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quinta-feira, 22 de julho de 2021

E as cubanas? Revista Oeste - E o voleibol feminino, semifinal Olímpica em 1996. Alguém Esqueceu?

Manifestação contra a ditadura cubana
Manifestação contra a ditadura cubana

Durante o último fim de semana, milhares de cubanos se uniram e foram para as ruas do país gritar “Liberdade!”, protestar contra o regime comunista da ilha e expor as terríveis condições de pobreza que acompanham a vida sob uma ditadura, situação que só piorou com a pandemia.

Na era digital em que vivemos, não demorou muito para que centenas de vídeos dos protestos tomassem conta da internet e corressem o mundo. À medida que a indignação reprimida contra o regime autoritário se espalhava por cidades como Havana, as autoridades cubanas se apressaram em bloquear a internet, rotular qualquer mensagem antigovernamental de desinformação” e reprimir os dissidentes que poderiam manchar ainda mais a imagem do país. Em discurso transmitido pelos canais estatais, o presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, disse que “a ordem de combate havia sido dada”. Apelando para aqueles que apoiam o regime, acrescentou: “Os revolucionários têm de estar nas ruas”. Centenas de pessoas já foram presas e há relatos de fotógrafos e jornalistas entre essas prisões.

Em 1959, o governo de Cuba foi derrubado por Fidel Castro. Nas últimas seis décadas, o país operou sob a política comunista e experimentou estagnação econômica, pobreza, fome e uma miríade de outros obstáculos sociais. Quase 100% da economia cubana é controlada por seu governo. A escassez de recursos, as condições de vida horríveis e o governo opressor atormentam essa outrora bela nação.

Apesar de ainda testemunharmos, incrédulos, políticos brasileiros de mãos dadas com esses regimes totalitários e as constantes tentativas de distorcer o que realmente acontece em Cuba, a verdade é que os cidadãos cubanos não têm acesso ao necessário para alimentar a família. Muitos correm para os mercados quando as portas são abertas apenas para descobrir que não há frutas frescas, carnes ou vegetais em estoque. Os alimentos são racionados e fornecidos aos estabelecimentos pelo governo. O socialismo diminuiu tanto o padrão de vida em Cuba que cidades inteiras estão em ruínas. Cidadãos vivem no que antes eram belas mansões e edifícios que caíram no completo abandono porque não há fundos privados para mantê-los. Para muitos, essa é uma ilustração assustadora da prosperidade de uma Cuba há muito desaparecida, destruída em uma única geração pelo comunismo e pelo socialismo.

Cuba tem um espaço único e especial na minha história e para o vôlei feminino no Brasil. Convivemos durante muitos anos com as jogadoras da seleção cubana de vôlei. Para mim, o melhor time de toda a história. Claro que sempre competimos para vencer, os clássicos jogos contra Cuba se tornaram parte importante da minha carreira e até hoje sou abordada por pessoas que relatam suas madrugadas em frente à TV assistindo àqueles históricos embates. Vencemos algumas partidas, elas outras, as brigas se tornaram marca registrada dos encontros, mas jamais deixamos o lado humano da realidade cubana fora da equação.

Quem participa do debate público nas redes sociais sabe que parte do tempo é gasta lidando com gente que, muitas vezes escondida pelo anonimato de perfil falso, xinga, grita, ofende e até tenta intimidar. No meu caso, é raro passar alguns dias sem ler “e as cubanas?”, como se lembrar aquela semifinal olímpica em 1996, jogo que abriu caminho para a histórica medalha de bronze em Atlanta, fosse motivo de constrangimento e não de orgulho para qualquer atleta daquela geração. Adoraria ter conquistado o ouro em 1996, mas não tenho do que reclamar. Minha carreira como atleta superou os sonhos mais inimagináveis. Tenho uma vida com boas realizações e planos futuros de trabalho entre Brasil e EUA. Tenho muito a agradecer. E uma das sortes que tive, com certeza, foi não ter nascido refém da ditadura cubana.

Todos esses pensamentos, emoções e lembranças vieram à tona nesta semana diante de tantas imagens de corajosos jovens em Cuba desafiando o sistema. Cubanos são especiais, gente bonita e de fibra. Em janeiro de 2020, tive o prazer de conhecer mais um casal da ilha em um dia muito especial, quando participei da famosa e emocionante Marcha pela Vida (March for Life) em Washington. Ali, no meio da multidão que fica concentrada durante horas à espera do momento de caminhar até a Suprema Corte, esbarrei com um casal de médicos cubanos que conseguiu asilo na capital norte-americana. Com meu perfeito “portunhol”, conversamos sobre Brasil, Cuba, voleibol, governos, Fidel, Trump (ele ainda estava na Casa Branca) e até sobre o programa Mais Médicos.

Na época, contei que o presidente Jair Bolsonaro havia condicionado a continuação do programa a um teste de validação pelo qual os agentes de saúde cubanos teriam de passar, o mesmo que brasileiros formados no exterior precisam fazer para exercer a profissão, e que eles poderiam levar a família para o Brasil e ficar com seus salários, mas que Cuba não aceitou. Meus amigos dentro da Marcha pela Vida não ficaram surpresos. Contei também sobre grande parte da imprensa brasileira, outrora importante e factual; e sobre os políticos e artistas abobalhados que empurram diariamente a falácia de que o Brasil está caminhando para virar uma “ditadura”, mesmo com o atual governo não querendo ser sócio nem patrocinador de uma ditadura de verdade como foi o governo petista.

Então, ouvi do casal cubano exilado em Washington o que todos os que participam do debate honesto sabem sobre o real retrato de Cuba: que o socialismo agride, física e mentalmente, aqueles que são devorados pelas sanhas de apreciadores de regimes totalitários. A realidade para esse povo sofrido não é o que os desmiolados socialistas do Leblon com camisas do Che Guevara defendem no Instagram nos posts das viagens a Fernando de Noronha, ou mesmo para Miami, para comprar o “enxoval do bebê”.

Alguns atletas cubanos se dedicam intensamente à carreira para ter uma chance de sair do país e não voltar

Portanto, quando recebo mensagens agressivas nas redes, em desnecessário e mesquinho tom de deboche, “E as cubanas?”, eu só espero, do fundo do meu coração, que elas estejam bem.

Leia também “Deixem os Jogos Olímpicos em paz”

Ana Paula Henkel, colunista  - Revista Oeste - leia MATÉRIA COMPLETA