúde financeira da empresa.
 A melhor maneira de fazer isso é deixá-la seguir o seu próprio caminho.

MATÉRIA COMPLETA - Com reportagem de Felipe Erlich

Publicado em VEJA, edição nº 2854 de 11 de agosto de 2023


terça-feira, 22 de maio de 2018

Dilema do combustível

Controlar o preço da gasolina já deu errado muitas vezes no passado


Nos governos do PT, causou prejuízo de US$ 40 bi à Petrobras. No arsenal de medidas contra a alta dos combustíveis não há solução boa. O governo pensa em reduzir impostos, e a reunião do presidente Temer com a Petrobras aumenta o risco de intervenção nas decisões da empresa. No governo Dilma houve as duas coisas: redução de tributos e intervenção na Petrobras. Só à estatal isso custou US$ 40 bilhões. Perdeu-se receita sem que houvesse ganho para o país.

Que o dilema apareceria era previsível. Os preços oscilaram conforme as cotações internacionais enquanto não tinham disparado. Mas agora o barril está acima de US$ 80. Entre o dia primeiro de maio e esta terça-feira, a gasolina foi reajustada pela Petrobras em 15,5% e o diesel subiu 13,6%. Um aumento nessa proporção pesa ainda mais porque a economia está tentando se recuperar de uma longa recessão, e o percentual parece desproporcional para um país que está com inflação abaixo de 3% ao ano. Além disso, a eleição está chegando, e a tentação intervencionista aumenta. Diante disso, fazer o quê? Repetir os erros do passado?

Parece justo evitar a alta dos preços da gasolina, dado que esse não é o custo da Petrobras, e sim o valor da cotação externa. Esse raciocínio sempre aparece nas campanhas eleitorais na boca dos candidatos. O problema é que na economia se trabalha com o conceito de custo de oportunidade. Se a Petrobras exportar terá esse ganho. Se vender aqui mais baixo — por imposição governamental terá prejuízo. A empresa passa, então, a ser usada pelos governantes para fazer política de preços. Esse tipo de intervenção na estatal prejudica principalmente o seu maior acionista, o Tesouro.

Fazer populismo com o preço dos combustíveis é um caminho sem volta. Nos governos do PT isso prejudicou os cofres públicos e a empresa. Primeiro, a Cide passou a ser reduzida até ser zerada, depois outros impostos foram diminuídos, a empresa passou a absorver o custo. Chegou a importar mais caro do que vendia. Criou-se um círculo vicioso. O subsídio aumentava, isso estimulava o consumo, o que elevava o prejuízo da Petrobras e piorava a perda tributária. O subsídio aos combustíveis fósseis durou anos, não evitou a inflação, o preço represado um dia teve que ser corrigido, e o setor de etanol entrou em crise.

O governo Temer discutiu ontem a possibilidade de reduzir tributo para que a alta dos combustíveis não seja tão alta. O problema é de onde tirar. Quase metade do preço da gasolina é imposto, 45%, sendo que desse percentual os estados ficam com 29 pontos através do ICMS, e 16 pontos percentuais são PIS/Cofins e Cide, segundo a Petrobras. O consultor e especialista em energia Adriano Pires acha que o menos prejudicial seria se a base sobre a qual incide o ICMS fosse fixada em um preço como R$ 4,00. Eles teriam a sua arrecadação e não mexeriam na alíquota que é de 25% em São Paulo e de 34% no Rio. Mas acha que os estados não vão aceitar. Ele lembra que se o governo diminuir imposto sobre combustível fóssil terá também que diminuir o tributo sobre o etanol. — Na verdade, a melhor forma de fazer essa mitigação das oscilações cíclicas dos preços de petróleo seria ter uma Cide alta quando a cotação caísse, e baixa quando o preço internacional subisse — disse Pires.

A Cide foi pensada para funcionar dessa forma, com uma alíquota flexível. O que houve é que o governo passado zerou o imposto e quando ele voltou foi com um valor muito baixo. O governo Temer preferiu aumentar o PIS e o Cofins. A Petrobras argumenta que tem controle apenas sobre um pedaço da cadeia de custos, que é o preço da gasolina nas refinarias. Segundo a empresa, isso representa 32% do valor final nos postos de gasolina. Sobre todo o resto, o preço do etanol que é misturado, os impostos, as margens da distribuição e revenda, ela não tem ingerência. Para evitar a confusão, passou a divulgar o preço na refinaria.  — O petróleo é preço cíclico. Agora está subindo por causa da Síria, acordo com Irã, Venezuela. Além disso, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita quer fazer um IPO da Saudi Aramco e está forçando o preço com corte de produção — conta Adriano.

O custo é de fato influenciado por fatores geopolíticos, mas o Brasil já tentou diversas vezes controlar o preço do combustível e só criou distorções na economia. O risco é repetir os erros do passado.

Blog da Miriam Leitão - O Globo